sábado, 24 de outubro de 2020

ALMANAQUE DO SAMBA (ANDRÉ DINIZ)*

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Paulo César Pinheiro

“O samba bate outra vez,
bate outra vez não pára...”
MAURÍCIO TAPAJÓS e PAULO CÉSAR PINHEIRO, “O samba bate outra vez”


Paulinho Pinheiro é um dos mais renomados letristas da MPB. Autor de mais de 1.300 músicas – 700 delas gravadas –, foi parceiro de Baden Powell, João de Aquino, Edu Lobo, Dori Caymmi, João Nogueira, Francis Hime, Guinga, Mauro Duarte, Raphael Rabello, Maurício Carrilho, Ivor Lancelotti, Roque Ferreira, Tom Jobim e Aldir Blanc, para ficarmos só em alguns nomes. O número de parceiros já nos dá uma idéia da dimensão do espírito do poeta.
Desde a vitória de “Lapinha”, feita em parceria com Baden e defendida na Bienal do Samba de 1968 pela brilhante Elis Regina, Paulo Pinheiro vem sendo cantado por uma legião de intérpretes (isso quando ele próprio não solta o vozeirão rouco).
Escreveu trilhas musicais para cinema, teatro e novelas, além de duas canções para o programa Sítio do Pica-Pau Amarelo, da Rede Globo. Com vasta produção cultural, é apreciador dos escritores João Cabral de Melo Neto, Carlos Drummond de Andrade, Fernando Pessoa, Vinicius de Moraes e Guimarães Rosa. Ele próprio é também poeta e autor de Canto brasileiro, Viola morena, Atabaques, violas e bambus e Clave de sal – Poemas de mar.
Sua musicalidade reflete a influência de Nelson Cavaquinho. Entretanto, enquanto as letras de Nelson ficavam circunscritas à melancolia e ao ceticismo, Paulo foi além do mestre, abordando temas mais amplos da vida e do cotidiano, como a política, a liberdade, o amor, o carnaval, a religião e a cidade. 
Sua obra grandiosa mostra a diversidade de estilos, mas guarda com muita força a riqueza do legado do samba. Com Baden Powell, um dos seus primeiros parceiros, produziu músicas do quilate de “Vou deitar e rolar (Qua-quara-quaquá)”, “Samba do perdão”, “Refém da solidão” e “Carta ao poeta”.
Ao lado do parceiro Eduardo Gudin, Paulo ganhou o festival da TV Tupi, em 1971, com “E lá se vão meus anéis”, e organizou um show engajado de resistência à ditadura militar, que ainda contaria com a participação da cantora Márcia apresentando belas composições da dupla: “Veneno”, “Velho casarão” e “Velho passarinho”.
Mauro Duarte e João Nogueira foram outros parceiros importantes do poeta na divulgação do samba. Mauro, carioca da turma de Botafogo, apelidado de “Bolacha” pelo cantor Ciro Monteiro e muito respeitado no meio dos bambas, escreveu com Paulinho Pinheiro belos sambas que fizeram sucesso na voz de Clara Nunes, primeira mulher de Paulo: “Menino Deus”, “Canto das três raças”, “Portela na avenida”, “Serrinha”... Com João Nogueira, o poeta compôs “Súplica”, “O poder da criação”, “Minha missão” e o samba-enredo da Tradição “Rio, samba, amor e tradição”. Juntos, Paulo, Mauro e João compuseram “Um ser de luz”: “Um dia/ um ser de luz nasceu/ numa cidade do interior/ e o menino Deus lhe abençoou...”, após a morte de Clara. Paulo César Pinheiro ganhou o Prêmio Shell em 2003, em reconhecimento a toda a sua obra.


João Nogueira

“Meu samba sempre foi tirado do peito
quando sai, já sai com meu jeito
com malícia e opinião
meu samba sempre foi mostrado direito
por favor, exijo respeito
com a cor do meu pavilhão...”
JOÃO NOGUEIRA e PAULO CÉSAR PINHEIRO, “Primeira mão”


João Nogueira cresceu no meio do choro e do samba – seu pai era amigo de Pixinguinha, João da Baiana e Donga. Com ouvido musical e desenvolvendo grande talento para o samba, João acabou por construir uma carreira originalíssima entre os cantores do gênero. Possuidor de uma voz encorpada, de som grave e solene, figurou, ao lado de Roberto Ribeiro e Zeca Pagodinho, entre as principais vozes do samba nas últimas décadas do século passado.
Acostumado a se autoproclamar “sambista de calçada”, para se diferenciar dos bambas do morro, João misturou em suas interpretações a harmonia de João Gilberto e o sincopado de Geraldo Pereira. 
Compositor requintado, formou parcerias com Paulo César Pinheiro, Ivor Lancelotti, Carlinhos Vergueiro, Zé Catimba, Nei Lopes, Paulo César Feital, Maurício Tapajós e Mauro Duarte, entre outros. Sua produção inclui maxixes, música rural, partidos-altos, sambas-enredos, sambas-afro e sambas seresteiros, entre outros estilos. Seus principais sucessos são “Súplica”, “Um ser de luz”, “Espelho”, “E lá vou eu”, “Nó na madeira”, “Mineira”, “Das duzentas pra lá” etc.
Em 1979, João fundou, no quintal da sua casa, no Méier, o Clube do Samba, espécie de reduto do samba “de raiz”. No carnaval do ano 2001, o bloco do Clube do Samba desfilou com o enredo “Como diria João”, homenagem ao sambista, criado coletivamente pela ala de compositores.
Para terminar, vale a pena entrar no clima nogueiriano, aquela mistura explosiva e criativa de boemia e música, e deixá-lo falar. Certo dia um jornalista, encantado com o vozeirão do sambista, quis saber: “João, a que se deve esse tom grave e marcante de sua voz? Que técnica você usa?” “Cerveja e cigarro à vontade”, sacramentou João.








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