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quinta-feira, 21 de novembro de 2019

TURIBIO, O DESBRAVADOR



Por Ricardo Dias


Turibio Soares Santos nasceu em 7 de março de 1943, em São Luis, Maranhão. De família musical, logo que se mudaram para o Rio de Janeiro, em 1946...

Não, nem pensar. Turibio não merece uma descrição careta como essa. Vamos tentar melhorar:

TODO MUNDO sabe quem é Turibio Santos. E o motivo é simples: ele, durante anos, foi a cara do nosso violão no mundo todo. Foi o desbravador, o cidadão que mostrou ao mundo que não nos limitávamos a João Gilberto. Claro, houve quem fosse antes, como Laurindo Almeida. Mas nas salas de concerto desse mundão de Deus foi Turibio o nosso Armstrong. Até então o violão clássico do Patropi praticamente não existia no exterior.

Seus mais de setenta discos começam nas aulas de violão de Antonio Rebello, avô dos irmãos Abreu já citados aqui. Com os colegas Jodacil Damaceno e Hermínio Bello de Carvalho forma uma trinca que movimenta nossa vida cultural violonística. Vai a Paris em 1965 ganhar o mais prestigioso concurso de violão, e em 1970 se muda para lá, de onde domina o mundo, divulgando nossa música com competência e talento.

Hoje em dia fazer um recital no exterior é mais ou menos o seguinte: o candidato manda currículo, gravação, foto, tudo num clicar do mouse. Manda para 150 lugares diferentes com apenas mais um clique. Dando certo, com outro clique compra a passagem, mais um reserva o hotel, com outro divulga para toda a humanidade via redes sociais. Mas nos anos 60...

Você datilografava seu currículo. Ao fazê-lo usava um papel carbono junto e conseguia mais umas 3 cópias. Podia fazer cópias fotostáticas, mas eram raras e caras. Em seguida, dirigia-se ao estúdio fotográfico de sua confiança e posava para fotos promocionais, em preto e branco. Pagava caro, e tinha que pagar também por cada cópia. Como, em meu exemplo, você era o primeiro violonista a se arriscar dessa forma, não tinha ninguém a quem perguntar o que fazer. Não havia Google, amiguinhos. Então você gastava o preço de um rim telefonando para aquele concertista estrangeiro que esteve aqui há alguns anos, ou perturbava aquele violinista ou pianista que conhece um empresário. Em seguida manda para ele uma carta, que demora uma semana para chegar... O agente estrangeiro, se você tiver dado muita sorte, te quer, e sugere uma data. Mas justo nessa data é aniversário da vizinha de sua tia avó. Você escreve de volta dizendo isso, e sugerindo uma data. Mais uma semana, ele escreve de novo... Vou parar por aqui, mas creio que já dá para ter uma ideia.

Turibio foi esse cara para TODOS os que vieram depois. Abriu portas, arrombou janelas, derrubou cercas, generosamente foi avalista de todos os que vieram depois. Mas não foi só isso. Quando Villa Lobos escreveu seus 12 Estudos, ninguém teve coragem de encarar a todos – nem Segovia! Uns 30 anos depois nosso amigo, a convite de dona Arminda Villa Lobos, peitou o desafio.

Ah, você, estudante de violão, arrogante como todos nós fomos, torce o nariz, pois VOCÊ toca os 12 Estudos? Que bonitinho! Sabe quem foi que te proporcionou isso, um estudo universitário de violão onde os 12 Estudos são parte do programa? Onde você consegue fundamentação técnica para chegar lá, coisa que não existia nos anos 50 e 60? Pois é. Já falo disso daqui a pouco, mas entenda que o mundo não começa na hora em que você colocou corda no seu violão pela primeira vez.

Pois, seguindo, teve que aprender a tocar o Aranjuez, então um Everest técnico, em um mês. Gravou na França discos fundamentais e voltou para o Brasil. Foi ser diretor da Sala Cecilia Meirelles (principal sala de música de câmara no Rio de Janeiro) até que, numa história que já contei aqui, Ricardo Tacuchian foi buscá-lo para abrir um curso de violão na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Chega, né? Não, não chega. Se meteu na música popular, tocou com Deus e o mundo, ajudou a revelar talentos, FORMOU talentos, compôs, administrou e fez crescer o Museu Villa Lobos. A gente olha para algum campo do violão e encontra o dedo dele – se não encontrar o braço todo.

Encerro com as palavras da professora e concertista Maria Haro, aluna e amiga de Turibio:

"Turibio é um ser veemente e prático, pragmático e visionário, passional e simples, um maranhense - carioca apaixonado por sua infância na bela ilha de São Luis, um artista maior do violão e da música brasileira. É uma honra ter sido sua aluna, ser sua amiga e poder - vez em quando - tocar uns duetos com ele.

Turibio Santos, Mestre querido, sou eternamente grata a você, em meu nome e de todos a quem você fez e faz tanto bem , por esta tua vida intensa, divertida e dedicada à música e ao violão."

PS: Seu recital de despedida do Brasil, antes de ir morar em Paris em 1969 dá bem a ideia da mestria técnica que ele já possuía.




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