segunda-feira, 28 de setembro de 2020

ROSA PASSOS LEVA TODA A SUA BOSSA PARA O INSTAGRAM

Na sala de casa, violonista e compositora baiana reinventa clássicos da música brasileira

Por Augusto Pio



Do sofá de sua casa, em Brasília, onde posou para esta foto em 2011, Rosa Passos enfrenta a pandemia com talento e boa música (foto: Daniel Ferreira/CB/D.A Press)


Um cantinho, um violão – e que violão! Assim são as performances com que a cantora, compositora e violonista Rosa Passos brinda os ouvintes no Instagram. Artista de renome internacional, a baiana radicada em Brasília já tinha o hábito de “cantar on-line” muito antes de o coronavírus trancar público e artistas em casa. “Não gosto de fazer live. Normalmente, faço um vídeo cantando uma música que dedico aos meus fãs”, ela explica.

A cantora, aliás, já faz isso há 10 anos. “É engraçado, porque tem muita gente descobrindo a Rosa Passos agora. Fico feliz, há pessoas colocando meus vídeos antigos e compartilhando em suas páginas. Artistas como Djavan e Hamilton de Holanda sempre deixam likes nos meus vídeos. Sinal de que estão gostando, né?”, comenta.

O repertório de Rosa traz clássicos de Dorival Caymmi, Djavan, Edu Lobo, João Bosco, Gil e Caetano, entre outros compositores. “Às vezes, vou lá ao passado e busco coisas antigas, como canções imortalizadas nas vozes de Sylvio Caldas e Maysa. Pego coisas antigas que ninguém nunca mais cantou e coloco a minha assinatura. Isso é bom para os fãs poderem passar a quarentena felizes, ouvindo música boa”, diz.

Porém, nada é “mais do mesmo” em se tratando de Rosa Passos. Com seu violão, ela dá nova vida a canções que todo mundo já se cansou de ouvir. “Gosto de pegar músicas que gravei e fazer a minha leitura, uma coisa mais com a minha cara”, explica.

Além das performances domésticas no Instagram, ela tem participado das lives de outras cantoras – entre elas, Teresa Cristina, Vanessa Moreno e Mônica Salmaso. Feliz da vida, conta que amou cantar Juras, composta por ela e Fernando Oliveira, em dueto com Mônica, na quinta-feira passada. Deram um show – vozes e violão, um luxo só. Hamilton de Holanda, Zé Maurício Machline e Roberta Campos, entre outros, enviaram aplausos virtuais para a dupla.

A baiana também costuma fazer intercâmbio com músicos amigos que moram fora do país. “É bom poder gravar com pessoas distantes, principalmente tocando música brasileira. Esta pandemia está fazendo com que a gente, de alguma forma, se movimente”, acredita a cantora.


FÉRIAS

O isolamento social não representa um drama para ela. “Sempre gostei de ficar em casa, porque viajei muito. Para mim, minha casa significava férias. Não tenho nenhum problema em ficar aqui. Nesta pandemia, estudo mais ainda. Além disso, poder fazer música para as pessoas curtirem é muito bom”, diz Rosa, por telefone, de Brasília.

Atualmente, a vida está mais sossegada. Quando o isolamento social foi decretado, ela não se viu obrigada a adiar shows, pois acabara de operar o joelho. “Tive de dar um tempo para a recuperação. Agora vou operar o outro, devo ficar parada por mais uns tempos. Portanto, ainda não há data prevista para voltar ao palco. Enquanto isso, vou compondo, gravando e postando vídeos”, diz ela.

A rotina é radicalmente diferente da correria de outros tempos. “Viajei durante nove anos sem parar. Tinha escritórios na Espanha e nos Estados Unidos, minha agenda era fechada oito meses antes. Para conseguir fazer carreira lá fora, é preciso trabalhar como formiguinha, ter algum diferencial, uma assinatura. Caso contrário, não se chega a lugar nenhum. Não é só pegar o violão e sair cantando em bares, é muito mais que isso”, comenta.

Rosa lançou 20 discos, entre eles trabalhos em parceria com o americano Ron Carter, o cubano Paquito D'Rivera, o francês Henri Salvador, o japonês Sadao Watanabe e o violoncelista sino-americano Yo-Yo Ma. Ao lado desse último, ela ganhou o prêmio Grammy, em 2004, por sua coparticipação no disco Obrigado Brazil. No país, ela trabalhou com Chico Buarque, Ivan Lins e Cyro Baptista, entre outros.

Yo-Yo Ma é parceiro importante para a carreira de Rosa. “Com o Obrigado Brazil, fomos para a Europa, Estados Unidos e Ásia. Ele é uma das pessoas mais competentes que conheci. Sempre digo para ele: ‘Como você é lindo, pois é um dos maiores violoncelistas do mundo e tem essa humildade’. E ele responde: 'Mas você também é assim. Fazemos parte da mesma tribo e poucos podem fazer parte dela’.”


JOÃO

A cantora e violonista conta que suas maiores influências vieram de João Gilberto e do cantor norte-americano Johnny Mathis. “Mas também de divas como Ella Fitzgerald, Billie Holiday, Sarah Vaughan, Nina Simone e Julie London.”

Criança, Rosa estudava piano. Mas um disco mudou sua vida. “Ao completar 11 anos, ouvi Orfeu do carnaval, que trazia músicas de Tom Jobim e Vinicius de Moraes interpretadas por João Gilberto. Foi como um toque de mágica. Ouvindo João tocando A felicidade, pensei comigo: 'O que é isto?'. Fiquei tão apaixonada que ouvi o disco por vários dias seguidos.”

A partir daquele momento, ela passou a “estudar” João Gilberto. Nasceu assim a cantora e violonista que fez fama por ter seu próprio estilo. “João foi uma grande fonte da minha vida. Comecei a tirar sozinha as músicas dele. Aprendi a questão da divisão, da dinâmica e da respiração, coisas importantes. Principalmente, a educação respiratória, fundamental quando se canta”, explica. Outras lições vieram do jazz. “Escuto jazz desde os 5 anos”, diz. “A música é de Deus, eu sou um instrumento canalizador da luz divina.”

Consciente de seu dom, a baiana se diz fruto da conjugação de esforço e talento. “É preciso aliar as duas coisas. Procuro ouvir jazz e estudar o instrumento. Quando faço um vídeo, busco estudar a música e fazer a minha leitura. Para que a coisa flua, é preciso associar talento e estudo. Em minhas gravações, gosto de deixar a minha assinatura, que vem lá de dentro, mas também é uma coisa de Deus.”


HONRA

Chamada de “João Gilberto de saias”, a baiana diz que o apelido “é uma honra”, mas pondera: ele traz muita responsabilidade. “João é João, nunca aparecerá outro igual. Eu sou Rosa Passos e também faço música brasileira de qualidade, tanto é que sou considerada uma artista jazzística no país do jazz (Estados Unidos), e não uma cantora latina”, orgulha-se.

Rosa faz questão de ressaltar que participa de festivais na Europa, EUA e América Latina porque seu trabalho tem conotação jazzística. “Mas isso sem perder a brasilidade e o suingue”, avisa.


ROSA PASSOS

Os vídeos da cantora e violonista podem ser conferidos no Instagram (@rosamariapassos)

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