Ele se diz 'maluco' e busca todos os álbuns de música brasileira já lançados.
Por Rodrigo Ortega (G1)
Ter uma cópia de todos os vinis já lançados de música brasileira é o objetivo de Zero Freitas, empresário que já estima guardar 5 milhões de álbuns (entre nacionais e estrangeiros) em dois galpões em São Paulo. Ele chamou atenção entre colecionadores do mundo ao comprar 1 milhão de discos de um ex-lojista dos EUA, e foi destaque em reportagem da "New York Times Magazine" no dia 8 de agosto.
Zero contratou 16 estagiários — a maior parte estudantes de história — e uma gerente para catalogar os álbuns, em um galpão na Vila Leopoldina, Zona Oeste de São Paulo. O G1 visitou o espaço com 500 mil discos, onde também funciona uma das empresas dele, que aluga luz e som para peças de teatro. Zero mostrou o processo de catalogação. Em outro galpão maior próximo, na Lapa, ele diz guardar mais 4,5 milhões de álbuns (veja o vídeo acima).
O empresário, músico e colecionador quer "todos os discos de música brasileira" pois tem "obsessão por memória e história". Além do acervo em galpões, ele contabiliza 100 mil discos em casa. Os que ficam nos galpões são catalogados em uma velocidade média de 500 por dia, o que não dá conta de escoar os lotes de centenas de milhares que ele compra em todo mundo.
Quem é Zero Freitas
José Roberto Alves Freitas, que adotou o apelido Zero, é um empresário paulista de 60 anos — ele aponta erro do "New York Times", que disse que sua idade é 62. Ele é graduado em Música pela Universidade de São Paulo (USP), e se especializou em trilhas para peças de teatro. Em paralelo, cuida de negócios de transporte da família. Hoje é diretor comercial da transportadora Benfica, que, entre outros negócios, opera linhas de ônibus em Diadema (SP).
"Não tive prazer nos primeiros dez anos de trabalho com transportes. Eu tinha que ser guia turístico e viajava o Brasil todo com 90 idosas malucas e meia dúzia de jovens, nos anos 70", conta. Ele diz já ter se dedicado "24 horas por dia" tentando conciliar as trilhas de teatro e os negócios familiares. Hoje, continua com a "responsabilidade" de dirigir a companhia, mas tem mais tempo para a crescente coleção de vinis.
O empresário tem três filhos do primeiro casamento, que durou 22 anos. O segundo casamento, sem filhos, já dura 20 anos. Foi com a atual mulher que ele diz ter começado seu período de "abundância". O sucesso financeiro, segundo ele, "já estava no mapa astral".
"Quando conheci minha atual mulher, isso me abriu um canal de abundância, uma coisa mística, esotérica. Abundância financeira, mesmo. Tinha alguma coisa que emperrava isso. De repente, passei a investir em coisas que davam muito certo. Comprava uma casa caindo aos pedaços, no dia seguinte ia uma incorporadora e oferecia três, quatro vezes o que eu paguei. Isso já estava no meu mapa astral desde o início", afirma.
'Maluco'
"Ele era mais maluco que eu", diz Zero Freitas sobre Olivier Toni, maestro e professor da Faculdade de Música da USP. Seu ex-professor era obcecado por buscar partituras de música barroca no interior de Minas Gerais, e acabou se tornando uma das inspirações para o esforço de Zero por colecionar música.
A paixão também vem de família. "Minha mãe é louca por música. Quando criança, me passou essa paixão por música brasileira, e aos cinco anos me comprou um piano", lembra. O primeiro vinil foi "Roberto Carlos canta para a juventude". Também é do cantor capixaba uma das peças mais valiosas da coleção atual: "Louco por você", trabalho de estreia, que foi renegado pelo próprio Roberto. Enquanto fãs do "rei" sonham com uma cópia do álbum, Zero tem quatro.
Quando vale a coleção? De cara, ele responde: "Não tem preço e não está à venda". Mas, fazendo um cálculo geral, ele diz que, entre bolachas "que não valem nada" e outras raríssimas, o valor total deve bater os R$ 5 milhões.
'Obscuridades'
"Só de discos de cantoras evangélicas cariocas, tenho mais de mil, daqueles que nem a mãe da artista deve saber que existe. Mas me interessa pela obscuridade sociológica", diz aos risos. Os amigos sabem do interesse dele por discos renegados. "No último 'lixo' que me deram, veio um LP do América do Rio, de 1960. Eu nunca vi isso e tenho certeza que os torcedores do América também não conhecem", conta.
"Só de discos de cantoras evangélicas cariocas, tenho mais de mil, daqueles que nem a mãe da artista deve saber que existe. Mas me interessa pela obscuridade sociológica", diz aos risos. Os amigos sabem do interesse dele por discos renegados. "No último 'lixo' que me deram, veio um LP do América do Rio, de 1960. Eu nunca vi isso e tenho certeza que os torcedores do América também não conhecem", conta.
A coleção "deu um salto" quando ele mergulhou no eBay, site de leilões online, no começo dos anos 2000. "Comprava raridades por quase nada", diz.
Zero diz não comprar mais pelo site, mas ainda arremata coleções inteiras de todo o mundo, com a ajuda do "olheiro" carioca Allan Bastos, que conheceu no eBay. Também colecionador, Allan morava em Nova York e agora se mudou para Paris. Ele faz contato com pessoas que ajudam a achar oportunidades de compras em várias cidades. As compras chegam de navio, em containers.
Projeto de site
O próximo projeto é o site Emporium Musical, onde pretende colocar a lista de todo o acervo catalogado e abrir para consulta pública. Os interessados em conhecer o disco teriam que contatar Zero pelo site e combinar a visita diretamente, planeja.
O empresário não tem ideia de quantos discos ainda precisa comprar para completar a ambiciosa meta de ter toda a música brasileira em vinil. Ele também não sabe qual o número exato de discos de música brasileira e estrangeira tem, já que a coleção total ainda está sendo catalogada.
Mas, pelo menos entre os discos de 78 rotações (populares na primeira metade do século 20), há boa expectativa de chegar à meta. "Há uma estimativa de que foram lançados 60 mil discos brasileiros neste formato. Estou de olho em uma coleção que vai me levar bem perto deste número", adianta Zero.
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