Espaços físicos e virtuais oferecem CDs de veteranos e de destaques da cena contemporânea da capital
Por Eduardo Tristão Girão
É uma situação um tanto paradoxal. Contra tudo e contra todos, o CD resiste em Belo Horizonte – entre outras razões, graças à dificuldade de encontrar trabalhos dos artistas mineiros no mercado. Tente achar álbuns de Toninho Horta, Kristoff Silva ou Felipe José em qualquer loja e comprove. A diferença é que, para comprá-los, é preciso recorrer ao circuito paralelo de pequenas bancas informais, lojas virtuais e tendas montadas em eventos. Algumas lojas da capital mineira também apostam nesses títulos.
Os interessados são pessoas que ainda gostam de manusear discos e encartes, além de colecioná-los. Mesmo com downloads de tudo o que se possa imaginar pipocando pela internet, esses consumidores são convictos, garante Edu Pampani, proprietário da loja A Música Que Vem de Minas.
“Ainda tem gente que quer ter o original, não só no computador. É que nem foto deixada no computador, ninguém vê. O palpável é muito mais instigante”, diz Pampani. Ele comercializa nada menos de 1,1 mil discos de artistas mineiros em sua loja física (no Bairro Floresta) e em seu site, a R$ 20, em média, cada.
Entre os artistas do estado que mais o ajudaram a vender discos estão a cantora Fernanda Takai e o grupo Cobra Coral. “Não fecho com ninguém, tenho de tudo”, avisa Pampani. Há quase 30 anos no ramo, ele escuta tudo o que vende: “Se deixar para depois, não ouço. Não posso ficar com audição atrasada. Estou sempre em eventos e pegando coisa nova. A galera que lança disco já me procura na hora”, explica.
Além de vender os títulos em suas lojas (física e virtual), ele monta tendas em shows e fornece para alguns estabelecimentos de BH. “Não sou o cara que fica dentro da loja. Vou pra guerra”, diz.
“Lojista vagabundo não compra porque acha que não vai vender. As lojas não querem ficar empatando com títulos que demoram a vender, são imediatistas. Ainda mais agora, que há um lançamento atrás do outro”, critica. A internet tem funcionado bem no caso dele, sobretudo para clientes que moram fora da capital mineira, bons compradores de música regional.
Interior
“Nas cidades do interior, praticamente não há mais lojas de disco”, observa. Recentemente, Pampani enviou para o Piauí um pacote só de CDs mineiros, como Lô Borges e Pedro Morais, entre outros.
Na opinião dele, a nova geração musical de BH “tem potencial”. A produção independente (incluindo trabalhos que contam com lei de incentivo) é maior e melhor na capital, acredita. “Em matéria de música, capa e circulação, os produtos daqui dão de 10 nos de fora. Também, com o dinheiro que esses meninos arrumam, os trabalhos têm de ser legais mesmo. Tá cheio de estúdio e produtor bom aqui.”
Sobre a ala veterana, Pampani dispara: “Toninho Horta é difícil. Só tenho dele o álbum Harmonia e voz, o único em catálogo no Brasil. Telo Borges é outro que faz disco para ficar debaixo da cama”.
Prateleira solidária
É uma prateleira só – e bem pequena –, mas com objetivo muito nobre: divulgar bons discos lançados por artistas mineiros nos últimos anos. Fica no segundo andar de uma casa no Bairro Horto que, sem placa ou aviso, abriga a companhia de teatro Quatroloscinco, os ateliês Lampejo (de design) e Laboratório Filmes. Marco Antônio Gonçalves, sócio desse último, é um dos donos da ideia. “Temos muitos amigos com disco gravado e atuando na cidade, mas vimos que é difícil encontrar os trabalhos deles”, explica.
Por R$ 10 a R$ 20, são encontrados ali lançamentos de Kristoff Silva, Irene Bertachini, Luiza Brina, Luiz Gabriel Lopes, Pablo Castro, Gustavito, Frederico Heliodoro e Diapasão, entre outros.
“Não ganhamos nada com a venda, só disponibilizamos o espaço”, afirma Marco Antônio. Entre os principais fregueses estão integrantes do Grupo Galpão (o Galpão CineHorto é vizinho). Qualquer um pode passar por lá para comprar, basta entrar em contato por meio da página do ateliê Laboratório Filmes no Facebook.
Do new age ao chorinho
Outro veterano na distribuição da produção fonográfica mineira, o músico Marcus Viana tem 300 discos no catálogo da empresa Sonhos e Sons – a maioria de artistas do estado. “Sou uma espécie de cooperativa, mas sem poder de fogo. Precisaria de investimento para fazer promoções. Uns 10 vendedores espalhados pelo Brasil me compram esses discos”, explica. Seu foco são “lojas que querem qualidade”, mas qualquer pessoa pode adquirir os CDs pelo site.
Entre os artistas que estão por lá podem ser encontrados Uakti, Paulinho Pedra Azul e Alexandre Andrés – esse último, jovem talento da cena belo-horizontina de quem Viana é fã declarado. “Estou aberto para música instrumental brasileira, cantautores, new age, clássico, world music, eletrônico de boa qualidade e contemporâneos. Não distribuo mainstream. Não sou popularesco, mas popular. Não saberia vender sertanejo ou pagodeiro, mas consigo exportar chorinho. Apoio criadores”, avisa.
Marcus não pede exclusividade aos artistas, costuma ganhar R$ 1,50 a cada CD vendido e comercializa cada cópia por cerca de R$ 25. Entretanto, lamenta: discos de seu catálogo que considera maravilhosos não vendem tanto quanto gostaria. “Outros de que não gosto tanto vendem demais”, compara.
Os álbuns de Marcus Viana (55, vários de new age) e os do grupo Uakti são os campeões de venda. Impressionado com o talento dos jovens artistas de Belo Horizonte, o compositor revela que muitos não chegam a procurá-lo para distribuir seus trabalhos. “Alguns vão a gravadoras de São Paulo e se ferram”, conta.
O herói do Centro
Um dos “heróis da resistência” entre os lojistas de disco em Belo Horizonte, José Malaguth Mendonça, proprietário da Trem Azul, no Centro, garante: as vendas de música mineira são boas. Entre a clientela, há de tudo um pouco. “Conheço um cara do Paraná que, quando vem para cá, sempre procura música de viola. Como a loja fica perto da Conexão Aeroporto, aparece muito turista também”, afirma ele. Há cerca de 100 discos de artistas do estado nas prateleiras. Álbuns de Déa Trancoso, Vander Lee, Toninho Horta e Juarez Moreira estão entre os mais vendidos.
“Mariana Nunes é uma cantora espetacular. Muita gente, quando a ouve cantar, vem aqui procurar disco dela. Outros vêm por causa da Déa Trancoso, principalmente depois de o Egberto Gismonti elogiá-la. O disco do Cobra Coral também está bem. Vendo muito CD de choro aqui, dos grupos Flor de Abacate e Corta Jaca e do bandolinista Marcos Frederico, que é muito bom. O Thiago Delegado, outro muito bom, ficou de trazer o disco aqui, mas não apareceu”, reclama.
Nenhum comentário:
Postar um comentário