RESUMO:
O forró “Pé de Serra” contagia muitos jovens da cidade de Belo Horizonte. Assim, este estudo procura compreender o motivo que os levam a viver e reviver esta dança, música e espaço definido como forró. Primeiramente foi realizada uma pesquisa bibliográfica para apresentar o significado do forró “Pé de Serra”, do jovem e da motivação. Posteriormente, uma observação em um dos espaços da cidade em que se realiza o forró e uma aplicação de questionários a 20 jovens frequentadores, deu continuidade à pesquisa. Quanto aos resultados verificou-se que, mesmo com as influencias externas do meio, os jovens possuem um forte envolvimento intrínseco com o forró pelo forte despertar de sentimentos e emoções.
PALAVRAS-CHAVE: Dança. Atividades de Lazer. Recreação.
A motivação...
A motivação é a força interna que emerge, regula e sustenta todas as nossas ações. Ela é estudada indiretamente, portanto, analisada a partir do comportamento humano. O comportamento humano pode ser irracional ou racional (VERNON, 1973).
O comportamento irracional está relacionado com as questões de sobrevivência (fuga e medo; repulsão e repugnância; curiosidade e espanto; combatividade e ira; auto-degradação e sujeição; auto-afirmação e orgulho; instinto paternal e ternura; reprodução e desejo sexual). Por sua vez, o comportamento racional está relacionado à plena consciência do homem diante de suas ações, com objetivo definido e direção guiada pelo pensamento (FLETCHER apud VERNON, 1973).
Até os primeiros anos do século XX, a teoria mais popular da palavra “motivação”, era a denominada hedonismo psicológico , que significa a procura do prazer (VERNON,1973). “A motivação tipicamente dirige o comportamento para um determinado incentivo que produz prazer ou alivia um estado desagradável” (ATKINSON et al., 2002, p.372). Esse “prazer” está associado à emoção e aos sentimentos que movem e envolvem o homem antes, durante e após a ação, proporcionando-lhe sensações prazerosas e incentivando-o a querer vivenciá-la novamente. No presente estudo, não será possível falar de motivação sem considerar as emoções e os sentimentos, pois estamos lidando com o jovem (ser que possui essas “virtudes da vida” muito bem afloradas) e do forró “Pé de Serra” (prática que desperta as emoções com suas canções, ritmos e gingado da dança).
As emoções são:
[...] expressões afetivas acompanhadas de reações intensas e breves do organismo, em resposta a um acontecimento inesperado ou, às vezes, a um acontecimento muito aguardado (fantasiado) e que, quando acontece[...] são fortes e passageiras, intensas, mas não imutáveis (BOCK, FURTADO, TEIXEIRA, 2002, p.194-197).
Os sentimentos por sua vez, também estão relacionados ao afeto, mas “diferem das emoções por serem mais duradouros, menos explosivos e por não virem acompanhados de reações orgânicas internas” (BOCK, FURTADO, TEIXEIRA, 2002,p. 198).
As reações emocionais e sentimentais, como fatores motivadores do ser humano, estão intensamente presentes no forró. Isso porque o som e as letras das músicas fazem com que os jovens despertem seus sentimentos: o amor, a ternura, a amizade; fazem despertar as emoções: o coração bate mais forte, o suor toma conta da pele, acontece um arrepio no corpo, os rostos refletem uma expressão de felicidade, paixão e desejo. As músicas remetem a um mundo de sonhos e realidades; desejos e dificuldades; letras que inspiram aventuras; um mundo de alegria, chamego, balanço, saudade, paixão e amor... aquilo que o jovem sente de mais forte...aquilo que mexe com ele. Muitas músicas cantam o envolvimento, o contato, a relação e o afeto com o outro. Como por exemplo, De rosto colado:
Quando olho nos seus olhos eu sinto
Uma vontade louca de beijar sua boca
Seu beijo é doce feito mel
È uma felicidade que chega
Zumbando meu peito, deixando sem jeito
Esse meu coração
Tu eis minha flor
Linda como o sol ardente no verão
É só parar e perceber
Que eu estou te amando
Tão linda flor, tão bela flor
Beleza da cor morena me faz viajar
Vem fazer parte de mim
Vou lhe mostrar que a vida é melhor
Quando estás comigo amor
Quero dormir ao seu lado
E de rosto colado, acordar com você
(TRIO ALVORADA)
Além das emoções e dos sentimentos, que fazem parte da motivação intrínseca do individuo e que envolvem os jovens e os levam a vivenciar o forró, há também motivos extrínsecos que podem levá-los á praticar essa manifestação. Para Bock, Furtado e Teixeira (2002), o estudo da motivação é constituído por três variáveis: o ambiente, as forças internas do individuo e o objeto. Neste contexto, os fatores ambientais são dados: pelo local onde se dança o forró (casas alternativas ou escolas de dança que se ouve e se dança o forró “Pé de Serra”), pelas pessoas que o compõe (seja do convívio do jovem ou não) e por tudo que caracteriza o grupo social dos forrozeiros (acessórios, roupas, sapatos, costumes e cultura), ou seja, são representados pelos fatores externos do meio. Já os fatores das forças internas do individuo é dado pelos seus sentimentos, emoções, desejos, interesses, impulso ou instinto; neste caso pode aflorar, no jovem forrozeiro sentimentos e emoções que fazem com que ele admire e vivencie a dança e a música; sentindo então o prazer, o amor, a atração, o bem estar e a alegria de praticá-la. Finalmente o fator objeto, que é representado, inevitavelmente, pelo o forró “Pé de Serra”.
Com base nas variáveis que fazem parte da motivação é questionável que os jovens busquem o mesmo objetivo, porém podem ter motivos diferentes para buscá-lo. Assim, com a diversidade de interesses existentes entre os indivíduos permite que as pessoas não façam as mesmas coisas pelas mesmas razões (BERGAMINI apud BANDEIRA, 2008). Portanto, o que move um jovem a praticar o forró “Pé de Serra” pode não ser o que move o outro. Partindo desta ideia, o estudo desse trabalho quer verificar quais são os principais fatores que de forma mais intensa “chamam” os jovens para viver e reviver o forró. Momento este, que os jovens estão à procura da sua identidade e em busca de emoções.
“A identidade é a denominação dada às representações e sentimentos que o individuo desenvolve a respeito de si próprio, a partir do conjunto de suas vivências” (BOCK, FURTADO, TEIXEIRA, 2002, p.145). Assim, ao vivenciar e identificar com o forró, o jovem faz a descoberta de mais um fator que o leva à construção de sua identidade. Então, é o momento em que ele se reconhece, sente-se à vontade, tem prazer. Esta identidade é construída pelos fatores motivadores, pelo que o leva a dançar, ouvir, cantar e vivenciar o forró. Como diz na música Saudade de Itaúnas: “sem saber pra onde ir, sem saber onde ficar... eu encontrei um lugar pra me encontrar...” e assim, quando o jovem se “encaixa” numa cultura e num prazer que se torna prática fundamental em sua vida, ele se identifica para si mesmo e para sociedade... no caso dos jovens deste estudo, tornam-se “forrozeiros”.
METODOLOGIA E RESULTADOS
A pesquisa bibliográfica foi fundamental para dar inicio ao trabalho. Ela foi à base para que fosse possível definir o forró “Pé de Serra”, o jovem e a motivação.
Posteriormente, foi necessária uma pesquisa de campo, na qual ocorreu uma observação participante para a descrição do local (espaço alternativo) e dos jovens forrozeiros analisados na pesquisa. Portanto, por meio da observação, foi possível analisar o comportamento, práticas, hábitos, costumes e valores dos jovens. Além da observação participante foram aplicados questionários, cada um com nove questões. Para respondê-los, foram escolhidos aleatoriamente 20 jovens; 10 deles mulheres e 10 homens. Por meio da observação e dos questionários, foi possível analisar o comportamento e o significado do forró “Pé de Serra” para cada um deles, remetendo a algumas diferenças e igualdades do que os motivam a dançar e frequentar o forró. Com isso, foi verificada qual a motivação que se apresenta de forma mais marcante na vida dos jovens, fazendo-os viver e reviver o forró “Pé de Serra”.
O espaço alternativo...
O espaço observado é tipicamente uma casa noturna, como já descrita anteriormente. Localiza-se na Zona Sul da Cidade, região em que reside a maior parte da alta classe social de BH e onde também se encontra o maior número de equipamentos de lazer. No local, o forró “Pé de Serra” é ouvido e dançado especificamente aos domingos. Inicia-se por volta das 19:30 e seu término é por volta das 01:30 da manhã.
Do lado de fora, antes do horário previsto para seu início, é formada uma fila. Por questões legais, apenas maiores de 18 anos entram. O local fica bastante cheio, principalmente em dias de shows. A decoração remete a fantasias, ao meio rural, ao rústico e tradicional. Ao olhar para o teto, são observados alguns objetos de madeira pendurados. As mesas e a estrutura do local também são predominantemente de madeira. Além disso, existem alguns objetos antigos que ajudam a enfeitar o local como, por exemplo, uma máquina de escrever próxima a uma escada existente no espaço. Também são encontradas flores e retalhos de tecidos, usados para alegrar o ambiente.
No espaço vendem-se bebidas (cerveja, refrigerantes, xiboca e catuaba) e há um pequeno palco, onde ficam o Dj, cantor (a), banda ou trio. Quando não ocorrem os shows os Djs tocam, nas caixas de som, o forró “Pé de Serra”; canções que remetem ao cenário nordestino, aos sentimentos e emoções, além das que fazem parte de outros gêneros musicais e são tocadas no ritmo do “Pé de Serra”. Dentre elas, a música “Segue o Seco” leva muitos forrozeiros a pista de dança. Ela lembra o cenário nordestino, porém faz parte do gênero musical MPB.
A boiada seca
Na enxurrada seca
A trovoada seca
Na enxada seca
Segue o seco sem secarque o caminho é seco
sem sacar que o espinho é seco
sem sacar que seco é o Ser Sol
Sem sacar que algum espinho seco secará
E a água que sacar será um tiro seco
E secará o seu destino seca
Ô chuva vem me dizer
Se posso ir lá em cima prá derramar você
Ó chuva preste atenção
Se o povo lá de cima vive na solidão
Se acabar não acostumando
Se acabar parado calado
Se acabar baixinho chorando
Se acabar meio abandonado
Pode ser lágrimas de São Pedro
Ou talvez um grande amor chorando
Pode ser o desabotado do céu
Pode ser coco derramado
(Carlinhos Brown).
Nos momentos finais da noitada, a casa encontra-se vazia. Assim, os jovens que restaram, aproveitam o espaço vazio para dançar com mais giros, mais “remelexos” e sem a preocupação de trombar em outro casal, nas mesas de madeira ou em outros objetos.
Os jovens forrozeiros de Belo Horizonte...
Aparentemente, o público frequentador das “noitadas” do forró “Pé de Serra” é, predominantemente, jovem. Os jovens se apresentam alegres e envolvidos com a música e com a dança; vão bem caracterizados: meninas com saias, vestidos, roupas mais soltas e sandálias ou sapatilhas nos pés; os meninos com calças ou bermudas, com chinelos ou tênis. Também se vê os colares e pulseiras de sementes, tornozeleiras; brincos de concha, pena e madeira. Parece que as bolsas foram descartadas no forró, raramente observa-se alguém com a famosa cartucheira ou com as pequenas bolsas, de alça longa, atravessadas no ombro.
No espaço, observa-se que, em sua maioria, são as mesmas pessoas que o frequentam toda semana e existem “pequenas turminhas” de amigos, as chamadas “panelinhas”. Quando eles não estão conversando, estão à espera de um convite para dançar.
É perceptível o quanto eles se envolvem com a dança e com a música. Alguns ouvem e cantam, de olhos fechados; outros, de olhos fechados, dançam...envolvem-se no contato com o outro. Outros ainda trocam ideias e conversam com a “galera” da turma, tomando alguma bebida. A xiboca e a catuaba são as mais vistas.
Ao aplicar os questionários houve um fato surpreendente o qual eu não havia reparado antes: os jovens forrozeiros são, em sua maioria, jovens adultos, ou seja, aqueles que estão numa faixa etária que alcança os 35 anos de idade (como mencionado anteriormente neste trabalho). Descobri que é realmente difícil encontrar um jovem no forró que tenha menos que 21 anos de idade. Por isso a faixa etária dos participantes foi definida com base na observação e na idade dos respondentes dos questionários.
Dos jovens respondentes, apenas dois deles são casados, o restante, solteiros. Eles moram em diferentes regiões da cidade de Belo Horizonte, não aparecendo nenhuma região específica que tenha uma quantidade maior de residentes jovens forrozeiros, apesar da casa noturna se localizar na zona sul da cidade. Assim, presumi-se que jovens de várias regiões de BH frequentam o local, desde as mais próximas do espaço até as mais distantes, como por exemplo, os que residem na zona norte. Quanto ao tempo, em sua maioria, frequentam e praticam o forró “Pé de Serra” há aproximadamente cinco anos. Essa alternativa foi selecionada por quatorze jovens.
Além disso, em sua maior parte, são jovens estudantes ou concluintes do ensino superior. Desses, nove possuem ensino superior incompleto e sete possuem ensino superior completo, apenas quatro deles possuem somente o ensino médio completo. Partindo da ideia de que cada ser humano, jovem ou não, vê e sente o mundo do seu jeito e que tudo flui do seu pensamento, conhecimento e percepção... alguns jovens escreveram no questionário, uma frase do que o forró representa para eles, do que remete essa vivência de dançar, ouvir e sentir o forró “Pé de Serra”:
O forró é meu refúgio, um lugar onde o mundo treme e eu fico firme/ É um vício que faz bem / É minha paixão/ É deixar se levar pelas músicas/ É um momento que esqueço meus problemas/ Faz o corpo arrepiar e o coração bater mais forte/ Traz leveza à alma/ É o momento de curtir o meu dia fazendo o que realmente gosto/ É o prazer de ouvir, sentir e dançar...
Apesar dessa percepção única de cada ser humano, dos jovens forrozeiros participantes deste estudo, dezessete deles interessaram-se pela vivência do forró por meio da observação da dança e da música, nove devido a influencias de outras pessoas que já frequentavam o forró, três por causa de lugares que ouviam e dançavam o forró (seja escola de dança ou casa noturna), dois por causa de roupas e acessórios dos forrozeiros. Apenas um deles se interessou por influencias da rádio e da TV e um se interessou devido a influências familiares.
Quanto ao motivo pelo qual eles buscam reviver o forró, dezessete jovens afirmam que o ritmo mexe com os sentimentos e emoções, seis por gostarem dos “ambientes alternativos”, quatro porque pessoas do seu convívio frequentam e três buscam a prática do forró para conhecer novas pessoas e novos lugares.
Quanto ao significado de “dançar” o forró, dezessete jovens o consideram como uma prática de lazer/ prazer, sete afirmam ser uma diversão e “balada”, sete acreditam ser uma encontro com os amigos, quatro afirmam ser uma atividade física e dois acreditam ser uma manifestação cultural.
A partir desses resultados, será discutida e concluída qual a motivação dos jovens forrozeiros de BH, tendo em vista a observação deles, dentro do espaço alternativo e, principalmente do que os motivam a viver e dar continuidade a essa vivência.
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* Bacharel em Educação Física pela PUC- Minas.
Olá, que surpresa maravilhosa tive hoje quando vi meu artigo citado em seu trabalho, que por sinal, está uma delícia... Sou de Recife-PE, adoro forró, frevo, etc... Suas palavras descreveram tudo o que um verdadeiro forrozeiro sente:"...fazem despertar as emoções: o coração bate mais forte, o suor toma conta da pele, acontece um arrepio no corpo, os rostos refletem uma expressão de felicidade, paixão e desejo... desejos e dificuldades; letras que inspiram aventuras; um mundo de alegria, chamego, balanço, saudade, paixão e amor..." Deu até vontade de "forrozá"!!! Parabéns, seu texto está incrível!
ResponderExcluirHilbenir Bandeira de Carvalho
Olá, adorei seu texto, foi muito prazeroso lê-lo, especialmente quando você descreve o forró: "o amor, a ternura, a amizade; fazem despertar as emoções: o coração bate mais forte, o suor toma conta da pele, acontece um arrepio no corpo, os rostos refletem uma expressão de felicidade, paixão e desejo... letras que inspiram aventuras; um mundo de alegria, chamego, balanço, saudade, paixão e amor..." Deu até vontade de "forrozá". Parabéns!!
ResponderExcluirHilbenir Maria Bandeira de Carvalho
Ah, quase esqueci, obrigada por citar meu artigo em seu trabalho.
ResponderExcluirAbraços.
Hilbenir Maria Bandeira de Carvalho