Artista de Portugal adotou o estado como sua segunda casa. Cheia de planos para 2014, ela grava disco em BH e se prepara para lançar um CD para crianças
Por Ana Clara Brant
“Se eu fosse brasileira, certamente seria mineira.” A declaração é da cantora e compositora portuguesa Eugénia Melo e Castro, de 55 anos, que já virou figurinha carimbada nas Gerais. Uma relação que começou ainda nos anos 1970, quando morava do outro lado do Atlântico, e ganhou de presente o disco A página do relâmpago elétrico, de Beto Guedes. “Minha proximidade com Minas veio por meio da música. Provavelmente, devo ter sido a primeira pessoa a ter um disco do Beto Guedes em Portugal. Sempre tive acesso privilegiado à música brasileira, porque tinha muitos amigos que traziam as novidades para mim, e o meu próprio pai (o poeta e escritor E. M. de Melo e Castro) ia muito ao Brasil e também fazia essa ponte”, lembra a artista, que esteve esta semana em Belo Horizonte.
Está gravando o disco Sweet psychedelics, produzido por Robertinho Brant, que também assina as faixas ao lado de Marcelo Sarkis, no Estúdio Verde, no Bairro Serra. Todas as composições são em inglês e interpretadas por Eugénia. “É algo completamente diferente de tudo o que já fiz. São coisas inesperadas que ocorrem na vida. Sou apenas a intérprete. O encontro é surpreendente, tanto em se tratando das canções, dos músicos como dos arranjos. Estou apaixonada e envolvida com esse projeto, que deve ser lançado no primeiro semestre de 2014”, conta.
Mito
A parceria com Robertinho começou em 2009, quando o músico a dirigiu em um show no Palácio das Artes. Ali também nascia a ideia de concretizar a admiração da portuguesa pelos mineiros, o disco em homenagem ao Clube da Esquina, Um gosto de sol, lançado em 2011. O compositor e produtor lembra que Eugénia Melo e Castro era uma espécie de mito para ele, e desde o começo se mostrou simples e tranquila. Quando veio a sugestão do disco reverenciando o clube, ela já tinha na cabeça algumas músicas que queria gravar e também lhe deu total liberdade para sugerir outras. “Assim, chegamos facilmente ao repertório final. Eugénia é do tipo de artista com quem todo produtor quer trabalhar. Deu-me total autonomia para que eu desenvolvesse um conceito para o disco; deu-me liberdade para que escolhesse os músicos e fizesse todos os arranjos. Ela demonstrava, a todo momento, ter confiança enorme no meu trabalho, coisa que considero fundamental para que o resultado apareça. Nos demos tão bem que acabamos por engatar outro projeto, e espero que seja uma parceria que não termine tão cedo”, anseia.
Eugénia Melo e Castro é também toda elogios ao parceiro, e assegura que ele foi um produtor que soube conduzir como ninguém seu trabalho e sua voz. “Fiquei praticamente 30 anos me autoproduzindo, quase a carreira toda. Comandava tudo, tinha domínio sobre as coisas, sobre a minha emissão vocal e essa experiência nova, que veio com Um gosto de sol, foi fantástica. Depois de todo esse tempo, ter alguém me conduzindo é muito bacana. Encontrei um profissional com sensibilidade e novas possibilidades”, devolve.
Números da carreira de Eugénia
27 - discos
32 - anos de carreira
Sempre na ponte aérea
A programação da cantora lusitana é extensa. Em janeiro, ela colocará no mercado português seu primeiro CD com músicas para crianças, Conversas comVersos, musicando os poemas da mãe, a escritora e poetisa Maria Alberta Menéres. O álbum, que só chegará ao Brasil em março, conta com participações especiais como a do cantor Ney Matogrosso em Meu chapéu. “É um disco muito alegre, moderno, e, apesar de ser infantil, não é aquela coisa debiloide. Sem dúvida, ele reserva muitas surpresas e vai ser o primeiro produto da minha carreira assinado por Geninha Melo e Castro, que é meu apelido”, revela.
A incursão no universo dos pequenos não é novidade para a artista, que, no início da trajetória, chegou a apresentar um programa infantil na TV portuguesa chamado Quadrados e quadradinhos, além de ter composto músicas para animações voltadas para a criançada. Vivendo na ponte aérea Brasil-Portugal – ela passa o ano alternando sua estada entre São Paulo e Lisboa –, Eugénia conta que sempre norteou seu caminho no sentido de fazer a ligação entre os dois países, e ser uma cantora portuguesa que canta o Brasil. “Desde o meu primeiro disco, fico nesse vai e volta. Percebi que o Brasil não era um país para vir, cantar e ir embora. Queria entender isto aqui, conviver com os artistas, a música”, justifica.
Mas e a ciumeira dos nossos irmãos da terrinha? Será que existe? “Ah sim. Claro. Eu não achava que pudesse ocorrer, porque sempre vi isso como oportunidade para abrir as portas para outros artistas portugueses. Mas acabo fazendo essa ponte também, porque sempre levo os músicos do Brasil para lá. Acho que gravei sim mais brasileiros do que os meus compatriotas, ainda mais nos anos 1990, quando Portugal estava muito voltada para o mercado europeu. Mas estou na mesma linha há anos. Sou uma cantora portuguesa cantando o Brasil”, resume.
Turnês E, nas temporadas paulistas, a cantora e compositora sempre arranja uma brecha para vir a Minas. Pelo menos cinco vezes por ano, ela dá a graça por aqui, quase sempre a trabalho. Quando está em BH gravando, como foi o caso da última visita, não deixa de arrumar um tempinho para rever velhos conhecidos. “É muito corrido, mas tento administrar meu tempo livre. Almoço com Túlio Mourão ou janto com Toninho Horta, por exemplo. Tento visitar a casa das pessoas. Minha família brasileira é mineira; são esses meus amigos e parceiros. E sempre que estou em BH fico zanzando e tentando entender um pouco a cidade”, comenta.
A primeira grande amizade por aqui foi com Wagner Tiso, que ela convidou para gravar e fazer os arranjos de seu primeiro álbum, Terra de mel. Na próxima vez que voltar à capital mineira, será justamente para um encontro com o maestro três-pontano, também no Estúdio Verde, para finalizar Sweet psychedelics. “Em fevereiro, ele vai fazer os arranjos de cordas e sopros em seis faixas do CD, e vou acompanhá-lo. A partir de abril, inicio turnê de voz e piano ao lado de Wagner Tiso por cidades brasileiras e portuguesas. Faz uns 10 anos que não tocamos juntos, vai ser uma maravilha”, acredita.
Eugénia também espera, finalmente, poder lançar Um gosto de sol em terras mineiras. Ela lamenta ainda não ter conseguido encontrar um produtor que viabilizasse o show de apresentação do álbum, que traz releituras de canções do Clube da Esquina como Cais, Tarde, Fruta boa, entre outros clássicos. “O álbum ficou pronto em 2011 e, desde então, só consegui lançá-lo em São Paulo, no Rio e no interior paulista. Gostaria muito de fazer isso aqui. O show está pronto. Tem banda, cenário. Só falta acontecer. Ele tem tudo a ver com Minas e é uma homenagem ao estado com o qual me identifico tanto. Nasci na Serra da Estrela, em Portugal, região muito parecida com Minas, com montanhas altas e sem mar, terra do queijo. Já está mais do que na hora de a gente viabilizar esse lançamento”, ressalta.
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