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sábado, 20 de outubro de 2018

AS ARTES INFINDAS DE CAYMMI EM DOIS CDS INSTRUMENTAIS

Por Tárik de Souza



Compositor oceânico que dedicou parte de suas criações às relações do homem com o mar, o baiano Dorival Caymmi (1914-2008), tem a obra revisitada em dois discos de abordagens divergentes e enriquecedoras. Na direção do jazz e improvisos, “Dorival” (Pau Brasil) reúne um quarteto afiado, de poderes compartilhados, formado por André Mehmari (piano), Nailor Proveta (sax e clarinete), Rodolfo Stroeter (contrabaixo) e Tutty Moreno (bateria).

Já “Lição # 2: Dorival” (Natura Musical/ Risco), terceiro disco da banda paulistana QuartaBê, de predominância feminina, recria Caymmi “a partir de fragmentos harmônicos melódicos e rítmicos, selecionados ao longo de um intenso período de sua obra”, como dizem na apresentação. Formado por Mariá Portugal (bateria, voz e coquinho), Chicão (teclas, voz e coquinho), Maria Beraldo e Joana Queiroz (ambas clarinete, clarone, voz e coquinho), o grupo, que, a partir do título recria um clima de sala de aula (já dissecaram a obra de Moacir Santos em dois discos) procura externar seu estilo “através da experimentação e da brincadeira”. 

O resultado tangencia a vanguarda, o pop e a música eletrônica, encarando o repertório como “obra barco”, conduzida por “correntes desconhecidas no mar infinito de Caymmi”. O CD é dividido em três “ondas”, onde boiam e são ressignificados fragmentos de canções do autor como “Morena do mar” (aberta por um assobio característico do compositor e uma condução de vocalise entre tambores), “Canto de Nanã”, “Sargaço mar”. A elas, acrescentam-se as criações da banda “Vento métrico”, “Monção”, “Ressaca”, “Maré alta” e “Maré baixa”. Dilatadas, condensadas, sobrepostas, as canções do autor navegam numa “imbricada teia, onde não se sabe onde termina o autor e começa o intérprete”. 

Em “Dorival”, por sua vez, o quarteto Mehmari-Proveta-Stroeter-Moreno extrai a seiva de clássicos como “Samba da minha terra” (tema exposto numa tessitura veloz e dissonante), “Dora”, “João Valentão”, “Só louco” (com enevoadas digressões de sax) para reprocessá-la em novos formatos e atmosferas, entre a reflexão e o deleite. Há mais dolência que malemolência em “Tão só” e “Sargaço mar”. Mas o suingue, dengo e balanço do monumental autor baiano também fornecem combustível ao grupo, nos diálogos intensos de “Milagre” e nos requebros irresistíveis de “A vizinha do lado”.

Caymmi continua sendo.

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