A opção por capas tão semelhantes não acompanha Roberto Carlos desde os seus primeiros passos dentro da indústria fonográfica. O primeiro álbum do cantor, que trazia o hit “Splish Splash” (1963), chegou às prateleiras com uma diagramação diferente e o disco seguinte, É Proibido Fumar (1964), trazia o cantor com um cabelo curto e uma rara camisa vermelha. Nesta primeira fase, a grande referência para a confecção das capas de Roberto eram os Beatles, que também norteavam fortemente o som do artista brasileiro. A referência aos Beatles está no corte de cabelo adotado pelo Rei (a la McCartney), nas roupas sociais que conversam com a fase iê-iê-iê do grupo inglês e na descarada capa de 1966 que nada mais é do que uma releitura da imagem trazida na capa do disco With The Beatles, que ficou internacionalmente conhecido anos antes.
Ainda na onda de referência aos Beatles, o disco de 1967 do Rei traz uma imagem do filme “Roberto Carlos em Ritmo de Aventura”, película lançada na época por Roberto copiando a onda de filmes musicais popularizada pelos Beatles desde o filme “Help!” (1965).
Em uma segunda fase, já saído da Jovem Guarda e buscando por uma identidade própria, o cantor experimentou influências musicais diferentes e isso esteve refletido na capa de seus álbuns. O disco mais pesado e soul de 1970 tem uma capa que faz jus ao seu conteúdo, enquanto o melancólico álbum de 1972 traz uma foto monotônica do cantor quase chorando. O experimental disco de 1973 apresenta uma capa mais artística do que de costume e o trabalho cool de 1975 (mais jazz/MPB) traz uma capa em tom hipster onde o cantor aparece fumando um cachimbo e o seu nome aparece rabiscado em formato de autógrafo. Até aqui, poucos padrões e uma sintonia observável entre capa e conteúdo.
Na segunda metade da década de 70, o cantor desprendeu-se um pouco da sua veia gospel e isso esteve refletido na capa cafajeste de 1976 (no disco que traz a clássica “Ilegal, Imoral ou Engorda”). A capa de 1977 conversa com a febre discovivida na época, embora o conteúdo lembre bastante o disco anterior, e a pose gótica-suave de Roberto no álbum de 1981 é um dos últimos sinais de variação nas capas do cantor. Depois disso, somente em 1994 uma capa sua traria algo de diferente.
A variabilidade das capas dos anos 70 reflete a busca de Roberto Carlos por um padrão que “funcionasse”. Enquanto testava, descobriu em 1974 a fórmula visual que perduraria. A roupa azul, a pose e o cabelo padrão apareceriam ali pela primeira vez.
O ano de 1974 pode ser considerado o ano em que Roberto Carlos começou a se tornar o que hoje conhecemos, e isso não toma como base só a capa deste disco. O ano marcou também a ruptura definitiva do cantor com o público jovem e o incluiu na galeria dos cantores adultos românticos que dominariam comercialmente a música brasileira naquele período. Em 1974, o cantor também começava a ser reconhecido como grande compositor, abandonando as saídas fáceis de anos antes e investindo em letras mais sentimentalmente carregadas. Por fim, o ano marcou também a primeira exibição do especial de final de ano de Roberto na Globo, que foi essencial para o aumento de sua popularidade. A fama de Rei data deste período.
Desde que Roberto Carlos se tornou rei
Depois de encontrar a sua praia, Roberto passaria a criar soluções dentro disso, mas nunca mais daria uma grande virada estética, tanto na música quanto no visual. A década de 80, inclusive, seria a fase em que ele menos lançaria clássicos, mas ao mesmo tempo seria a década em que ele mais faria sucesso, se estabelecendo como um cantor das massas, ganhando o Grammy e chegando a ocupar o topo da parada latina da Billboard.
Enquanto a sua fama como cantor se expandia, crescia também o culto à sua imagem, que deixava claro que qualquer álbum do cantor (com mais clássicos ou menos clássicos famosos) faria sucesso, independente de sua qualidade, porque o público consumia Roberto Carlos não só como cantor, mas como ícone popular.
A obra de Roberto, como um todo, alimenta essa busca personalista do fã pela imagem e pela pessoa de Roberto Carlos, algo que se tornou mais explícito nos anos 80 (quando as capas azuis se tornaram mais recorrentes), mas que já perseguia o ícone desde os seus primeiros discos. Uma prova disso são os nomes dados aos álbuns do cantor. Dos 49 discos avaliados nesta pesquisa, 30 se chamam simplesmente Roberto Carlos e apenas um (sim, um único lançamento) não traz uma foto do cantor na capa: o disco de 1971, que substitui a foto por uma pintura com a cara do Rei.
Definitivamente, a repetição nas capas não é acidente ou falta de criatividade, mas um trabalho de construção de imagem muito bem sucedido e que teve como resultado a fixação de Roberto Carlos como um dos rostos mais conhecidos da história brasileira, algo que se refletiu em vendagens, culto e construção de uma base de fãs para os quais o personalismo está acima da estética e muitas vezes acima da própria música.
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