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segunda-feira, 27 de julho de 2015

MPB MEDICINAL

Por Renato Vivacqua 


A Música Popular Brasileira, desde o surgimento do disco no início do século passado, veiculou nomes de produtos ligados á área farmacêutica, com ou sem finalidade propagandística. A antiga modinha “O Chefe da Orchestra“ louvava o potencial do fortificante Jataí: 

O trombone fraquejava
Tli, hi,hi
A vista disso tiveram que tomar
Muito JATAÍ.

O excelente letrista Aldyr Blanc, psiquiatra, acabou por abandonar a profissão revoltado com os métodos medievais nos manicômios quando estagiário. Foi bom, nosso cancioneiro saiu lucrando. Fez muito sucesso com o curativo de “Dois pra lá, dois pra cá”:

No dedo falso brilhante
Brincos iguais ao colar 
e a ponta de um torturante band-aid
No calcanhar.

O parceiro afinado foi João Bosco com quem criou obras primas. Da dupla mais Cláudio Tolomei surge a saga de um estropiado por amor, sem cura:

Olha meu bem o que restou
Daquele grande herói sem seu amor
Enlouqueci e ando dodói
Como Tarzan depois da gripe
De Emplastro Sabiá.

Mais adiante reforça dose: “Maracujina já não resolve." Aldyr e Bosco em “Bandalhismo” retornam após experiência gastronômica nada agradável:

Como os pobres otários da Central
Já vomitei sem lenço e Sonrisal
P.F. de rabada e agrião.

Para quem não conhece o Rio, a Central é a estação ferroviária do povão, cheia de botecos com comidas de ingestão arriscada. Em 1927 sua fama já não era boa como o Duque de Abramonte (é um pseudônimo) em sua música já metia a lenha:

Há sonhos que horrores dão
Da cabeleira arrepiá
Não quero que sonhes não
Que viajas pela Central.
No Rio quando vou lá Eu já vou cadáver já
Tomando por precaução
Cloroformio com limão.

Tomzé em “Jeitinho Dela” é de um non-sense total:

Geladeira já teve febre
Penicilina teve bronquite
Melhoral teve dor de cabeça
E quem quiser que acredite.

Em dupla com Rita Lee algo inusitado, como em “Dois mil e um”:

Sou baiano e estrangeiro
Meu sangue é de gasolina
Correndo não tenho mágoa
Meu peito é de sal de fruta
Fervendo no copo dágua.

A marchinha carnavalesca de Klécius Caldas e Armando Cavalcanti fez sucesso:

Penicilina cura até defunto
Petróleo bruto faz nascer cabelo
Mas ainda está pra nascer
O doutor
Que cure a dor de cotovelo.

João Bosco teve uma inspiração dolorosa para compor “Benzetacil” em 2003. Para curar uma infecção crônica teve que tomar o antibiótico durante seis meses “Não conseguia nem dormir só pensando na hora da injeção. Foi horrível.” O talentoso Wilson Batista, no seu samba “Diagnóstico” mostra outra situação onde a ciência está de mãos atadas:

A medicina está muito avançada
Mas no seu caso não adianta nada
É incurável a sua enfermidade
Não há remédio para curar a saudade.

Gilberto Gil recorda pílula famosa do tempo de nossos avós:

O sonho acabou dissolvendo a Pílula de Vida do Dr. Ross
Na barriga da Maria.

Na sua deliciosa “Canção pra Inglês Ver” Lamartine Babo fax uma mixórdia:

Elixir de Inhame
Reclame de andaime
Mon Paris, je t’aime
Sorvete de creme.

Caetano Veloso em “Superbacana” critica a supervalorização que virou mania:

Superbacana
Superbacana
Super-Homem
Superflit
Supervinc
Superhist
Superviva.

Em “Amigo da Onça”, Silvio Silva prescreve uma receita estranha:

Não é possível
Você não se comove
Vá tomar um Engove.!

Volta Aldyr em parceria com a competente Suely Costa em “Altos e Baixos.:

Meu taxi, meu uísque
Dietil, Diempax
Ah, mas há que se louvar entre altos e baixos
O amor
Que traz tanta vida
Que até para morrer leva tempo demais.


Agora Aldyr com Giordano em “New Malemolência” debocha da jovem metida a moderninha:

Ela acha que é meio punk
Pós moderna, uma deusa do sol Com um jeito de gata beleza
Junta o funk ao new besteirol
Entre a insustentável beleza
E o Almanaque mais Capivarol.

Ritchie na composição “Preço do Prazer”, parece meio debilitado para enfrentar uma batalha amorosa:

Nesse quarto de hotel
Nem água quente tem
É o preço do prazer
Estou na base do B12
Mas está tudo bem
É o preço do prazer.

A banda Pato Fu em seu trabalho lançado em 2005 “Toda cura para todo mal” tem versos desconcertantes:

Toda cura para todo mal
Está no hipoglós, mertiolate e sonrisal.

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