Por Bruno Negromonte
Em setembro de 2013 saía de cena Carlos Fernando, compositor de canções para alguns dos maiores intérpretes da música popular brasileira a exemplo de Elba Ramalho, Geraldo Azevedo, Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Jackson do Pandeiro entre outros. Natural de Caruaru, Carlos participou do Movimento de Cultura Popular de Pernambuco - um dos focos da resistência ao governo militar no Estado - ainda na década de 60 e lá teve a oportunidade de conhecer alguns nomes da cena cultural pernambucana, dentre eles Nana Vasconcelos e Geraldo Azevedo, com quem deu início a parceria musical. A canção foi concebida sob a inspiração da peça de teatro, “A chegada de Lampião no inferno”, baseada em livro de cordel escrito por José Pacheco e que foi escrita por Carlos Fernando (com Geraldinho também chegou a apresentar um programa de televisão no Recife). "Aquela rosa" (canção que em 2007 completou cinquenta anos) foi consagrada vencedora da Primeira Feira Nordestina de Música Popular na voz de Teca Calazans, ao lado de “Chegança de fim de tarde”, de Marcus Vinícius. Sempre que questionado sobre a parceria Geraldo Azevedo responde: "Tenho muito orgulho de ter sido seu primeiro e maior parceiro". Daí em diante vieram inúmeras parcerias com o cantor e compositor de Petrolina e outros sucessos como foi o caso da estrondosa canção "Banho de cheiro", que gravada por Elba Ramalho em 1983 no álbum "Coração brasileiro" ganhou um grande alcance popular. Vale o registro da concepção de trabalhos também para a televisão (como foi o caso da novela “Saramandaia” e do seriado infanto-juvenil “Sítio do Pica-Pau Amarelo”), além do cinema (onde podemos citar o filme “Pátriamada”, dirigido por Tizuka Yamazaki).
Em 1979, ousando de modo vanguardista Carlos Fernando apresenta o projeto "Asas da América", reunindo a nata da MPB para dar novo fôlego ao gênero. Em um projeto ousado e inédito na época, Carlos Fernando trouxe para dar voz a esse novo conceito de fazer frevo nomes como Jackson do Pandeiro, Zé Ramalho, Gilberto Gil, Amelinha, As Frenéticas, MPB-4, Lula Queiroga, Lenine, Robertinho de Recife, Teca Calazans, Lulu Santos, Trem de alegria, Alcione, Raimundo Fagner, Moraes Moreira entre outros ao longo de seis volumes que foram lançados ao longo dos anos de 1979 e 1993 (além do projeto "Asinhas da América", lançado em 1995). Como bem disse Fábio Cabral, proprietário da Loja Passadisco, “Aquele foi um momento em que o frevo estourou com uma força gigantesca. E isso porque era um frevo feito com uma linguagem jovem, pois Carlo Fernando era um jovem, andava com gente jovem, antenada. A partir daí, foi um ‘boom’ e até mesmo artistas que não tinham uma ligação com o frevo, passaram a gravar, pois viram naquela música um filão interessante a se explorar na indústria fonográfica”. Tendo flores em vida, Carlos Fernando foi o homenageado, ao lado de Cícero Dias e de Enéas Freire, pelo Galo da Madrugada, em 2011, e pela prefeitura do Recife em 2009 pela passagem dos 30 anos do lançamento deste projeto que revolucionou a indústria fonográfica à época, assim como também deu um novo fôlego a este genuíno gênero pernambucano. Dentre suas produções contabiliza-se também, no aniversário de 150 anos da Capital do Agreste, o disco chamado "Crônicas Musicais de Caruaru", o que Onildo Almeida, outro compositor caruaruense, considera um documentário sobre o município.
Eis as faixas deste álbum que sem dúvida alguma é um marco não apenas para o gênero, mas em particular para a indústria fonográfica brasileira:
ASAS DA AMÉRICA – Frevo (1979)
[Varios intérpretes]
Epic/CBS LP 235.035
Faixas :
01 - O HOMEM DA MEIA-NOITE (Alceu Valença/Carlos Fernando) Alceu Valença
03 - LENHA NO FOGO (Carlos Fernando/Capiba) Geraldo Azevedo y Carlos Fernando
04 - OLHA O TREM (Carlos Fernando) Elba Ramalho
05 - AQUELA ROSA (Geraldo Azevedo/Carlos Fernando) Flaviola
06 - VALORES DO PASSADO (Edgard Morais) As Sereias
07 - A MULHER DO DIA (Carlos Fernando) Elba Ramalho
08 - SALVE A TORCIDA (Carlos Fernando) Chico Buarque
09 - SOU EU O TEU AMOR (Alceu Valença/Carlos Fernando) Jackson do Pandeiro y Gilberto Gil
10 - PITOMBA PITOMBEIRA (Carlos Fernando) Alceu Valença
11 - ATOR FOLIÃO (Carlos Fernando/Geraldo Azevedo/Marco Polo) Marco Polo
12 - ASAS DA AMÉRICA (Geraldo Azevedo/Carlos Fernando) Geraldo Azevedo
"Carlos representava bem a alegria de nosso carnaval e produziu várias músicas para festivais. ", disse o cantor Claudionor Germano ao saber da morte do colega. "Ele foi um dos grandes. Por causa dele, nosso frevo ganhou ainda mais valor. Ele produziu um estilo mais moderno, mais diferente, que ainda assim era frevo, o que o levou a ter colaborações com grandes nomes da música brasileira", completa o compositor contemporâneo e radialista, Hugo Martins.
Entre 1981 e 1990 não existia nenhuma conversa de que o frevo precisava ser renovado. Aliás, essa constatação de hoje é justamente por conta daquela década. Pois foram aqueles anos - no auge do pop rock nacional, do axé baiano e antes da explosão maior da música pernambucana, que viria com o manguebeat - o auge das produções mais felizes do frevo. O compositor caruaruense (hoje radicado no Rio de Janeiro) Carlos Fernando era um dos protagonistas desta festa frevística, pois praticamente tomou como missão artística ensolarar, arejar e desterritorializar o gênero que, cantado pelas vozes da elite da MPB, eram tratados como músicas para ser tocadas o ano inteiro.
Para comemorar os trinta anos da primeira coletânea, o compositor gostaria de ter feito mais uma edição inédita do projeto. Por falta de patrocínio, a oitava edição do Asas vai aguardar mais um pouco. Enquanto isso, o dia do frevo poderá ser fartamente comemorado no Brasil, a partir do relançamento dos sete volumes da coletânea Asas da América, reunidos com suas capas originais, numa caixa de luxo. Os discos podem ser encontrados em várias lojas, juntos na caixa, ou separados. O valor médio é R$ 22, 50 a unidade e R$ 150, a caixa (preço na Passa Disco).
Grandes clássicos do frevo canção saíram dos LPs do Asas da América que Carlinhos produziu para desaguar toda sua produção. Banho de cheiro ficou eternizada na voz de Elba Ramalho. Noites olindenses (quero dançar com você nas noites olindenses) trouxe o baiano Caetano para o frevo pernambucano. Chico Buarque cantou No dia que o Cristo falou, também no quinto volume do Asas. Carlos Fernando, além do mérito de ter composto belos frevos, também conseguia a proeza de fazer com que as gravadoras liberassem seus artistas para o projeto.
Nesse volume, por exemplo, ele trouxe Caetano e Luiz Caldas da Polygram; Alceu Valença da EMI-Odeon; Moraes Moreira da CBS e Zé Ramalho da BMG-Ariola. Caetano, aliás, cantou no Asas desde seu primeiro volume. Bom é Batutaestá na sua voz. Alceu Valença também foi constante intérprete de Carlinhos. No primeiro disco, está ele com as clássicas (O homem da meia noite e Pitomba pitombeira). Memorável também é Gilberto Gil cantando com Jackson do Pandeiro Sou eu o teu amor.
Carlos Fernando encerrou a produção do Asas do Frevo para cuidar dos discos Recife Frevoé, resultado do concurso de música carnavalesca do Recife. Era menos estressante cuidar desse tipo de produção (para fazer o Asas dependia da agenda dos grandes da MPB), por outro lado, sofreu com a queda da qualidade das músicas. "Ainda passei a chamar grandes intérpretes para cantar frevos antológicos. Uma maneira de mostrar o que foi bonito e o que estava feito e precisava mudar", diz ele, um crítico da produção atual do frevo, que ele considera fraca. "Gosto de Michiles, Geraldo Amaral, Dom Troncho, mas o resto precisava ouvir mais frevo, mais histórias para compor melhor", aconselha.
Sou grande fã desss génio.
ResponderExcluirObrigado Carlos Fernando.