Dando continuidade a série “História e estórias da MPB”, hoje trago aos amigos leitores a saudosa figura da Aracy de Almeida, artista que se viva estaria completando 100 anos no próximo dia 19 de agosto de 1914. Única filha do casal de protestantes Baltazar e Hermogênea, Aracy de Almeida costumava na infância e adolescência interpretar hinos religiosos na Igreja que os pais frequentavam. Ao mesmo tempo que entoava músicas sacras na Igreja em que seus pais frequentava, a futura artista do rádio também costumava, escondida dos pais, cantar músicas de entidades em terreiros de candomblé e no bloco carnavalesco “Somos de pouco falar”.
Foi através do compositor Custódio Mesquita que conseguiu a primeira oportunidade em rádio em 1933 depois de cantar a música “Bom-dia, Meu Amor” (Joubert de Carvalho e Olegário Mariano). Ao entrar na Rádio Educadora a artista teve também a oportunidade de conhecer aquele que viria a se tornar o compositor mais expressivo em toda a sua carreira: Noel Rosa. Logo na primeira oportunidade que tiveram de conversar Noel a convidou para tomar umas cervejas Cascatinhas (marca de cerveja apreciada por Noel, entre outros boêmios da época) na Taberna da Glória. O convite foi prontamente aceito pela pretensa cantora que a partir dali passou a acompanhar o compositor por diversas noites até a sua prematura partida.
A sua convivência com Noel acabou, de certo modo, abrindo algumas portas para a carreira da artista. A primeira oportunidade deu-se a partir da gravação do seu primeiro disco em 1934 pela Columbia com a música Em plena folia (Julieta de Oliveira) e, posteriormente, o seu primeiro contrato com a Rádio Cruzeiro do Sul. Também neste mesmo ano gravou “Seu Riso de Criança“, de autoria do poeta da Vila. No ano seguinte transferiu-se para a RCA Victor participando de corista em diversas gravações e lançando diversas canções de Noel, o que acabou tornando-a numa das maiores intérpretes de samba da época e maior intérprete do compositor de Vila Isabel (com Noel vivo, Aracy chegou a gravar 34 canções de sua autoria). Sua identificação com o samba era tamanha que acabou ganhando o apelido de “O Samba em Pessoa”, pelo apresentador César Ladeira, com grande mérito a partir do resultado da gravações de canções como Palpite infeliz, O X do problema, Eu sei sofrer, Último desejo, Feitiço da Vila, Século do Progresso entre outros.
Ganhou grande popularidade ao longo dos anos de 1930 atuando em diversas emissoras de rádios cariocas, dentre elas a Rádio Philips com Sílvio Caldas, no Programa Casé; na Cajuti, Mayrink Veiga e Ipanema, excursionando com Carmen Miranda pelo Rio Grande do Sul e Tupi. Em 1939 foi responsável por lançar o compositor Davi Nasser e ser a primeira intérprete de uma canção de autoria de Ari Barroso que viria a tornar-se um clássico da música popular brasileira: “Camisa amarela“. Na década seguinte lançou outro clássico do cancioneiro popular, o samba “Fez Bobagem” (Assis Valente).
Na década de 1950 Aracy foi responsável pela reavaliação da obra do poeta da Vila ao gravar dois álbuns dedicados a sua obra acompanhada pela orquestra de Vadico. Em sua biografia merece destaque ainda alguns acontecimentos ao longo da década de de 1960 como os espetáculos realizados no Teatro Opinião batizado de “Conversa de botequim”, dirigido por Miele e Ronaldo Boscoli; o show “Samba pede passagem”, o programa de calouros “É proibido colocar cartazes” e o show “Que maravilha!”, no Teatro Cacilda Becker em São Paulo, ao lado de Jorge Ben, Toquinho e Paulinho da Viola.
A partir dos anos de 1970 Aracy começou a trabalhar em vários programas de TV e ganhou muito mais popularidade como caloura do que como a cantora popular cantora dos anos de 1930. Talvez tenha morrido realizada, uma vez que dizia que nunca gostou de cantar, via no canto a oportunidade apenas de sobreviver. Em 1988, com um edema pulmonar, ficou internada entre São Paulo e Rio de Janeiro. Neste período Silvio Santos telefonava-lhe todos os dias, às 18 horas, para saber como ela estava. Depois de dois meses em coma, voltou a lucidez por dois dias, e, num súbito aumento de pressão arterial, faleceu no dia 20 de junho, aos 74 anos. Não casou e nem teve filhos pois dizia que o homem ideal havia nascido morto por isso nunca casou.
Deixo aqui para os amigos leitores duas canções da lavra do saudoso poeta da vila. A primeira vem a ser “Último desejo”, clássico de nossa música:
A segunda canção vem a ser “Palpite infeliz”, outro clássico do nosso cancioneiro:
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