Thiago Nunes não achava que um dia ainda fosse ouvir a voz do pai.
Radialista gaúcho descobriu registro inédito de Torquato feito em 1968.
Por Pedro Santiago
“Eu viajei tanto, ficaram ecoando as palavras na minha cabeça de um jeito que eu não me lembro do que ele disse. Foi um negócio emocionante, eu não imaginava que fosse assim tão forte para mim”, disse Thiago Nunes, filho do poeta Torquato Neto, sobre a gravação inédita com a voz de seu pai, que estava em silêncio desde 10 de novembro de 1972, data do suicídio do artista. O piloto de avião pernoitou em Teresina nessa segunda-feira (30) durante um período de descanso, entre um voo e outro, e conversou com o G1 sobre como foi conhecer a voz do pai aos 44 anos de idade.
“Eu, como ninguém, não achava que ainda encontraría um áudio com a voz do meu pai. Eu não lembrava porque eu era muito pequeno quando ele morreu (tinha dois anos). No dia da audição, eles colocaram uma almofada no meio da sala e disseram: você senta aqui. Eu fiquei ouvindo, mas viajando. Não sei quanto tempo tem aquele áudio, é meio longo, uns vinte minutos. Tenho que escutar de novo ou ler uma transcrição. Foi um negócio emocionante, eu não imaginava que fosse assim tão forte para mim”, disse entre um gole e outro de água sentado em um banco no Parque Potycabana.
O registro com uma entrevista de Torquato foi encontrado de forma inusitada. O gaúcho Vanderlei Malta da Cunha, de 66 anos, leu uma matéria na qual o cineasta Marcos Fernando, que está gravando um documentário sobre Torquato Neto, lamentou o fato de não ter achado nenhum registro da voz do poeta. Malta, que é radialista, lembrou que havia feito uma entrevista com o poeta nos bastidores do IV Festival da Música Brasileira da Record, em São Paulo, em novembro de 1968.
Após um longo trabalho de pesquisa em seu arquivo pessoal, Vanderlei achou a gravação, que chegou aos ouvidos do único filho de Torquato por meio do documentarista.
Na terra do pai
Essa foi a primeira vez que Thiago que veio a Teresina, terra natal de seu pai, após a descoberta da gravação inédita. Apesar de ter crescido no Rio de Janeiro e hoje morar no estado de São Paulo, o piloto conta que tem uma relação especial com a capital do Piauí.
“Uma vez voava de Recife para Belém e passamos exatamente aqui por cima e eu olhei para baixo e pensei, 'nossa, tá todo mundo ali': meu pai, meu avô. Penso nessas coisas, mas não sei explicar. Não é um sentimento de tristeza, mas são coisas que só sinto quando estou aqui. Acho que (quando está em Teresina) aumenta a sensibilidade, eu penso muito sobre as coisas, mas não é uma coisa ruim. É estranho, porque é a cidade onde está a história de toda a sua família”, contou.
Por força do trabalho, o piloto sempre vem a Teresina e conta que tem até uma espécie de “mantra” quando desce na cidade. “Todas as vezes em que chego aqui, digo para adiantarem o embarque, desço e vou ali fora do aeroporto, onde tem uma parede com azulejos coloridos. Sempre lembro de uma foto que tirei quando vim aqui pela primeira vez e toda a minha família veio me buscar no aeroporto. Deveria ter no máximo uns três anos. Então, até hoje eu desço e fico sentado ali pensando, nem que seja por dez minutos”, disse.
Tropicália
Torquato Neto mudou-se para o Rio de Janeiro em 1962. Trabalhou para diversos veículos da imprensa carioca escrevendo colunas sobre cultura e música. Entretanto, foi com o surgimento da Tropicália que ficou nacionalmente conhecido ao firmar parcerias com Gilberto Gil, Caetano Veloso, Tom Zé e outros. Na capa do clássico disco manifesto ‘Tropicália’ ou ‘Panis et Circensis’, o poeta aparece de boina sentado ao lado de Gal Costa.
Entre suas composições mais conhecidas estão ‘Geleia Geral’, ‘Mamãe Coragem’, ‘Soy Loco por Ti América’, ‘Ai de mim Copacabana’, ‘Let’s Play That’ e ‘Go Back’, um dos maiores sucessos da banda paulista Titãs.
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