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terça-feira, 2 de outubro de 2012

LUIZ GONZAGA E A ESQUERDA: CELSO FURTADO EM PARIS



Por Abílio Neto


Luiz Gonzaga cantou para o povo parisiense em duas oportunidades, em 1982 e 1986. Em 1982, foi levado pela cantora Nazaré Pereira.

A viagem de 1986 foi uma coisa meio complicada, tanto que "Seu Luiz" não gostou:

Nessa viagem que eu fiz para Paris em 1986, tinha política por trás, aí puxava pra um lado, puxava para outro e houve atrito. Eu acho bom quando a gente é levado por um movimento social, mas lá era coisa de governo e governo não está com nada. Mas o grande lucro que eu tirei dessa viagem foi ter visto o show de Gilberto Gil no Olympia. Eita nego enxuto! Agora meu show também foi bonito. Para mim foi um grande momento. Eu tive a presença de dois grandes nomes da cultura na plateia: o ministro francês da Cultura e Celso Furtado, que depois foram ao meu camarim”.

Para Luiz Gonzaga, a presença de Celso Furtado no seu show serviu para lavar sua alma porque depois da chamada revolução de 1964, ele sofreu desprezo por parte de grandes figuras da esquerda no Brasil. O mínimo que diziam dele era “adesista”, “conservador”, “de direita” e “reacionário”.

Ora, mas Luiz Gonzaga foi um cantor de protesto: gravou “Vozes da Seca”, em 1953, “A Triste Partida”, em 1964 e “Pra Não Dizer Que Não Falei de Flores”, em 1968 (o ano do AI 5). Ele foi proibido durante o governo Médici de cantar em shows “Vozes da Seca”, “Paulo Afonso” e, pasmem, “Asa Branca”.

Falavam também que ele não se aproximava de Dom Hélder Câmara e Miguel Arraes, porém ele não deixou por menos:

“Eu nunca tive contatos com Dom Hélder Câmara, nem com Miguel Arraes. Para eles eu sou um meio-termo. Eles acham que eu sou bonzinho porque exalto a Igreja e o Papa. Sou um cantor de protesto, mas acredito em Cristo, em Deus, e não quero ser radical. Quero cantar para todas as praças. Os radicais não acham graça no meu trabalho, dizem que eu faço muita concessão. Eu exalto os políticos quando eles merecem”.

Esse era "Seu Luiz" Gonzaga. Gostassem ou não dele, ele era desse jeito. Acrescento apenas que além das três músicas de protesto acima, ele gravou outra em plena efervescência de 1968, que para mim foi uma das coisas mais marcantes que ele gravou. É pouco conhecida, não é de Zé Dantas nem de Humberto Teixeira, nem ele tentou “empurrar” seu nome como compositor no selo do disco. Não adianta tentar diminuir a dimensão artística de Luiz Gonzaga porque ele era grande mesmo. Viu, José Teles?

Então, escutem agora “O Andarilho”, de Dalton Vogeler e Orlando Silveira. É para mim um dos mais lindos baiões da história do gênero. Coloca o dedo na ferida sobre a situação dos retirantes nordestinos que deixavam o sertão seco e sem vida para passarem fome em São Paulo e Rio de Janeiro, morando em favelas e muitas vezes ingressando no mundo do crime! Os arranjos e a interpretação de Luiz Gonzaga são um verdadeiro luxo!

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