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sexta-feira, 4 de julho de 2014

MONARCO LANÇA CD COMEMORATIVO DE SEUS 80 ANOS COM PARCERIAS COM O FILHO E CANÇÕES DA MÁRIO LAGO

Zeca Pagodinho e Marisa Monte têm participação especial

Por Ailton Magioli



Baluarte de uma das matrizes mais ameaçadas do samba carioca – o samba de terreiro, ou de quadra; as outras são o partido-alto e o samba-enredo – Hildmar Diniz, o Monarco, se prepara para comemorar 81 anos em agosto, enquanto chega às lojas Passado e glória – Monarco 80 anos, com o qual marca, devidamente, a data redonda.

O agradecimento de Beth Carvalho (“Que beleza de música, Monarco. Que bom que você existe meuamor. Um beijo!”), depoisde interpretar Tristonha saudade, de autoria do próprio sambista, é a senha para a audição completa do disco, que ainda conta com as participações de Marisa Monte (Estação primaveril), Diogo Nogueira (A grande vitória) e Cristina Buarque (Momentos emocionais), entre outros bambas. Além da profundidade dos versos, há que se destacar o timbre belo e agradável de Monarco, espécie de “rei” da Portela.

“O que faço é o mesmo de 40 anos atrás, ou seja, o samba de terreiro com andamento normal”, diz o mestre da Velha Guarda da Portela, aproveitando para criticar o samba- enredo que, na opinião dele, também, está “corrido demais”. “Continuo compondo da mesma maneira que sempre fiz. Não faço samba corrido”, posiciona-se, salientando que, mesmo não tendo nada contra, pagode ele também não faz.

Em meio às 13 pérolas reunidas em Passado e glória, chama a atenção de imediato o samba Poeta apaixonado, com a qual Monarco abre o CD. “É o velho Mário Lago. Fiz como tributo a ele, que é o poeta apaixonado”, emociona-se Monarco, lembrando que um dos seus grandes sonhos era fazer música com o autor de Ai que saudades da Amélia, que é seu ídolo. “Já rapaz, tive a felicidade de conviver com ele, mas não consegui estabelecer a parceria. Agora, então, fiz Poeta apaixonado como tributo, usando versos do próprio Mário”, explica o sambista, que recorre a versos de clássicos como Nada além e Devolve na composição, parceria póstuma com o antigo companheiro.

“Sugeri estas estrofes e fui feliz. É o samba mais novo que há no disco”, data a própria criação, ressaltando que, em contrapartida, Crioulinho Sabú, também no repertório, tem mais de 70 anos. Trata-se do primeiro samba de Monarco que, sob influência do pai, começa a compor paródias aos 8 anos. “As rimas vêm de meu velho pai, José Felipe Diniz, que era mineiro de Ubá”, recorda. “Já a musicalidade é o dom que Deus me deu”, completa.

Com o filho Mauro Diniz, de 61, Monarco assina três composições do novo disco: Insensata e rude, A grande vitória e Horas de meditação. “Mas nós temos mais. Tem Dolores, que o Zeca Pagodinho gravou”, começa a listar a relação dos sambas feitos com o filho, que já somam cerca de 30 composições e que, em breve, deverão ser selecionadas para o repertório de um disco dos dois. Como revela, normalmente ele faz a primeira parte do samba, dando preferência a Mauro Diniz para completar a criação.

“Além de filho, Mauro é amigo. Vamos fazer um disco só com nossas canções”, afirma, orgulhoso da parceria, enquanto familiares mais jovens, como os netos João Matheus Diniz e Thereza Beatriz Diniz também fizeram questão de participar do disco do avô. Juliana Diniz, a mais conhecida das netas, que fez o musical Sassaricando, depois da estreia fonográfica foi estudar inglês nos Estados Unidos. 

Em família “Como a gente já se conhece bem e tem afinidade grande, fica mais fácil”, diz Mauro Diniz a respeito do trabalho com o pai. Depois de um DVD, ele agora está por trás do CD de Monarco. “Sei os caminhos e sigo com ele”, constata Mauro, que diz ter começado a compor influenciado pelo pai.

“Comecei a fazer samba com meus contemporâneos: Zeca Pagodinho, Ratinho, Jorge Aragão”, lista Mauro Diniz, salientando que só depois da carreira consolidada foi compor com o pai. “Ele me mostra a primeira parte e eu faço a segunda e vice-versa”, conta, explicando o método de trabalho adotado pelos dois.

“Agora meu pai é o parceiro mais constante”, diz orgulhoso Mauro, lembrando que de 15 a 20 delas já foram gravadas. A simplicidade, a profundidade dos versos e a força melódica são o que mais encanta o filho em relação à obra musical do pai. “Não tem mais compositores que fazem samba como Monarco. Hoje visam mais ao lado comercial. Meu pai nem sequer grava os sambas dele, faz por amor mesmo”, diz Mauro Diniz.

Ele ressalta o fato de as escolas de samba terem criado concursos de samba de terreiro diante da ameaça de extinção do subgênero. Candeia, que já morreu, Wilson Moreira e Nei Lopes são alguns dos contemporâneos do mestre portelense, todos, felizmente, ainda na ativa. 


Palavra de especialista

Nei lopes
compositor e escritor

Deus salve o Rei!

O samba carioca, matriz da música popular brasileira, nasceu entre a ocorrência das duas guerras mundiais e de diversos movimentos internos, quando o militarismo exercia forte influência na vida nacional. Daí a presença, nas escolas, de signos e elementos, como a percussão da bateria; a “evolução”; a própria denominação “escola” de samba; e a figura do “baluarte”. No vocabulário militar, “baluarte” é o sustentáculo de um reduto, a fortaleza inexpugnável. E o termo acabou se incorporando ao universo das escolas, para designar aquele indivíduo indispensável à defesa do samba, sempre ameaçado. 

Em 1970, lançada em disco, nascia institucionalmente a Velha Guarda da Portela, revelando um “velha-guarda” de apenas 37 anos, o Monarco. Cantor de belo timbre e compositor de letras densas, como as reveladas em seu primeiro LP solo, de 1974, ele logo se destacou. E com o falecimento de Manaceia, em 1995, assumiu, como baluarte que é, a liderança do grupo. Memória viva de sua escola, na melhor tradição dos griôs africanos, eis Monarco, verdadeiro monarca, no esplendor de seus 80 anos. Deus salve o Rei! 


Confira as faixas de 'Passado e glória – Monarco 80 anos'

01 – Poeta apaixonado, Monarco e Mário Lago
02 – Verifica-se de fato, Monarco e Ratinho, com Zeca Pagodinho
03 – Não reclame pastorinha, Monarco
04 – Tristonha saudade, Monarco, com Beth Carvalho
05 – Insensata e rude, Monarco e Mauro Diniz
06 – Estação primaveril, Quinho e Monarco, com Marisa Monte
07 – A grande vitória, Monarco e Mauro Diniz, com Diogo Nogueira
08 – Pobre passarinho, Ratinho e Monarco, com a neta Juliana Diniz
09 – Momentos emocionais, Monarco, com Cristina Buarque
10 – Fingida, Monarco, com Tuco Pellegrino, do Batalhão de Sambistas
11 – Meu criador, Mijinha e Monarco, com o filho Marquinhos Diniz e Velha Guarda da Portela
12 – Horas de meditação, Mauro Diniz e Monarco, com o filho Mauro Diniz
13 – Crioulinho Sabú, Monarco, com os netos Thereza Beatriz Diniz e João Matheus Diniz

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