Em 1977, Odair José resolve lançar um LP com estilo totalmente diverso do que costumava lançar e que o consagrara junto ao público. Seu plano era produzir um disco em ritmo de rock, estilo garage rock, mesmo sem maiores sofisticações ou requintes técnicos. As influências assumidas de Odair são tão diversas quanto o pianista de Jazz Herbie Hancock, o cantor Peter Frampton e o filósofo Gibran Khalil. Na concepção original de Odair, esse disco seria um álbum duplo que contaria a história de um indivíduo de seu nascimento à morte.
Só que nem tudo saiu como Odair José queria. Mesmo com o aval da sua nova gravadora, os produtores não quiseram arriscar com uma “banda de garagem” e Odair gravou esse disco com a sua tradicional banda Azimute. A gravadora também não quis lançar o álbum duplo, preferindo lançar um único LP.
Em dez faixas, Odair relata em versos a conturbada história do casal-título e do fruto dessa relação fugaz. Em momento algum Odair afirma estar falando de Jesus, e sim de um indivíduo, do “Filho de José e Maria”. Mas a associação é inevitável. E ao colocar o personagem em dilemas existências quanto ao uso de drogas e da sexualidade ele causou celeuma, como também às críticas tecidas à instituição do casamento religioso e a própria igreja. Mesmo sem Odair adotar o termo, a imprensa logo o classificou como uma ópera-rock, certamente comparando-o a obras como Tommy, do The Who, ou The Wall, do Pink Floyd. A gravadora BMG/RCA, que acabara de contratá-lo, apostou em um novo sucesso popular, e ficou a ver navios quando o disco “O Filho de José e Maria” teve críticas desfavoráveis e baixa receptividade do público, e um padre chegou a excomungar Odair José. Muitos acusaram Odair José de tentar elitizar sua obra, se afastando do povão. Resumo da ópera-rock: o disco não vendeu porra nenhuma, o povo não entendeu, a crítica esculhambou, o padre excomungou, a gravadora ficou puta da vida e Odair José só teve aborrecimento. E o pobre ainda teve que ir ao Vaticano pedir perdão ao Papa.
Não obstante o fracasso comercial e a dor de cabeça obtida, vinte anos depois ele mesmo admite que esse disco é um dos melhores trabalhos de sua carreira. Hoje o disco pode ser considerado cult, e não apenas pela curiosidade de ser uma ópera-rock gravada por um ícone brega. O disco tem seus méritos, com arranjos legais, entre o psicodélico e o progressivo, talvez um pouco datados, mas nada que impeça de ser apreciado. Mas o Odair José está presente na simplicidade das letras e no jeito de cronista dos excluídos sociais. Uma pena que o disco não foi bem recebido naquela época, em que o público era bem menos tolerante com ousadias de seus ídolos. E como ele ainda é inédito em CD, só recorrendo a sebos em busca do vinil ou baixando as versões MP3 que circulam pela Internet. No tributo a Odair José, lançado ano passado, a banda Shakemakers regravou a primeira faixa do disco, “Nunca Mais”, e o Pato Fu participou com uma versão de Uma Lágrima, faixa do disco “Coisas Simples”, que seria o segundo disco do LP duplo que Odair originalmente concebera, e que foi lançado apenas em 1978.
Odair José - O filho de José e de Maria (1979)
Faixas:01 - Nuca mais
02 - Não me venda grilos (por direito)
03 - Só pra mim, pra mais ninguém
04 - É assim
05 - Fora da realidade
06 - O casamento
07 - O filho de José e Maria
08 - O sonho terminou
09 - De volta às verdadeiras origens
10 - Que loucura
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