Dolores Duran (1930 - 1959) foi compositora muito à frente de seu tempo. A fina arquitetura melódica e poética de suas 35 músicas ergueu obra de modernidade atemporal, quase sempre distante da construção melodramática do samba-canção que imperou na década de 50. Como cantora, Dolores teve se ajustar às regras da indústria fonográfica da época, se valendo de sua versatilidade como crooner diplomada na noite carioca para urdir discografia curiosa, mas aquém de sua obra autoral. É a crooner - e não a compositora - que é enfatizada na produção fonográfica reunida na oportuna caixa Os Anos Dourados de Dolores Duran. Produzida por Rodrigo Faour, a caixa reúne - em seis CDs - as 75 gravações oficiais feitas pela artista no selo Star e na extinta Copacabana entre 1951 e 1959. De quebra, o box embala CD duplo, O Negócio É Amar, com gravações (irregulares) das 28 músicas de Dolores que a autora não teve tempo de registrar em sua própria voz. Com visão tacanha na época, a indústria fonográfica dos anos 50 não apostava na produção autoral de mulheres que se aventuravam na arte da composição, da qual Dolores foi pioneira ao seguir a trilha aberta por Chiquinha Gonzaga (1847 - 1935). O que justifica o fato de ter gravado apenas sete de suas 35 músicas.
A bela caixa reedita os quatro álbuns oficiais de Dolores e duas coletâneas póstumas editadas em 1960. Até então inédito em CD, Dolores Viaja (1955) traçou rota mundial para a crooner poliglota, que gravou até em alemão (Kaiser Waizer, que vem a ser a Valsa do Imperador, do compositor Richard Strauss) e em esperanto (Nigraj Manteloj, versão do fado Coimbra). Mas o curioso é que foi em solo brasileiro que Dolores alçou maior voo nas paradas ao gravar a Canção da Volta (Antonio Maria e Ismael Neto), seu primeiro sucesso como cantora. Como faixas-bônus, Dolores Viaja apresenta as duas primeiras gravações de Dolores, Que Bom Será e Já Não Interessa, feitas em 1951 para um disco de 78 rotações por minuto editado pelo selo Star. Do acervo raro do Star, vem também Outono - samba-canção de Billy Blanco.
A crooner versátil também foi requisitada nos dois álbuns seguintes da artista - como já anunciavam os títulos Dolores Duran Canta para Você Dançar... (1957) e Dolores Duran Canta para Você Dançar nº 2 (1958). Foram nestes discos - que já haviam sido reeditados no formato de CD no estilo Dois em Um - que a compositora teve a oportunidade de registrar, pela primeira vez, suas criações, gravando Por Causa de Você, Não me Culpe e Solidão. A novidade é que o segundo volume incorpora na atual reedição sobra até então inédita, Mes Mains, tema francês de autoria de Gilberto Bécaud. Na sequência, Dolores se embrenhou em terras nordestinas no que viria a ser seu último álbum, Esse Norte É Minha Sorte (1959), todo dedicado aos xotes e baiões.
Para que a caixa inclua todas as 75 gravações oficiais de Dolores, as boas coletâneas A Noite de Dolores Duran e Estrada da Saudade agregam fonogramas dispersos na discografia da artista por terem sido lançados em discos de 78 rotações por minutos ou em compactos. A Noite de Dolores Duran rebobina as duas últimas gravações da compositora, A Noite do meu Bem e Fim de Caso, feitas em compacto editado em 1959, pouco antes da morte da artista. Estrada de Saudade reapresenta, entre fonogramas raros, duas gravações que marcaram a carreira de Dolores como intérprete: o samba A Banca do Distinto (Billy Blanco) e o baião A Fia de Chico Brito (Chico Anysio). Aliás, pelo tom coloquial de seu canto, Dolores Duran poderia ter ido mais longe como intérprete. Contudo, a precoce saída de cena da artista - em 24 de outubro de 1959, aos 29 anos - impediu que a cantora tivesse tempo de transitar por outras bossas. Ainda assim, o legado de sua obra autoral é valioso e garante seu lugar na lista dos grandes nomes da música brasileira produzida naqueles dourados anos do século 20.
Parabéns! Dolores Duran, uma diva esquecida. Obrigado pela informação. Abraços e valeu pelo blog
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