O rei do black brasileiro deixou legado inestimável para a música brasileira
Por Alexandre de Paula
Por Alexandre de Paula
"Vou pedir pra você voltar
Vou pedir pra você ficar
Eu te amo
Eu te quero bem..."
Há exatos 20 anos, a voz rouca de Tim Maia se calava. O drama começou uma semana antes, quando o cantor, aos 55 anos, passou mal em uma apresentação no Teatro Municipal de Niterói que tinha como objetivo dar origem a um disco acústico.
Ele foi internado, mas não resistiu e morreu no Hospital Universitário Antônio Pedro, na mesma cidade. Esses dias foram tão complicados que um dos filhos do Síndico, como era chamado, o também cantor Léo Maia, conta que, desde então, o período que antecede o aniversário da morte do pai é sempre um momento difícil para a família. “Eu faço aniversário em 11 de março. Nunca mais comemorei, toda a graça que eu poderia ver nesse dia, acabou. É um período em que fico na minha. Não tenho nenhum ritual, fico triste, choroso. Meu pai foi pai e amigo”, destaca em entrevista ao Correio.
A morte de Tim Maia não teve impacto apenas na família do carioca, mas também no mundo da música. Hitmaker e dono de uma voz incomparável, o legado de Tim Maia permanece até os dias de hoje, assim como o lugar deixado pelo cantor. Músicas como Primavera, Não quero dinheiro (Só quero amar) — dos versos acima —, e Descobridor dos sete mares ultrapassaram as barreiras do tempo e continuam no imaginário do público e também no repertório de outros músicos.
Até hoje Tim Maia continua aparecendo na lista de artistas mais executados do Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição). Em 2016, Não quero dinheiro apareceu na 12ª posição das músicas mais tocadas do ano. Nos últimos 20 carnavais, Tim Maia permaneceu entre os 10 artistas mais tocados da folia — mesmo em tempo de sucessos virais.
“Surgir um cara como meu pai, jamais! É aquela missão impossível, a mesma coisa com nomes como Barry White, James Brown, Bob Marley... Os grandes mestres são, na verdade, como um rio, os que vêm depois são os afluentes. A música do meu pai foi algo que transcendeu tudo. Foi uma daquelas pessoas que nascem uma vez ou outra, algo muito peculiar”, afirma Léo Maia sobre o legado do pai. A música brasileira realmente nunca teve um sucessor à altura de Tim, apesar de o cantor ter sido uma influência para diversos outros artistas ao longo dos anos.
Nesses 20 anos, Tim Maia foi lembrado em livros, musicais e filmes. Em 2007, o amigo Nelson Motta escreveu a obra Vale tudo — O som e a fúria de Tim Maia, que deu origem, anos depois, ao espetáculo teatral Vale tudo, protagonizado por Tiago Abravanel e Danilo de Moura (que entrou para substituir o neto de Silvio Santos).
O livro também inspirou a cinebiografia de Mauro Lima, que chegou aos cinemas em 2014, tendo Robson Nunes e Babu Santana retratando diferentes períodos de Tim. “Eu acho legal (sobre a história do pai ter sido retratada), mas considero que não contaram a história da genialidade dele. Pegaram o lado pejorativo, as drogas... Todo mundo sabia que ele era maluco. Mas a história dele não foi contada”, afirma Léo Maia.
E o filho do músico justifica: “Ele era um cara que tocava baixo, bateria, teclado, flauta, diversos instrumentos... Fazia os arranjos da cabeça dele. Era um cara que falava apenas uma vez, se o músico não acertasse, ele mesmo pegava o instrumento e tocava. Foi um dos maiores formadores de maestros do Brasil, trabalhou com Serginho Trombone e Paulinho Black. Um grande formador de músicos”.
Perfeccionista
“Gênio”, assim o produtor Manoel Barenbein, que mora atualmente em Israel, define Tim Maia. Nome por trás de obras clássicas da música brasileira, como o disco Tropicália ou Panis et Circencis, ele trabalhou com o cantor no início da carreira. “Erasmo Carlos (amigo de infância do Síndico) me ligou dizendo que ele e Roberto queriam um favor, que eu contratasse o Tim para a gravadora Phonogram”, lembra.
Manoel hesitou, mas Erasmo insistiu e garantiu que ele e Roberto cuidariam de tudo com o trabalho de Tim. “Qual não foi a surpresa quando, 15 ou 20 dias depois do contrato, ele começa a aparecer todo dia na gravadora e eu ligo para o Erasmo querendo saber em que pé estavam as coisas e descubro que Erasmo e Roberto estavam no Japão, gravando o filme Diamante cor-de-rosa.”
Então, Barenbein acabou responsável por gravar o compacto de Tim Maia com Primavera, que depois seria lançado pelo produtor Jairo Pires. No estúdio, Manoel e Tim tiveram alguns desentendimentos. Um deles foi pela data de lançamento do álbum, que Tim queria que saísse, de fato, durante a primavera. “E era uma época muito ruim de lançar, porque todos os grandes artistas lançavam seus discos nesse momento. Eu resolvi que o disco sairia em março e o Tim ficou contrariado”, conta.
Para Manoel, no entanto, o “atraso” foi fundamental. Nesse meio tempo, Nelson Motta ouviu o compacto e ficou apaixonado por Tim e o apresentou a Elis Regina, que gravou com ele These are the songs. “Por isso, quando saiu Primavera, ele já era conhecido. Ou seja, se tivesse saído na época, estaria coberto pelos outros artistas e não teria essa chance.”
Apesar das brigas, Manoel tem boas lembranças do trabalho ao lado do cantor. “Muitas das pessoas que trabalharam com o Tim reclamam dele. Eu, não. Acho que ele fazia o certo, exigia que se fizesse o melhor para ele. Era ele sozinho no palco, no estúdio, era sempre ele quem colocava a cara para bater. Então, nessa hora, estava totalmente certo de exigir que aqueles que trabalhavam com ele dessem o melhor de si para que o próprio Tim também pudesse dar o melhor”, afirma.
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