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terça-feira, 19 de fevereiro de 2019

WALDIR CALMON, 100 ANOS



Waldir Calmon Gomes nasceu em Rio Novo, pequena cidade da zona da mata mineira, em 30 de janeiro de 1919. Reza a lenda que, quando Waldir nasceu, a luz de Rio Novo, que estava às escuras há três dias, voltou... 

Primeiro dos quatro filhos de Helena e Waldemar, teve uma infância pobre. Sua mãe ensinou música a todos os filhos, mas só Waldir demonstrou real interesse pela arte. Helena Calmon era uma menina rica que foi deserdada quando fugiu para se casar com Waldemar - um rapaz muito pobre. A partir daí, teve uma vida de privações até sua morte, com 42 anos. Porém, conseguiu transmitir aos filhos a educação requintada que teve. Na foto acima, Waldir com 2 anos de idade. Abaixo, duas fotos de Rio Novo na época da infância de Waldir: a primeira mostra a construção da estação de trem em 1928, e a segunda, a praça central em 1930. 

Aos catorze anos, Waldir formou um pequeno conjunto com baixo, piano, bateria, trompete e sax. O grupo apresentava-se em bailes por Rio Novo e Waldir, além de tocar piano, cantava no estilo de Orlando Silva. Seu pai não aprovou a iniciativa, mas os rapazes continuaram assim mesmo, pois o conjunto era um sucesso. "Éramos os únicos da cidade. Tinha que dar certo!", divertia-se Waldir. Pouco tempo depois, foi estudar na Academia de Comércio de Juiz de Fora, Minas Gerais. Em 1936, com 17 anos, veio para o Rio de Janeiro, trazendo uma carta de apresentação para o compositor e flautista Benedito Lacerda. Graças a essa amizade, conseguiu um pequeno trabalho como cantor e pianista na rádio Guanabara e apresentou-se em programas de grande audiência, como O Nosso Programa, de Ataulfo Alves e Raul Longras, e Samba e Outras Coisas, de Marília e Henrique Batista - ambos na rádio Cruzeiro do Sul. A convite de Eva Todor, começou a tocar também nos intervalos de seu espetáculo no teatro Rival. Waldir logo desistiu de cantar e passou a dedicar-se apenas ao piano, pois, segundo ele mesmo, não possuía uma boa voz. 

Nesta fase, lançou o solovox - um pequeno sintetizador de três oitavas, monofônico e importado que era acoplado ao piano acústico, fazendo um som diferente. O solovox, fabricado pelaHammond Organ Co norte-americana entre 1940 e 1950, foi o precursor dos teclados eletrônicos em geral e era conectado a um gabinete com um amplificador valvulado e alto-falantes de 8" que geravam o som. Clique aqui para ver fotos e ouvir o som deste instrumento. O solovox, o gabinete e o piano Steinway & Sons (que, no fim da década de 60, foi aposentado profissionalmente) eram guardados por Waldir, com muito carinho, em sua própria casa. 

Waldir, já com algum prestígio, foi convidado a fazer uma temporada na Argentina. Alguns meses depois, em 1940, a morte de sua mãe obrigou-o a voltar para o Brasil. Decidiu abandonar a música e, numa entrevista ao Jornal do Brasil em 1975, explicou que Helena Calmon foi a grande responsável por sua carreira. "Foi minha mãe que me ensinou a tocar piano, ajeitando com paciência os meus dedos no teclado. Quando ela morreu, tive raiva de tudo e resolvi abandonar a música", justificou. Foi trabalhar então no banco Moreira Salles, mas, como ele próprio dizia, "era um péssimo bancário". 

Durante a Segunda Guerra, foi convocado e serviu no Batalhão de Guardas da Presidência da República, no Palácio do Catete, e um de seus companheiros de pelotão foi o compositor e pianista Dick Farney. Aos poucos, Waldir voltou à música e acumulou o trabalho diurno com apresentações noturnas. Neste período, trabalhou no teatro Serrador, na rádio Globo e na boate Meia-noite, doCopacabana Palace. Para conciliar tudo isso, dormia apenas 30 minutos por noite. "Eu tinha que acordar cedo por causa do exército. Colocava três despertadores em uma panela e a vizinha fazia o café para mim. Saía, agarrado ao balaústre do bonde, dormindo", lembrava Waldir Calmon. Colocava o único terno que possuía entre o colchão e o estrado da cama para ficar sempre esticado. Foram tempos difíceis, mas ele sempre lembrava de seu passado com o habitual bom-humor.


Biografia (1944-1960) 

Em 1944, Waldir formou seu primeiro conjunto, Gentleman da Melodia, e com ele fez uma série de apresentações na rádio Globo.Também tocava no conjunto da boate Cassino de Copacabana, RJ. Logo depois, desligou-se do exército e levou seu grupo para trabalhar no Cassino Atlântico de Santos, SP. Em 1947, desfez o Gentleman da Melodia, pois foi convidado para tocar na recém-inaugurada boate Night and Day, do Hotel Serrador, que ficava no centro do Rio de Janeiro. Permaneceu oito anos na famosa boate carioca. Na foto, Waldir Calmon e os Gentlemen da Melodia. 

O primeiro registro do piano de Waldir em vinil, ainda com o nome artístico Waldir Gomes, é de 1941, na gravação original de Leva Meu Samba - acompanhando o autor, Ataulfo Alves (Odeon). Apesar disso, só conseguiu gravar seu primeiro disco-solo em 1951 (Star), com os boleros El Marinerito (Jorge Fargo) e Amorosamente (Tito Ribeiro e Carlos Bahr) com acompanhamento de seu conjunto. Em 1952, gravou pela primeira vez com sua orquestra: Como Eras Linda, de Theo Mackben, e Por Quanto Tempo, de Marino Pinto e Don Al Bibi (Star). Neste mesmo ano, gravou sua primeira composição - o bolero boogie Baianada (Todamérica). 

Em 1952, começou a apresentar o programa semanal Ritmos S. Simon, pela TV Tupi, e posteriormente pela TV Rio. O programa permaneceu dez anos no ar e transformou-se em um disco-brinde que o patrocinador, as lojas S. Simon, oferecia a seus clientes. Na foto abaixo, Waldir Calmon em seu programa Ritmos S. Simon, na TV Tupi (anos 50). 

Ao mesmo tempo, a Rádio Serviço e Propaganda contratou Waldir Calmon e seu conjunto para uma série de apresentações transmitida em cadeia nacional diariamente pelas Emissoras Associadas. O programa era narrado por Luís Jatobá e fez tanto sucesso que a Rádio Serviços montou uma fábrica de discos e lançou o seu primeiro LP com o pianista. O vinil chamava-se Ritmos Melódicos e possuía oito das músicas mais solicitadas pelo programa diário transmitido pelas Associadas. Waldir entrava para a história fonográfica como o primeiro músico a gravar um long-play de dez polegadas na América do Sul e tornou-se famoso no Brasil graças à divulgação, em todo território nacional, feita pelo rádio. 

Ele também gravava muitos jingles, como "duas gotas, dois minutos, dois olhos claros e bonitos" (Miguel Gustavo), do colírio Moura Brasil. Nesta fase, um de seus 78 rotações (Copacabana Discos, 1953) com as músicas Mambo en España (Ramon Marquez) e Cao Cao Mani Picao (Carbô Menendez) foi um grande sucesso em vendas e execução. O pianista tornou-se famoso e passou a ser solicitado para bailes em todo o Brasil. 

E as gravações continuavam: em 56, lançou o LP Samba, Alegria do Brasil (Rádio). Neste álbum, encontramos Na Cadência do Samba (Que Bonito É), de Luís Bandeira (música editada pela UBC), que se transformou em hino do futebol brasileiro, graças à veiculação maciça, em todos os cinemas do país, no noticiário Canal 100. Apesar disso, Waldir Calmon nunca recebeu os direitos de execução. Em 1958, Waldir gravou, pela Rádio, o primeiro disco estereofônico genuinamente nacional, como podemos ler nesta matéria do Jornal do Brasil, de 29/11/1958. 

Ritmos Melódicos (Rádio) teve um segundo volume e outras séries de LPs surgiram, como Chá Dançante, Mambos, Para Ouvir Amando e, a mais famosa de todas, Feito Para Dançar (doze volumes). Com ela, Waldir atingiu a impressionante marca de 100.000 exemplares vendidos em 1957 - fenômeno para a época. A série Feito Para Dançar foi lançada em 1953 e foi o primeiro disco popular editado em 12 polegadas no Brasil, além de ser o único LP, na época, especialmente para dançar, sem interrupção de faixas. A gravadora fez uma ampla divulgação dos 100.000 discos vendidos com a série Feito Para Dançar e ofereceu uma festa, em 27 de junho de 1957, para toda a imprensa especializada com direito à premiação: um diploma, oferecido pela gravadora Rádio,um disco de ouro e um alfinete de brilhantes no formato da letra R. A festa aconteceu na boate Arpège e o já famoso estrogonofe do chef foi servido aos convidados. Nesta matéria da Revista do Rádio, podemos ler sobre o evento. Fotos do diploma, do alfinete, da divulgação e do evento estão na seção Fotos. 

A gravação de Waldir Calmon de Rock Around the Clock, em ritmo de samba, causou grande impacto na época. Segundo o site Senhor F, "(...) em 1957, uma versão instrumental com o pianista Waldir Calmon, incluída em seu disco Chá Dançante n°3, faria grande sucesso junto ao público adulto. Nos anos setenta, o próprio Bill Haley, em mais uma de suas turnês pelo Brasil - a primeira foi em abril de 1958 - regravou a música com arranjo misturando samba e rock'n'roll, acompanhado do conjunto paulista Lee Jackson (...)". 

Waldir inovou e lançou o LP com um lado ininterrupto de música, sem intervalo entre as faixas, ideal para festinhas em casas de família. Criou um estilo próprio de tocar piano, com seus solos em oitavas, que tornava o seu som inconfundível. Chegou a lançar seis LPs por ano e era comum ter três ou quatro de seus discos simultaneamente nas paradas de sucesso. Entre reedições, lançamentos e compactos extraídos de LPs são cerca de 130 títulos. 

Abaixo, relação dos mais vendidos (1956). À esquerda, os long-plays e, à direita, os compactos 78 rpm. Waldir Calmon aparece com três LPs nas paradas: Feito Para Dançar n°5 (1º lugar), Feito Para Dançar n°3 (3° lugar) e Feito Para Dançar n° 4 (7° lugar). O texto da matéria diz: "Registramos, com prazer, a volta de um nacional ao primeiro posto da tabela dos discos de 78 rotações. Altamiro Carrilho, o grande flautista, é o herói com o disco Jura. No entanto, os nove seguintes são estrangeiros, confirmando a decepcionante proporção de 9 sucessos estrangeiros para um brasileiro. Os Pobres de Paris, que teve uma longa vida na primeira colocação, passou para segundo. Entre os long-plays, como já chamamos a atenção no número anterior, o rei é Waldir Calmon que figura, como de costume, com três discos da série Feito Para Dançar. É também surpreendente a longa carreira do long-play Ama-me ou Esquece-me que vem se mantendo há alguns meses nas primeiras colocações." A pesquisa foi feita nas lojas: Brasileiras e Barbosa Freitas (ambas em Copacabana), Ramos Elétrica (Ramos), Mesbla da rua do Passeio, Casa Palermo (13 de maio) eRei da Voz (as três no Centro do Rio de Janeiro). Clique na foto para vê-la em seu tamanho original. 

Nesta época, gravou com a cantora Ângela Maria o LP Quando os Astros Se Encontram (Copacabana Discos, 1958). Sempre atento às novidades, sugeriu à Ângela que interpretasse uma canção mexicana pouco conhecida no Brasil e ainda que fizesse uns fraseados, aproveitando sua privilegiada extensão vocal. Nascia então um dos maiores sucessos da nossa "Sapoti": Babalu (Margarita Lecuona). A festa de lançamento do LP aconteceu também na boate Arpège, em nove de maio de 1958, com jornalistas, artistas e amigos de toda a equipe envolvida na gravação. 

O repertório de Waldir Calmon era composto basicamente por ritmos dançantes e sucessos da época, nacionais e internacionais. "Qualquer música capaz de fazer com que um casal se levante e comece a rodopiar pelo salão me interessa", respondia sempre a quem perguntasse o critério para a escolha de suas canções. 

Em 1955, saiu da Night and Day, após oito anos, e abriu sua própria boate na rua Gustavo Sampaio, 840, Leme, Rio de Janeiro - a Arpège. O sucesso foi tanto que outra série de discos, Uma Noite no Arpège, surgiu. Nomes como Tom Jobim, Chico Buarque e Ary Barroso, entre outros, apresentaram-se em sua boate. Historiadores contam que Vinícius de Moraes foi à boate Arpège assistir a um show de seu amigo Tom Jobim quando conheceu um jovem e talentoso violonista, Baden Powell de Aquino, que também estava tocando nesta mesma noite. Nessa época, Baden já tinha sido gravado por Lúcio Alves (Samba Triste, parceria com Billy Blanco). Em julho de 1966, o show Meu Refrão, com o conjunto vocal MPB-4 (no começo de sua carreira) e Chico Buarque estreou naArpège. Dois anos depois, estariam juntos novamente no Festival da Record, cantando Roda-Viva (segunda colocada no concurso). Edson Machado, baterista que influenciou muito a bossa-nova, também começou na Arpège. 

Waldir Calmon e seu sócio, Maurício Lanthos, inauguraram a Arpège (nome inspirado em um perfume francês), em nove de setembro de 1955, com muita badalação na imprensa - clique aqui para ver um dos anúncios. No começo, eram três atrações: o próprio Waldir ao piano, a cantora Diamantina Gomes (sua mulher, na época) e Steve Bernard no órgão Hammond - em todo Rio de Janeiro, só Bernard conseguia tocá-lo até Waldir se familiarizar com o complicado instrumento... Esta matéria, na coluna Dicionário Enciclopédico da Noite, de Stanislaw Ponte Preta, (jornal Última Hora, em 31 de agosto de 1957), conta a história deste Hammond, que foi o primeiro a ser vendido no Brasil, de forma espirituosa. 

Pouco tempo depois, Lanthos vendeu sua parte na sociedade para Agnelo Martins (assistente de produção de Carlos Machado). Já em primeiro de maio de 1956, Agnelo assumia como um dos donos e conduziu de forma brilhante o negócio: a Arpège tornou-se uma das boates da moda graças à sua boa música, ambiente agradável, menu saboroso e preços razoáveis, passando a fazer parte de um seleto grupo de casas noturnas do Rio de Janeiro, todas na região do Leme: Drink (com Djalma Ferreira e, posteriormente, com a família de Cauby Peixoto), Sacha's, Plaza e Fred's. O telefone de reservas da boate, 52-4623, não parava mais de tocar. 

Em 1956, comprou o piano Steinway & Sons preto para sua boate Arpege. O belíssimo instrumento pertenceu à filha do Presidente do Brasil (entre 1946 e 1951), Marechal Eurico Gaspar Dutra.Nesta matéria, da coluna Flagrantes do jornal Correio da Manhã (de vinte de dezembro de 1956), uma nota sobre a aquisição do instrumento. Quando a boate fechou, o piano foi para a casa de Waldir e lá ficou até ser vendido após a sua morte. 

Normalmente, Waldir trabalhava com o conjunto pequeno, porém, quando solicitado, o grupo crescia e dava lugar à Orquestra Waldir Calmon. Cantores eram pouco utilizados em discos, mas estavam sempre presentes nas apresentações ao vivo. O guitarrista Paulo Nunes, que trabalhou com Waldir vários anos, conta que, quando Mílton Banana fez parte do grupo, era um dos percussionistas. Certo dia, Waldir os reuniu e disse que um deles deveria aprender a tocar bateria, pois, naquele momento, estava precisando mais de um baterista do que de vários percussionistas. Mílton então resolveu aceitar o desafio e se tornou um dos bateristas mais importantes do cenário musical brasileiro. 

Em 1959, formou a Waldir Calmon Produções Artísticas e fundou o selo Arpège que teriam, como primeiro disco, a reedição do vinil Uma Noite no Arpége 3 - já lançado pelos selos Rádio (1956) eCopacabana (1959). Waldir ganhou vários troféus, prêmios e apareceu também em filmes nacionais: É Pra Casar (1953), Com a Mão na Massa (1958), Hoje, o Galo Sou Eu (1958) e no documentário Rio à Noite (1962). Em outros filmes, como em Depois Eu Conto (1956), seu piano fez fundo musical para várias cenas. 

A vida tinha se transformado para aquele menino pobre: o bonde deu lugar aos novíssimos carros importados; o único terno foi substituído por camisas inglesas, paletós e calças de linho e a velha casa alugada na Tijuca, que dividia com seus irmãos, foi trocada pelos luxuosos quartos de hotéis. Ele também era apaixonado por carros e teve vários modelos luxuosos. Apesar de sua vida basicamente noturna (em boates, teatros e casas de show), Waldir não bebia uma gota de álcool sequer - apenas água e refrigerantes. Fumava muito, mas largou o hábito quando sua primeira filha, Márcia, nasceu.

Waldir Calmon tinha uma agenda cheia, dividindo-se entre as gravações, a produtora, os bailes (às vezes, dois por dia) e a sua boate. No entanto, os frequentadores da Arpège reclamavam quando ele viajava e era substituído por outro conjunto, gerando grande insatisfação. Essa rotina desgastante durou até o começo da década de 60, quando Brasília foi inaugurada, em 1960. A mudança da capital federal do Rio de Janeiro para Brasília foi um divisor de águas na noite carioca. Políticos, empresários e pessoas influentes deixaram o Rio, levando boa parte do dinheiro que circulava na noite. 

A música também passou por uma grande transformação: no Brasil, a bossa-nova surgia e, no mundo, o rock. A ditadura brasileira trouxe uma reformulação musical mais profunda onde as letras passaram a ter um papel mais importante e deixaram de ser mero entretenimento para se transformar em veículo de conscientização das massas. Melodia e ritmo eram relegados a segundo plano - dois dos maiores trunfos do instrumentista Waldir Calmon. Mesmo assim, continuou gravando, mas a vendagem de seus discos começou a cair progressivamente. Em 1962, casou-se com a cantora Marta Kelly e teve seus dois filhos: Marcia e Marcus. O selo Arpège e a produtora acabaram e, em 1968, a boate fechou. Waldir começou a fazer temporadas pelo Brasil até que, em 1969, o diretor artístico do extinto Canecão, Wilton Franco, convidou-o para animar a casa de shows em Botafogo, Rio de Janeiro. 

Entre o final dos anos 50 e começo dos 60, Waldir também passou a tocar órgão Hammond, seguindo a tendência mundial. Segundo o pianista e amigo Jota Júnior, ele adquiriu um Hammond B2que, pouco tempo depois, foi vendido para o empresário e bandleader paulista Ed Costa. No mesmo dia, porém, comprou o famoso Hammond B3 que o acompanhou profissionalmente até o fim da vida. Clique aqui para ver uma sequência de fotos de Waldir e seu conjunto fazendo um anúncio na TV Ceará. 

As partituras a seguir são uma transcrição, feita por Waldir (em 1962), da grade do arranjo do maestro Pachequinho para a música Do Rio a Paris (Marino Pinto - Pernambuco), gravada por Marta Kelly. Antes de falar sobre esta gravação, é preciso esclarecer como os termos transcrição e grade são usados na música. Quando um maestro cria um arranjo, ele o dispõe em uma grade: uma grande folha pautada que, dependendo do tamanho da orquestra ou banda, será maior ou menor. Cada instrumento corresponde a uma pauta (ou pentagrama) e são dispostos um abaixo do outro. Desta forma, podemos observar o que será tocado por todos os instrumentos no mesmo compasso. A grade é a guia do maestro e dali saem as partituras para cada instrumento, individualmente (clique aqui para ver um exemplo). A este processo, chamamos transcrição. Antes dos computadores, as transcrições eram feitas, manualmente, por músicos que tinham um belo ponto ("letra") e que eram chamados de copistas. Havia um amplo mercado de trabalho para copistas em estúdios, rádios e TVs. 

Em 1962, Marta foi convidada pelo compositor Humberto Teixeira para participar da 5ª Caravana da Música Popular Brasileira - grupo patrocinado pelo governo federal que tinha como objetivo divulgar a música popular brasileira no exterior. Nomes como Waldir Azevedo, Dalton Vogeler, Orlando Silveira, Francisco El Broto Carlos e Darlene Glória fizeram parte deste show que viajou por toda a Europa e parte do Oriente Médio. Na França, gravaram dois LPs pela gravadora Decca. As quatro músicas em que Marta fez o solo foram extraídas dos LPs e relançadas em um compacto duplo. A gravação que ouvimos aqui é a do disco (em péssimo estado). 

Capa do boletim da UBC (União Brasileira de Compositores) e flâmula da 5ª Caravana da Música Popular Brasileira. Clique nas miniaturas para vê-las em tamanho maior. 

Já de volta ao Brasil, Marta foi convidada para cantar a mesma música na TV Tupi do Rio de Janeiro. O maestro Pachequinho fez um arranjo diferente do disco, com cordas e um belo naipe de sopros, e Waldir fez a transcrição. Abaixo, algumas das partituras transcritas da grade. Infelizmente, não foi possível escaneá-la por causa do tamanho. Clique nas miniaturas para vê-las em tamanho grande.

Em 1970, gravou o último LP desta fase, Waldir Calmon e seus Multisons (Copacabana Discos). Em janeiro de 77, após sete anos no Canecão, voltou às viagens. Mas, em abril do mesmo ano, estreou na Churrascaria Roda-Viva, na Urca, Rio. Em dezembro de 78, recebeu uma proposta "irrecusável", como ele mesmo definia, da cervejaria e restaurante Bierklause, no Lido, Rio. Ficou até maio de 79, quando a direção da Churrascaria Roda-Viva pediu para que voltasse a tocar na casa, fazendo uma contraproposta também "irrecusável". 

Voltou a gravar em 78 e lançou o disco Discoteque - Feito Para Dançar. Em 1980, gravou seu último LP: Feito Para Dançar. Este álbum pareceu um retorno às origens: deixou o órgão e voltou ao piano acústico (que, aliás, preferia tocar). Seu piano era valorizado pelo ritmo e acompanhamento claros - assim como nas primeiras gravações. 

Certo dia, disse-me que jamais deixara de tocar um só dia e que gostaria de morrer trabalhando. "Não conheço nada no mundo tão agradável quanto tocar", explicou-me. Waldir trabalhou até a madrugada do dia 11 de abril de 1982. Pela manhã, reclamou de "umas dores estranhas no peito". Não as levou a sério, pois detestava ir a médicos, e no meio de um passeio com a família teve um enfarte fulminante. Estávamos indo comemorar o dia da Páscoa. 

Talvez a única versão cantada de Separados Nada Somos, de Waldir Calmon e Don Al Bibi. É uma gravação feita pela cantora Diamantina Gomes acompanhada da orquestra de Osvaldo Borba (Odeon, 1953). Há alguns problemas na introdução da música, devido ao desgaste do disco, mas o registro é muito interessante.

Fonte: Site oficial do artista

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