Páginas

domingo, 27 de janeiro de 2019

MÚSICA E DIREITO




Quais direitos você, artista, tem a receber?


Talvez a primeira dificuldade listada por músicos e compositores, principalmente aqueles em início de carreira, seja a questão financeira. Do dono da casa que não quer aumentar o cachê aos altos valores de equipamentos, viver de música envolve uma certa dose de perseverança. Porém, engana-se quem acha que ganhar dinheiro com essa arte significa somente fazer shows e vender discos – ou, nos tempos atuais, com as plataformas de streaming. É preciso olhar para todas as possibilidades presentes no mercado.

Nesta primeira e pequena contribuição da Usina, vamos então falar um pouco sobre alguns direitos envolvidos na música. É bom lembrar que, graças ao mercado digital e apesar do momento complicado pela qual passa o Brasil, a música vem crescendo em todo o mundo: de acordo com o Global Music Report 2018 do IFPI, em 2017 o mercado cresceu 8,1% no planeta. As oportunidades estão aparecendo cada vez mais.

Direito de Execução Pública

Você provavelmente já ouviu falar no ECAD. Ele é o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição, ou seja, se vamos falar de execução pública, temos que falar dele.

O ECAD é uma instituição privada e sem fins lucrativos, regulamentado pela lei 5.988/73 e mantido pelas leis federais 9.610/98 e 12.853/13. É formado pelas associações brasileiras de gestão coletiva, compostas por autores, artistas musicais, editoras e gravadoras.

Em outros termos, as associações de gestão coletiva criaram o ECAD para centralizar a arrecadação dos direitos de execução pública da música. A arrecadação dos direitos autorais e conexos musicais no Brasil, em regra, é por meio do ECAD, havendo previsão legal da gestão individual no Decreto nº 8.469/2015, porém, esse tema específico e polêmico que será abordado em texto trazido futuramente.

As associações, juntas, por meio de seus representantes, formam a Assembleia Geral do ECAD onde são tomadas as decisões sobre a Execução Pública.

Qualquer pessoa física ou jurídica que queira executar músicas publicamente (TV, rádio, cinema, serviços de streaming, casa de show, eventos, sites, hotéis, bares, restaurantes, etc.), ou seja, em um local de frequência coletiva com alcance simultâneo a várias pessoas, precisa pagar pelo uso dessas músicas ao ECAD. Isso garante a remuneração justa aos artistas e compositores.

A partir desta arrecadação, o ECAD passa o dinheiro para as associações, que fazem a distribuição aos compositores, intérpretes, músicos, editoras e produtores fonográficos.

É importante deixar claro que não há como nenhum dos artistas mencionados acima contatar diretamente o ECAD. Sendo assim, toda pessoa interessada em receber os rendimentos dos seus direitos autorais deve estar filiada a uma das associações e se comunicar com ela para que essa associação leve o seu pedido e a represente junto ao ECAD.

As associações controlam, administram e monitoram o trabalho do ECAD. Atualmente, existem sete no Brasil: Abramus, AMAR, ASSIM, Sbacem, SICAM, Socinpro e UBC. São elas que representam todos os titulares de obras musicais e fonogramas filiados a elas para que recebam os rendimentos de seus direitos.

Depois de se filiar, é muito importante que você cadastre corretamente suas obras e fonogramas (com geração do ISRC). Vamos nos atentar a esse importante tema em um próximo texto.

Direito Fonomecânico

O direito de reprodução mecânica é recebido sobre a venda de gravações (CDs e DVDs, por exemplo). Neste caso, os percentuais que vão para os artistas e compositores são definidos em contrato com a editora, gravadora ou agregador digital.

Como o mundo virou suas atenções ao streaming, muita gente se pergunta sobre os direitos envolvidos em serviços tais como Spotify, YouTube, Deezer e Apple Music. Pois bem, o entendimento no Brasil é que o streaming deve ser considerado execução pública. Mas é um assunto espinhoso, novo, e que traz mudanças constantemente.

Vamos tentar focar na questão financeira para o artista. Hoje, em nosso país, existe uma divisão no streaming de 25% para execução pública (que é recolhido pelo ECAD) e 75% para o direito mecânico digital (repassado através de editoras e selos). Portanto, quem tem música nessas plataformas tem direito a receber por essas duas vias.

É importante ainda esclarecer como é feita a divisão dos valores do direito fonomecânico gerados no streaming. A conta funciona, em um exemplo genérico, da seguinte forma:

* 30% fica com a loja ou player;
* 58% fica para a parte conexa;
* 12% fica para a parte autoral.

Há ainda o percentual que fica com as agregadoras, empresas que se comunicam com as plataformas e fazem a distribuição digital. Há agregadoras que cobram percentuais, outras, valores fixos para cada lançamento, entre outros formatos de negócio. Esses termos variam e cabe ao artista decidir qual é a melhor para si.

Como se pode ver, o direito e os rendimentos no mundo digital ficaram mais complexos do que a simples incidência sobre o valor da venda de discos.

Direito de Sincronização ou Inclusão

Também chamado de Sync, é o direito recebido pelo titular pela inclusão de obras musicais e fonogramas seus em produtos audiovisuais. O direito geralmente é fornecido por um valor combinado entre a produtora audiovisual e os titulares dos direitos da obra e do fonograma. Assim como o valor, outras condições de uso deverão ficar previstas expressamente em contrato escrito.

A produtora, então, deverá procurar compositores e editoras, intérpretes e gravadoras, para negociar o uso de determinada canção pré-existente em seu filme e, geralmente, contrata um compositor de trilha original para criar a atmosfera sonora da obra audiovisual e outros procedimentos profissionais necessários à sincronização adequada das músicas em cada cena de todo o audiovisual. Muitas vezes o artista cria músicas originais que passam a integrar a trilha sonora do audiovisual. De todo modo, o valor pelo direito de sincronização é definido no contrato entre as partes.

Existem, ainda, bibliotecas de música. Bastante utilizadas por produtoras de cinema, elas oferecem um vasto repertório de músicas para inclusão em filmes e séries. Você, como músico, pode incluir suas canções na biblioteca que mais lhe agradar e receber pela sincronização quando a sua música for escolhida e sincronizada.

Ter uma música em um filme, novela ou série pode gerar bons rendimentos e maior visibilidade ao artista. Isso porque, além do direito de sync, o músico tem direito a receber pela execução pública deste produto (sobre os quais falamos no primeiro tópico) quando executado em salas de cinema, na Netflix e na TV, por exemplo. Importante dizer que, para que todos recebam corretamente os rendimentos destes direitos, é necessária a confecção da cue-sheet do produto, assunto que trataremos em um novo post em breve.

Como dissemos no início do texto, há uma gama de possibilidades para compositores, músicos e artistas serem remunerados com a música. Naturalmente, não estamos dizendo que seja simples e fácil. Por outro lado, quem escolheu ter uma carreira artística sabe que não é um trabalho como outro qualquer: há paixão e sentimentos envolvidos. Nosso objetivo, portanto, é dar subsídios para que você possa expandir os horizontes e viver dignamente da sua arte. Agora que você entendeu um pouco mais sobre seus direitos, mão na massa!

Nenhum comentário:

Postar um comentário