Além de divulgar carta de resposta, Fernando Duarte procurou o Diario para falar sobre o pagamento dos cachês dos shows.
Por Júlio Cavani
A menos de um mês do início do carnaval, críticas feitas por artistas ergueram polêmicas sobre o pagamento dos cachês dos shows e sobre o tratamento dado aos grupos folclóricos que se apresentam nas ruas. Cantores como China e Alessandra Leão chegaram a afirmar que não querem cantar este ano por causa de atrasos na liberação das verbas para os músicos. Guitinho da Xambá, do grupo Bongar, por sua vez, criticou a estrutura dos desfiles de agremiações da cultura popular, como caboclinhos, maracatus e escolas de samba. Além de divulgar uma carta de resposta, o secretário de Cultura de Pernambuco, Fernando Duarte, procurou oDiario para esclarecer e detalhar alguns pontos da questão.
Na entrevista, reconheceu que ainda há muito o que ser formalizado, principalmente em relação à regularização dos artistas. Por outro lado, acha que as críticas misturaram assuntos diferentes, pois relacionaram a questão dos pagamentos com a elaboração das grades de programação. Ele também explica como é a participação do poder estadual na realização dos carnavais de cada cidade pernambucana e o que tem sido feito para corrigir as distorções.
O governo de Pernambuco já pagou 99,58% dos cachês do carnaval de 2012. Até o último mês de maio, 68,86% já haviam sido pagos. Em julho, 94,99% dos pagamentos tinham sido feitos. As pendências, segundo o secretário, estão relacionadas à documentação apresentada pelos artistas e produtores.
Ainda estão abertas, até esta terça-feira, as inscrições para o edital que seleciona bandas e artistas contratados para tocarem no carnaval de 2013. O prazo originalmente terminava em dezembro, mas foi prorrogado. A seleção é feita por uma comissão formada por representantes do governo da área de cultura, turismo e da Casa Civil, junto com as prefeituras das cidades do interior e da Região Metropolitana do Recife.
O total de investimentos do governo do estado no carnaval de 2013 ainda não foi definido, mas será superior a R$ 20 milhões. Em 2012, o investimento foi de R$ 22 milhões, destinados para o patrocínio das programações das prefeituras.
Em 2012, o governo contratou 405 grupos e artistas, que fizeram 605 apresentações. Para 2013, mais de 1 mil propostas já foram inscritas no edital de convocação.
ENTREVISTA/ Fernando Duarte
"Não é verdade que o artista de fora receba o cachê antes"
Como você vê as polêmicas que surgiram nos últimos dias em torno do pagamento dos cachês aos artistas que se apresentam no carnaval?
Eu acho que esse debate está meio distorcido, mas a crítica é correta, pois sempre temos que melhorar os prazos de pagamento. O estado tem mesmo que se organizar e fazer isso acontecer de forma melhor e mais rápida. É um problema real. O planejamento ainda é precário na área de cultura. Na política cultural do estado, nos interessa pulverizar e ampliar as grades de programação, incluir mais gente. Incluir mais grupos alternativos e mais grupos de cultura popular. Nessa tentativa de ampliação da grade, eu passo por alguns problemas, pois o grau de organização dos segmentos não é o mesmo. Existem setores extremamente organizados, empresariados, com sua documentação em dia. E tem setores extremamente precários ainda, que estão em movimento de se organizar.
O que está distorcido nesses protestos e boicotes?
A crítica correta dos prazos de pagamento não pode se transformar em um outro tipo de crítica genérica, misturando política pública e programação de artistas nacionais. Além disso, o atraso sempre tem sido residual. Paguei 99,58% do carnaval de 2012. Do que estava correto, paguei 100%. O que está faltando são essas pendências de documentação. A nossa disposição, cada vez mais forte, é de diminuir os prazos. Isso é do nosso interesse. As pessoas estão fazendo o debate mas não estão apontando para o ponto central.
Mas você acha importante esse tipo de protesto?
Não temos problemas com isso. Sabemos que China e Alessandra Leão são grandes artistas, independentemente desse problema, e isso não afetará nossa relação com eles. O problema é que algumas dessas críticas foram meio generalizantes. Aí é evidente que o governo tem que entrar no meio para mostrar que não é bem assim. Acho que todo esse debate tem que ser feito sempre. Estamos tranquilos, nos esforçando para melhorar o desempenho e a execução dos prazos. Acho extremamente válido.
Quais as diferenças entre o pagamento de um cantor ou banda e o pagamento de um grupo folclórico, como uma escola de samba, um maracatu ou um caboclinho?
Nenhuma. A exigência é idêntica. Do ponto de vista formal de pagamento, não existe nenhuma diferença. A documentação que eu peço para um é a mesma que eu peço para o outro. O debate está na questão da remuneração, dos valores. Aí, a gente tem uma exigência, pela legislação vigente, que é a comprovação do valor dos cachês. Se você é uma banda, quer tocar no carnaval pela primeira vez e pede um cachê de R$ 90 mil, aí você tem que me provar que já recebeu esse cachê em pelo menos três shows anteriores. Se você não comprova, eu não vou poder pagar esse valor, segundo a lei. Aí, qual é o problema que isso dá? Se você só comprova que ganhou R$ 5 mil anteriormente, eu só vou poder pagar R$ 5 mil.
Então um grupo de caboclinhos que só costuma receber cachês na época do carnaval terá apenas o próprio carnaval como parâmetro para calcular o novo cachê e nunca poderá aumentar esse valor?
É a mesma regra. E eles só costumam receber da prefeitura ou do governo do estado, ou seja, quase nunca chegam a ter três fontes diferentes para serem usadas como parâmetro.
Isso não deveria mudar?
Eu acho que isso precisa ser reformulado, mas essa modificação passa pela legislação e pelo Tribunal de Contas. São normas a serem cumpridas. A solução, por enquanto, é aumentar o número de apresentações desses grupos. É um debate sobre o valor da arte deles, é algo que vai além da questão dos pagamentos do governo. É um sistema extremamente complexo. Há artistas que serão lembrados daqui a 100 anos mas ganham menos do que outros que surgiram agora e serão esquecidos daqui a cinco anos. Parece injusto, mas existe um mercado que afeta o valor dos cachês. Há um debate sobre a arte, um debate sobre o governo e outro debate sobre o mercado. Uma coisa foge do controle da outra. Cada um tem seus critérios diferentes. Ao mesmo tempo, é interessantíssimo tentar conciliar as três coisas.
Existe diferença entre a forma de pagamento de artistas de Pernambuco e de fora do estado?
Não. Não tem. A diferença está só nos valores e na forma como são feitos os convites. Os artistas locais têm uma reserva na grade de programação. Eles são prioridade e têm seu lugar garantido, enquanto os de fora precisam disputar essas vagas entre si. É claro que é impossível contemplar todos os artistas pernambucanos, pois mais de 1 mil já se inscreveram na seletiva do carnaval deste ano, mas tentamos aproveitar o máximo possível. Essa polêmica dos artistas de fora é totalmente falsa. Noventa por cento dos artistas que tocam no carnaval são de Pernambuco. E não é verdade que o artista de fora receba antes.
Ainda há informalidade nesse processo de pagamento de cachês? Há artistas que sobem ao palco sem contratos assinados ou sem prestações de contas?
Não. Todos os shows pagos pelo governo do estado estão formalizados. Eles são previamente empenhados com toda a documentação. Isso é uma garantia de que o recurso está destinado àquilo, está alocado. O que acontece é que, às vezes, o artista recebe esse empenho, que é uma espécie de cheque, mas não consegue ter acesso ao dinheiro por causa de algum problema na documentação dele.
O governo do estado promove alguma atividade ou programação de shows no carnaval?
Não. Apenas patrocinamos as prefeituras e participamos da elaboração da programação de cada cidade. Há alguns anos, havia um palco do governo em Olinda, mas hoje em dia não há mais nada.
Como o governo interfere na programação de carnaval das prefeituras que recebem patrocínio estadual?
A gente faz um debate separadamente com cada uma das 22 prefeituras apoiadas. É uma espécie de negociação sobre as grades de programação. Queremos saber quem são os nomes nacionais que eles querem, quem são os nomes locais, quais são os cortejos e quais são as orquestras. Temos uma comissão que seleciona as propostas inscritas no edital, mas a escolha delas é feita junto com as prefeituras de acordo com o interesse de cada cidade. A única coisa que é totalmente assumida pelas prefeituras é a infraestrutura, que inclui coisas como banheiros, limpeza, montagem de palcos, iluminação e camarins.
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