O MENINO, A MENINA E A ELEIÇÃO
Tudo parecia igual naquele meio-dia, num domingo antes da eleição. O restaurante sempre à meia-lotação e o cheiro de boa comida no ar. De diferente, uma passeata política que passava na rua em frente: carros, bandeiras, zoada muita. Passada a multidão, tudo volta ao normal. Quase. Em mesas diferentes e à pouca distância entre elas, pessoas vestidas de vermelho, umas, e de amarelo, outras, começam a se desentender e elevam o tom das falas. A motivação, percebe-se, é política. Refere-se a diferenças entre as partes sobre o pleito que se aproxima e os candidatos que o disputam. Ninguém mais presta atenção ao DVD de Maciel Melo que passa nos dois televisores estrategicamente colocados no interior do restaurante. Sobram insultos, de parte a parte. Moucos a tudo, duas crianças, um menino e uma menina, não mais que 5 anos, brincam despreocupadamente no parquinho infantil a um canto do lugar, indiferentes à discussão que se travava entre seus pais, em mesas opostas. Foi quando me lembrei da última eleição, quatros anos passados: nela, um Senador e uma Presidente disputavam o comando do País e o clima era parecido com o atual. Hoje, denunciado por crimes, ele foi ‘rebaixado’ a Deputado, única e humilhante forma de preservar um foro dito ´privilegiado’; ela, afastada do Poder, amargou um quarto lugar na disputa pelo Senado, por um estado do Leste. Os candidatos atuais abominam a presença dos dois em seus programas políticos. Valeu a pena tanta briga, discussão e inimizade em defesa dos protagonistas da época? Terá valido a pena, quando o domingo passar, a discussão e a inimizade em defesa dos protagonistas atuais? Melhor não seria cada um exercer seu direito de voto livremente, sem pressão, de acordo com a consciência de cada um? Chegou minha hora de ir embora. No parquinho, as duas crianças de 5 anos, ele de camisa azul, ela de short vermelho, como se fossem amigos há tempos trocam um fraternal, inocente, desinteressado e emocionante abraço. Antes de sair, dei um beijo na menina, um cheiro na cabeça do menino e fui-me, triste com a discussão que prosseguia dentro do restaurante. Convenci-me da certeza que sempre tive: criança é muito mais inteligente que adulto. Por isso, melhor ficar com a pureza delas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário