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sexta-feira, 14 de maio de 2010

JOÃO SILVA E SUAS RAÍZES

O sertão de João Silva é puro. Daí o nome do seu novo CD, Sertão puro. As imagens do seu passado em Arcoverde estão cristalizadas desde que ele deixou sua cidade natal e foi morar no Rio de Janeiro. Fez carreira, formou família, conheceu, produziu e foi parceiro de Luiz Gonzaga em muitas músicas de sucesso, a partir do LP Danado de bom, até o final da vida do rei do baião. Há dois anos morando pertinho do mar de Boa Viagem, João tem sua história evidenciada num filme documentário (Recordações nordestinas, da Mariola Filmes, ainda não lançado), num livro (Pra não morrer de tristeza, de José Maria Almeida Marques), e agora num novo álbum, inédito, autoral e sem parcerias.

João Silva começou a gravar o disco em 2009, e não teve pressa. O objetivo é que a parceria com o produtor não batesse com o seu gosto. "Eu gosto de ser produzido, fico mais liberto, mas quando querem fugir da raiz e justificar alguma coisa, não deixo. É a raiz que eu defendo", diz o forrozeiro. O lançamento, hoje às 20hs na loja Passadisco (Shopping Sítio da Trindade, Estrada do Encanamento) deve reunir a nata do pé-de-serra, incluindo Gennaro, que produziu o disco junto com João e colocou sua sanfona; Walkyria, que fez coro com Gennaro e Quartinha, o lendário zabumbeiro e triangueiro, que também tocou com Gonzaga e toca com Dominguinhos, entre outros bons do forró.

O forró de João é trabalhado no baião. Com a voz e a sanfona na frente, acompanhada pelo trio zabumba, triângulo e agogô, encorpada pelo baixo, guitarra e bateria. A poesia de João é também elemento principal. Elas saem de uma memória geográfica, física e sentimental do compositor, que deixou Arcoverde ainda jovem, mas nunca se desligou de certas imagens, paisagens e comportamentos. Para João, o máximo da mudança no Sertão foi o asfalto e a luz elétrica. "O resto está quase tudo igual". E o que resta da cultura de sua época, na sua opinião, tem que ser preservado.

"Você vê uma brejeira pegar uma bandeija de café secado no terreiro e ir pilar com orgulho no pilão. Depois ir no moinho de pedra moer o xerém, hoje não tem mais isso". O disco então é saudosista? "Tem uma parte de saudosismo e uma parte de preservação da memória. Eu sou escritor do pequeno analfabeto", diz.

Memória ou realidade do pobre do Sertão, o disco de João relaciona rica e simplesmente homem, natureza, cultura e sociedade. "Catinga de palha que queime as palha/ mas não mexa na folha desse marmeleiro/ que no final dessa trilha mora/ uma família trabalhadeira num furmigueiro", canta em A formiga e o sertanejo.

"Pedi as conta tô de malas pronta/ por que cheguei agora a conclusão/ que a gente sai do nosso pé de serra/ mas o nordeste sai de nós não", canta em Baioneiro Gonzagão, que fez inspirado no inverso da Triste partida, de Patativa do Assará, onde o homem rural, nordestino, pobre, vai tentar a vida nas "terras do sul". João, ao contrário, foi e experimentou o prazer da volta. Ele também aproveita o novo cancioneiro e inclui uma crítica pertinente ao novo cenáriodo forró. Em Aonde mora meu baião, canta que, "xotizinho vez em quando é bom/ mas é feito bolo de brôa/ todo noite, toda dia enjôa". E tem o recado ainda para os que pensam que, depois da fama e do dinheiro, ele mudou. "Foi o gado e a fazenda/ a marca do meu carro/ e o meu dinheiro que aumentou/ mas mesmo assim/ minha vidinha continua/ comendo baião de dois, tumando facé de cuia".

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