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quinta-feira, 28 de março de 2013

OS LOUROS DA OBSTINAÇÃO

Oriundo do Crato, o compositor radicado no Recife a mais de 40 anos acaba de lançar o décimo volume da exitosa série Forroboxote, trabalho que retrata a profícua parceria de Xico Bizerra com um dos maiores nomes da música nordestina e coroa em favor da música nordestina.

Por Bruno Negromonte




Este é daqueles álbuns que pode ser considerado como supra sumo da mais genuína cultura nordestina. É a soma do imensurável talento de um dos maiores e mais requisitados compositores nordestino da atualidade com a inquestionável genialidade de um exímio instrumentista e de inestimável valor cultural para o Nordeste brasileiro.

O compositor Xico Bizerra somou seu talento ao daquele que refere-se como "mestre". E da soma desses talentos surgiu "Luar Agreste no Céu Cariri", décimo título da série Forroboxote, projeto que teve início em 2002 que hoje soma mais de 140 registros e a adesão de nomes como Elba Ramalho, Chiquinha Gonzaga, Dominguinhos, Flávio José, Santanna, dentre outros grandes nomes do cancioneiro nordestino.

Este projeto germinou a partir de um final de tarde de fevereiro de 2011, quando Xico recebeu uma ligação de Dominguinhos pedindo-o para colocar letra em um forró que ele estava preparando para ser gravada por uma grande intérprete da MPB. Prontamente, o Xico comprometeu-se e marcou um encontro. A reunião aconteceu na casa do amigo em comum Paulo Vanderley, pesquisador e mantenedor de alguns sites que reverenciam grandes nomes da música brasileira, dentre eles Jackson do Pandeiro, Luiz Gonzaga e o do próprio Dominguinhos.

De modo complacente, o instrumentista em profícua tarde não só  mostrou a composição na qual queria os versos do poeta cratense como também, de modo improvisado, fez com que Xico levasse para casa 11 melodias para letrá-las. Tamanha responsabilidade para esse obstinado e perseverante defensor das genuínas raízes musicais nordestina, que não abstendo-se da responsabilidade, Xico ainda se propôs a colocar letra em uma melodia composta por Dominguinhos e Anastácia para o álbum "Lamento de caboclo", quarto disco na discografia do artista pernambucano, de 1973 cujo título é "No tempo do meu pai".

"Luar Agreste no Céu Cariri" além da faixa citada no parágrafo anterior, ainda conta com mais onze, são elas "Senhora da minha alegria", "Estrelas que se encantam", "Mil sorrisos", "Sem talvez ou porém", "Casa da luma menina", "Até onde a alma alcança", "Pássaros de papel", "Tempo de nós dois", "Morena cor de saudade", "Todo tudo e pouco nada" e "Lua Brasil" (única composição assinada exclusivamente por Xico) arraigando o nome do cearense entre os maiores compositores da região, assim como também propulsando-o para o definitivo reconhecimento nacional.

O receio de não corresponder à altura fez Xico protelar o projeto que passou por diversas etapas. A princípio o compositor ouviu por diversas vezes tais melodias compostas de improviso por Dominguinhos e titubeava na hora de versejá-las. Xico relutou, cogitando até a possibilidade de guardar pra si aquele material. "Outras vezes eu imaginava tratar-se de um brinquedo e eu, menino abobalhado com o presente recebido, sem querer estragá-lo, preservava-o egoisticamente das outras pessoas. Aquelas músicas eram jóias preciosas que não podiam ser usadas no dia-a-dia, ou um vinho temperado pelo tempo, que não devia ser bebido de um gole só", relata Xico.

Posteriormente, em momentos de uma abnegação desnecessária, Xico de modo altruísta deu o melhor de si para as melodias daquele que Luiz Gonzaga definiu como principal discípulo. Imbuído de inspiração, Xico abriu o leque de ritmos e conseguiu, sem destoar da proposta original, ir além das próprias expectativas e mesmo doando-se de modo visceral acreditava que ainda era pouco diante de tamanha responsabilidade. Afinal alguns dos maiores nomes da MPB já estiveram na mesma condição que ele. Como corresponder letras à altura de nomes Chico Buarque, Djavan, Gilberto Gil, Fausto Nilo, Ednardo entre outros conceituados nomes do cancioneiro popular brasileiro. Xico conseguiu.

Das canções presentes, Dominguinhos entoa duas: "Senhora da minha alegria" (faixa que dividi os vocais com o cantor e instrumentista Waldonis e que também encontra-se presente no box "Pernambuco forrozando para o mundo", de 2012) e "Lua Brasil" (Faixa também presente no oitavo Forroboxote, cujo título é "Com a sanfona agarrada no peito"). As demais ficam a cargo de Elba Ramalho ("Estrelas que se encantam"), Guadalupe ("Mil sorrisos"), Adelson Viana ("Sem talvez ou porém"), Socorro Lira ("Casa da luma menina"), Maria Dapaz ("Até onde a alma alcança"), Chris Nolasco ("Pássaro de papel"), Maciel Melo ("No tempo do meu pai"), André Rio ("Tempo de nós dois"), Paulinho Leite e Leda Dias ("Morena da cor de saudade") e Tonfil ("Todo tudo e pouco nada"). Interpretes da mais alta estirpe dando voz a fados, forrós, xotes, choros, toadas dentre outros ritmos presentes nesse trabalho que mostra a abrangência poética de Xico. A única faixa não presente no disco é "Eternamente nós", que seria interpretada por Geraldo Maia e Irah Caldeira, mas que a pedido de Dominguinhos ficou de fora do disco. "A canção ficou de fora devido a um pedido de Dominguinhos, que a cedeu à Guadalupe. Ela está preparando um disco a ser lançado em breve", revela Bizerra.

Quando questionado sobre o projeto, Xico desvanecidamente diz: "Acho que cheguei ao estágio mais elevado que um letrista pode almejar". O compositor talvez fale desse modo sem ponderar que já faz tempo que se inclui no hall dos grandes nomes do cancioneiro nordestino como podemos avaliá-lo a partir não só da quantidade de canções de sua autoria gravadas, mas principalmente pela qualidade daquilo que sai da ponta de sua caneta.

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