Na década de 90, o Manguebeat explodiu no Recife com os mash ups sonoros de Chico Science e cia, a história da parabólica fincada na lama, que era uma representação metafórica para a globalização sonora e conexão musical mundial que eles tinham. A turma de Chico Science misturou maracatu, com rap, música eletrônica, funk americano e mais um monte de coisa.
Essa parte todo mundo já sabe, e depois desse estouro, o “espírito” do Manguebeat acabou dando alguns frutos e serviu de base e inspiração para novas produções. Uma das primeiras bandas (porque teve várias na verdade) foi a Jorge Cabeleira, que surgiu na década de 90 logo após Chico Science & Nação Zumbi estourar com essas influências e referências.
The Thorn
Por volta de 1993 e 1994, existia uma banda em Caruaru chamada The Thorn, dos amigos Ivan Márcio, Gildo, Pablo Falcão, Hélder e Gil. Eles já tinham uma proposta de repertório autoral e seguiam fazendo shows em teatros e cidades vizinhas.
Nesse meio tempo, começaram a observar, principalmente em época de São João, as bandas de pífanos e suas performances. Aquelas pancada de zabumba quase Rock’n roll em pleno repertório de forró e coisas do tipo.
Em meio a uma observação e outra, os projetos musicais seguem paralelamente, e dois integrantes da The Thorn, Ivan e Gildo, formam uma outra banda chamada Flood.
Não totalmente à toa, “Flood 1” e “Flood 2“ são nomes de música da banda inglesa de gothic-rock Sister of Mercy.
A Flood era formada por Ivan Márcio (guitarra/voz), Gildo (baixo), Rivelino (in memoriam, baterista irmão de Nato), e Alex Camilo (voz). O projeto tinha um repertório cover, que transitava entre Sister of Mercy, Joy Division, Bauhaus, Alice in Chains, Nirvana até músicas nacionais.
Eles não costumavam fazer shows grandes, geralmente tocavam no lugar onde ensaiavam, que era numa casa no “pé do monte” chamada de “Casa Macabra”. Nessa casa, ensaiavam bandas como a Psych Acid, Mortal Mosh e outras do cenário metal da cidade.
Sangue de Barro
Foi nessa época que retomaram a pesquisa em cima das observações do “elemento Rock’n roll” das bandas de pífano e acabaram articulando um projeto chamado “Concerto para Vitalino”.
O projeto não passou de alguns ensaios, mas a proposta era experimentar clássicos da música nordestina como Jackson do Pandeiro, Jacinto Silva e Luiz Gonzaga em uma pegada mais Rock’n roll.
Aproveitando essa proposta de misturar música nordestina com música pesada, os mesmos integrantes tocavam nas noites do Bar do Rock, o bar de Nato Vila Nova que abriu por volta de 1998, mas com um repertório cover só para agitar as noites.
Nato é integrante da banda Psych Acid e já era figura conhecida em Caruaru por participar ativamente do cenário metal. A partir daí, entre um ensaio e outro começaram a compor músicas próprias, mas o grupo ainda não tinha nome.
Até que em um determinado dia, Ivan Márcio viu uma matéria de jornal falando sobre a participação de Chico Science & Nação Zumbi no Festival Abril pro Rock no Recife, no qual, por um erro de digitação escreveram no jornal uma música de Chico errada. O nome correto seria “Sangue de Bairro” (música de Chico e do caruaruense Ortinho), mas tava escrito “Sangue de Barro”. Foi com esse erro de digitação do jornal que Ivan pensou: “Isso tem tudo a ver com o som que a gente tá fazendo”.
No dia 18 de Maio de 1998, em pleno aniversário de Caruaru, em uma festa no Bar do Rock, a banda anuncia o nome como “Sangue de Barro”. Daqui pra frente o projeto está batizado e entra em processo de composição.
“Eu já peguei chuva de vento, foi num lombo dum jumento
Já peguei insolação, nas caatingas do sertão
Sou nordestino cabra macho, num abro nem pra boi de carro
Porque em minhas veias corre o mais quente Sangue de Barro.
(trecho da música “Sangue de Barro”)
Disco e repercussões
Nesse momento, as coisas tomaram um rumo mais sério, foram pra estúdio gravar, colocaram um pífano na formação pra dialogar com distorções de guitarra e começaram a experimentar outras sonoridades. Começaram a ganhar visibilidade e são chamados para participar no ano de 2001 da coletânea “Pernambuco em Concerto”.
Logo na sequência, surgiu algumas matérias em revistas e jornais, como a matéria falando da participação de Silvério Pessoa, João e Marcos do Pífano da banda Pífano Dois Irmãos nas gravações do disco por exemplo.
Entram em estúdio pra gravar o 1º disco que apesar de passar por diversas formações, se estabiliza, e em 2004 lança o disco “Sangue de Barro”.
A capa do disco retrata a Catrevage, representando as obras de Galdino, no qual tem um verso musicado no disco (a poesia “Se Cria Assim”).
Já por volta de 1998–1999, durante almoços e cervejas de final de semana, os mesmos amigos que faziam parte do Sangue de Barro se juntavam pra tocar forró e fazer “zuada” pela feira. Até como consequência também dos estudos que eles estavam fazendo com percussão, música nordestina e o uso do pífano.
E é daí que surge um “spin-off” do Sangue de Barro, só que menos Rock’n’roll, menos profissional (no sentido de que era só pra se divertir final de semana mesmo), mais percussivo, e somente instrumental, que foi o Catrevage.
Em 2006, o Sangue de Barro vai tocar em SP, no festival Araraquara Rock e no Sesc Pompeia. Em 2007 tocam novamente no festival Araraquara Rock. Inclusive, nessas viagens para SP, eles foram apoiados por outro artista caruaruense que já morava por lá, Thera Blue.
No mesmo ano de 2007, chegaram a gravar um DVD, mas que não saiu em mídia física. Logo depois dessa fase, novos integrantes passam pela formação da banda como Lalo (da banda Alkymenia), Igor Taborg (da banda recifense Caapora), e novos shows importantes acontecem, como o Arraial Tomazina em Recife e o Festival de Inverno de Garanhuns.
Imagens da gravação do dvd:
Móveis na Carroceria
Depois de um tempo, a banda meio morna, meio parada, fazendo poucos shows, lançam em 2012 um EP com 5 músicas inéditas chamado “Móveis na Carroceria”, com direito a clipe de uma das músicas desse disco chamada “Livrando a Queda”.
Móveis na Carroceria — Sangue de Barro (2012)
No clipe já se percebe uma nova formação, e dessa vez com dois integrantes da “Sobreviventes do IDR”, Daniel Finizola e Eric Sóstenes.
“Sei do valor de cada instante / mas prefiro guardá-los como bons livros na estante”
(trecho da música “Pause”)
E o Sangue de Barro é justamente isso, é aquele livro que foi um dos primeiros que você comprou e leu 300 vezes, depois serviu como livro de consulta onde era aberto só de vez em quando, e hoje está guardado na prateleira dos livros favoritos, junto daqueles que você memorizou o enredo todo e hoje conta a história em mesa de bar.
O Sangue (como é carinhosamente chamado) está guardado aqui na estante, mas vez por outra abro a primeira página só pra ler os dizeres:
“É quente, corrente e vivente
Explode e incendeia igual cuspida de vulcão
Isso é Sangue de Barro Caruaruense
Que corre nas veias e irriga nosso coração.”
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