Vinícius de Moraes (Out/1913 – Jul/1980)
Quem acompanha este espaço e por conseguinte esta coluna talvez lembre que quando surgiu esta ideia de trazer algumas curiosidades do cancioneiro brasileiro os primeiros personagens abordados foram o maestro Antonio Carlos Jobim e o multifacetado Vinicius de Moraes. O cantor e compositor Oswaldo Montenegro bem definiu o poetinha quando disse que ele de tantos tinha nome e sobrenome no plural.
Neste mês em que Vinícius completaria um século de existência retomo seu nome para contar mais algumas passagens interessantes sobre sua biografia e vida artística. De início posso começar a contar um problema que Vinícius tinha que assola boa parte dos brasileiros: insônia. Ele costumava dizer que invejava quem batia na cama e dormia logo. Sua última esposa, Gilda Mattoso, costuma contar que quando pedia para o poeta acordá-la ela sempre perdia as horas. Ele costumava dizer que não tinha coragem de acordar ninguém. Em suas crises de insônia ele costumava entrar na banheira com água morna, que dizia ser o útero da mãe. Ficava ali e, quando vinha o sono, ele saía da banheira e se metia na cama, ainda molhado, para não perder o embalo. Se o sono não engrenasse, não fazia cerimônia e voltava para a água para reiniciar todo o processo.
Uma das características de Vinícius, que falava com fluência vários idiomas, era misturá-lo nessas turnês corridas. Chico Buarque certa vez contou que quando estava em Roma foi a uma apresentação do autor de Chega de saudades e ele contava mil casos a plateia. O público ria muito, inclusive um senhor que estava sentado ao lado de Chico que olhou para Chico e exclamou:
– E bravíssimo questo Vinicius ma, scusa che língua parla? (É fantástico esse Vinícius, mas me desculpe, que língua ele está falando?).
Outra passagem interessante na biografia do saudoso artista aconteceu por volta de 1980. Nessa época Vinícius já não mantinha a vida social de outrora e isso o deixava bastante abatido. Esforçava-se para sair, ver amigos, mas estavam cada vez mais complicadas e sofridas essas saídas. Nessa época João Gilberto gravaria para a rede Globo um programa para a série “Grandes nomes”, no entanto no dia marcado para a gravação o poeta passou mal. Vinícius ficou inconsolado em não ter condições de participar desse programa até que dias depois ele recebeu a visita do parceiro Baden Powell. Durante toda tarde, Baden tocou e os dois cantaram em uma alegria de dar gosto. Baden ficou para jantar e ao final da refeição caiu uma chuvarada feia que fez com que permanecesse na casa de Vinícius para poder voltar para casa no dia seguinte, já que a cidade provavelmente estava alagada. O poeta e sua esposa providenciaram as acomodações de Baden no quarto de hóspedes e seguiram também para o quarto para também dormirem. Trocaram de roupas e já preparavam-se para deitar quando o interfone toca e do outro lado era Miúcha que o questionou se ainda estavam acordados. Mesmo de pijama o poetinha prontamente respondeu entusiasmado:
— Tô Miuchinha, pode entrar.
Quando a porta foi aberta entraram não só Miúcha, mas também João Gilberto com seu violão. João refez para Vinícius o especial todinhos com várias interrupções para atender a pedidos de Vinícius. João pacientemente atendeu a todos os pedidos ao longo de toda a noite e saíram já com o dia amanhecendo.
Ao acordar no dia seguinte por volta de meio-dia foram acordar Baden, que ainda repousava, para comer alguma coisa. Baden chegou a dizer que teve um sonho excelente: “Parecia que João Gilberto tocava e cantava a noite toda para me embalar…”.
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