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quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

PORCELANA, ARQUÉTIPO DE DELICADEZA, TÉCNICA E BOM GOSTO

Em disco que celebra um profícuo encontro musical, Alaíde Costa e Gonzaga Leal debruça-se, de modo atemporal, sobre a música brasileira, fazendo também incursões à música contemporânea portuguesa.

Por Bruno Negromonte



Não é de hoje que esta dupla vem encantando a distintos públicos, em especial  o público pernambucano a partir de apresentações tanto na capital quanto em cidades do interior do Estado. Em uma época regida por características que prezam o imediatismo em uma sociedade cada vez mais avassaladora no sentido mais pejorativo da palavra, esse encontro musical entre Alaíde Costa Gonzaga Leal chega primeiramente como um afronto a esses tempos modernos e posteriormente um como alento para os ouvidos mais apurados. É uma contenda entre o apuro estético e o atual mercado fonográfico. Uma contenda onde a coerência, adjetivo que pauta a carreira desses dois artistas há décadas, dificultosamente vence todos os estorvos existentes a partir de um seleto repertório, interpretações impecáveis, uma sonoridade construída de modo cativante a partir de gabaritados músicos e melodias que por suas respectivas qualidades corroboram para tudo isto. Amizade construída por afinidades, a dupla vem desde dividindo vocais desde o convite feito por Leal à artista carioca em 2006 para participar do álbum "E O Nosso Mínimo... É Prazer" para interpretar a faixa "Meiga presença", de autoria da dupla Paulo Valdez e Otávio de Moraes. Desse encontro, anos depois surgiu o espetáculo que daria origem a este álbum que trata-se não apenas de uma celebração por quase uma década de encontros musicais, mas principalmente de um presente de aniversário do artista pernambucano a esta artista considerada a  dama da canção brasileira (título mais que merecido a esta mulher que traz a sua história intrinsecamente ligada à música popular brasileira ao longo dos últimos sessenta anos) pelos seus oitenta anos.


Pernambucano da cidade de Serra Talhada, Gonzaga Leal vem nas últimas quatro décadas escrevendo a sua história na cena teatral e musical do estado a partir de projetos diversos que abrangem espetáculos musicais como "Quando a dor não tem razão", o recital "Aparição", o espetáculo "Gonzaga Leal canta Heitor Villa-Lobos e declama Manuel Bandeira", sem contar os álbuns "Minha adoração: um tributo a Nelson Ferreira", "Gonzaga Leal cantando Capiba... e sentirás meu cuidado" entre outros títulos que reiteram o compromisso intuitivamente assumido pelo artista em manter-se fiel as suas escolhas. Essa fidelidade expressasse de modo visceral e singular em cada disco que apresenta, pois é possível afirmar que sua discografia é constituída por um mosaico do seu universo particular. Em seu mais recente projeto solo, o próprio título afirma isso, não é aà toa que o disco chama-se "De mim". Já Alaíde Costa nasceu no Méier, bairro da Zona Norte do Rio de Janeiro. Suas pretensões artísticas revelaram-se ainda na infância quando participou de diversos  programas de rádio existentes na época. Sua estreia como cantora foi em um circo, logo em seguida, aos 13 anos, venceu um concurso de melhor cantora jovem interpretando a canção "Confesso", composição que na época fazia parte do repertório da cantora Linda Batista. O concurso promovido por Paulo Gracindo, no seu programa Sequência G3, da Tupi, do Rio de Janeiro, foi o pontapé inicial para uma série de notas máximas conquistadas  em quase todos os programas de calouros aos quais apresentava. Apesar disso, Alaíde não possuía a voz que predominava nos estúdios de gravações na época. Seu canto suave e afinado não tinha vez diante da potência vocal de muitas contemporâneas suas e isso, por conseguinte, acabou prejudicando a sua inserção no mercado fonográfico de imediato. No entanto, pouco tempo depois conhece João Gilberto e por conseguinte acaba conhecendo a grande maioria dos artistas que iriam protagonizar o movimento da Bossa Nova, dentre eles Oscar Castro Neves que a apresenta a Vinicius de Moraes e este ao ascendente Tom Jobim, construindo a partir daí uma sólida e coerente musical nos últimos cinquenta anos.

Gravado entre o primeiro semestre e o início do segundo semestre deste ano no estúdio Muzak, "Porcelana" contou com um time de primeira linha da música pernambucana nesta celebração. Encabeçando os arranjos os talentosíssimos Maurício Cezar e Marcos FM. Ambos arranjadores também participam do disco como instrumentista. De um lado, Maurício fica responsável pela execução dos pianos; enquanto FM pelos baixos. Outros nomes que corroboraram de modo imprescindível para a bela tecitura sonora e para que o álbum tivesse um refinado acabamento foram os percussionistas Sérgio CassianoGeorge Rocha e Tomás Melo, os contrabaixistas Cacá Barreto e Marcos FM, o bandolinista Rafael Marques, o acordeonista Julio Cesar, o maestro e violonista Claudio Moura, o músico Adilson Bandeira (sax-tenor, clarinete e clarone), o violoncelista Fabiano Menezes, o baterista Ebel Perrelli, o Guitarrista Breno Lira, o piano de Kelsen Gomes, a Orquestra Quebra-Mar e o trompete de Flávio Oliveira.

Assim se faz "Porcelana", uma espécie de arquétipo de delicadeza, técnica e bom gosto. Falo dessa definição enquanto presente porque a cada nova audição das faixas existentes tem-se a impressão de novas descobertas e, por conseguinte, novas e parciais sensações neste disco que exerce uma espécie de magnetismo qdo início ao fim a partir de interpretações impecáveis de ambos. Um produto que traduz a perfeita sincronia entre dois talentos que apesar das peculiaridades de cada fazem-se uníssono a partir de um repertório que abrange nomes como o do cantor, compositor, multi-instrumentista e ator Sérgio Pererê ("Oiá"), canções de domínio público como "Omi Imalé", fados como "Meu amor abre a janela" (composto pelo saudoso músico Armando Machado que ganha letra do escritor e poeta português Tiago Torres da Silva), e nomes como Capiba ("Quando se vai um amor"), Alceu Valença ("Solidão")Moisés Santana ("Porcelana")Zé Miguel Wisnik e Swami Jr. ("Fim do ano")João Cavalcanti ("Frevo do contra-êxodo" e "Em tempo")Caetano Veloso e Orlando Morais ("Divinamente nua, a lua")Socorro Lira (que assina "Delicado" e traz em parceria com Consuelo de Paula a composição "Água doce no mar")Zeca Afonso ("O meu menino é d'ouro") e a dupla Rubens Nogueira e Luiz Salgado (que assinam "Bem-me-quer", parceria que conta também novamente com o nome de Consuelo de Paula). De um lado, um Gonzaga Leal em sua melhor forma a partir de verdadeiras e viscerais interpretações; Do outro Alaíde Costa, uma artista que dispensa maiores apresentações, e que vai chegando as oito décadas de vida trazendo consigo uma coerência sonora que ainda a permite a alcunha de diva quase seis décadas depois do seu primeiro registro fonográfico. Trata-se de uma perfeita simbiose iniciada nos palcos pernambucanos e que agora eterniza-se em um disco também caracterizado pela refinada produção, tal qual a variedade de cerâmica homônima ao título do projeto.


Maiores Informações:

Leal Produções Artísticas Ltda.

Rua Raul Lafayette, 191 - sala 403

Boa Viagem - Recife - PE

CEP: 51021-220

Fone/fax: (81) 3463.4635 e 8712.5110






Twitter - @GonzagaLeal


O álbum pode ser encontrado nos seguintes endereços:

Leal Produções Artísticas - Fone/fax: (81) 3463-4635

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