PROFÍCUAS PARCERIAS

Gabaritados colunistas e colaboradores, de domingo a domingo, sempre com novos temas.

ENTREVISTAS EXCLUSIVAS

Um bate-papo com alguns dos maiores nomes da MPB e outros artistas em ascensão.

HANGOUT MUSICARIA BRASIL

Em novo canal no Youtube, Bruno Negromonte apresenta em informais conversas os mais distintos temas musicais.

sábado, 30 de abril de 2016

PETISCOS DA MUSICARIA

DE QUEM SÃO ESSES CLÁSSICOS? (V)

Waldeck: humor e criatividade, além de clássicos


Semana passada, encerrando o ciclo de canções cujos títulos continham a expressão “Pau de Arara”, trouxe aqui e reproduzi para nossos leitores, aquela que talvez seja a mais desaforada de todas: “Pau de Arara é a Vovozinha”. Talvez a derradeira contendo título semelhante. Não sei.

Naquele dia, avisei que, sendo quem era o autor daquela música, não poderia parar por ali a série “De Quem São Esses Sucessos/Clássicos?”. Deixar de fora Gordurinha é faltar com um dos maiores e mais importantes nomes deste segmento que denomino de quase-desconhecidos ou anônimos autores de grandes clássicos brasileiros.

Gordurinha era o apelido – a graça pelo oposto -, de Waldeck Artur de Macedo, um perfeito magricela. Nascido na Saúde (ah, velha rua Frei Caneca, ladeira do Alvo, nota do autor), em Salvador, no dia 10 de agosto de 1922. Do seu repúdio à colonização americana, esteriotipada pela goma de mascar nasceu o bebop-samba ‘Chiclete com Banana’, em parceria com Almira Castilho (esposa e parceira de palco de Jackson do Pandeiro), que acabou por antecipar o tropicalismo ao sugerir antropofagicamente na letra: ‘só boto be-bop no meu samba quando o Tio Sam pegar no tamborim……quando ele entender que o samba não é rumba’. O desagravo antropofágico foi celebrizando por Gilberto Gil.

Mas não foi só de glória e reconhecimento tardio a vida deste que, ao lado do Trio Nordestino, iria se transformar no baluarte do forró na Bahia e no Nordeste. Sua estréia no mundo da música se deu em 1938, quando fez parte do conjunto vocal “Caídos do céu” que se apresentava na Rádio Sociedade da Bahia, fazendo depois par cômico com o compositor Dulphe Cruz.

Logo se destacou pelo seu dom de humorista e pelo sarcasmo que iria ser disseminado em suas letras anos mais tarde.

Em 1942, Gordurinha largou a Faculdade de Medicina e seguiu sua sina de cigarra. Os passos iniciais seriam dados numa Companhia Teatral. Caiu na estrada, de cidade em cidade e povoando de música e pantomimas outras plagas.

Seu próximo passo seria um contrato na Rádio Jornal de Comércio, em Recife, em 1951. Depois, o jovem compositor, humorista e intérprete Gordurinha passou pela Rádio Tamandaré, onde conheceu o poeta Ascenso Ferreira, Jackson do Pandeiro e Genival Lacerda.

Estes dois últimos gravaram, em primeira mão, várias das suas composições. “Meu enxoval”, um samba-coco em parceria com Jackson do Pandeiro seria um dos carros chefes do disco ‘Forró do Jackson’, de 1961.

Outro que se daria bem com uma composição do baiano seria o forrozeiro paraense Ary Lobo – outro artista que o Brasil insiste em esquecer – que prenunciou o Mangue Beat ao cantar: ‘Caranguejo-uçá, caranguejo-uçá/ A apanho ele na lama/ E boto no meu caçuá/ Caranguejo bem gordo é gaiamum/ Cada corda de 10 eu dou mais um.

“Vendedor de Caranguejo” foi gravada por Clara Nunes, em 74, e por Gilberto Gil no seu ‘Quanta’, de 1997. Entre centenas de sucessos, alguns clássicos, Gordurinha, sozinho ou em parcerias – fez maravilhas como “Baiano Burro Garanto que Nasce Morto”; “Mambo da Cantareira”; “Pau de Arara é a Vovozinha”; “Chiclete com Banana” e esta que escolhi por ser uma das mais belas obras do cancioneiro popular brasileiro:

Súplica Cearense (Gordurinha e Nelinho), com Luiz Gonzaga e Fagner


Oh! Deus, perdoe este pobre coitado
Que de joelhos rezou um bocado
Pedindo pra chuva cair sem parar

Oh! Deus, será que o senhor se zangou
E só por isso o sol arretirou
Fazendo cair toda a chuva que há
Senhor, eu pedi para o sol se esconder um tiquinho
Pedir pra chover, mas chover de mansinho
Pra ver se nascia uma planta no chão

Oh! Deus, se eu não rezei direito o Senhor me perdoe,
Eu acho que a culpa foi
Desse pobre que nem sabe fazer oração
Meu Deus, perdoe eu encher os meus olhos de água
E ter-lhe pedido cheinho de mágoa

Pro sol inclemente se arretirar
Desculpe eu pedir a toda hora pra chegar o inverno
Desculpe eu pedir para acabar com o inferno
Que sempre queimou o meu Ceará


– O único registro que tenho do parceiro de Gordurinha em ‘Súplica Cearense’, Nelinho, é procedente de um blog, “Dr Zem”, que diz: “A música “Súplica Cearense”, foi criada em um período de muita chuva no Nordeste e, em um programa de TV, onde estavam sendo arrecadados dinheiro e comida para as famílias atingidas. Meu avô (Gordurinha) estava no camarim com Nelinho, e juntos fizeram a música e na mesma hora pediram para apresentá-la”. – carta enviada por Walddeck Luiz Macedo de Souza (Gordurinha Neto). A música é de Nelinho e a letra de Gordurinha.


Fontes:
Dicionário Ricardo Cravo Albin;
Vagalume;
Wikipedia; e
Blog Zem

A MÚSICA DE 1966 – UM MENINO DE MUITO TALENTO

Por José Teles



“Um menino que tem muito talento”, Chico Buarque elogiado por Vinicius de Moraes, numa longa matéria que o Jornal do Brasil dedicou ao poeta em 28 de abril de 1965. No final daquele ano, Chico Buarque (ainda com o “de Holanda” no nome artístico) ratificaria o elogio ao musicar o auto Morte e Vida Severina, de João Cabral de Melo Neto, um poeta que, diz-se, não gostava de música. A estreia aconteceria em dezembro de 1965, mas só engrenaria no início de 1966. Em janeiro, Clarice Lispector assistiu entusiasmada ao espetáculo, e um colunista do JB preconizava um grande futuro para o compositor de 22 anos.

Chico Buarque, na mesma época, criaria, ou adaptaria, a música de outras peças. Uma sobre Galileu Galilei, outra com canções de Brecht, O Inimigo, de Gorki (direção de Zé Celso Martinez) e a infantilO Patinho Preto (existirá registro gravado destas músicas?) . Numa época em que Wesley Safadão é o ídolo da juventude brasileira, parece surreal, mas os estudantes de universidades e colégios católicos de São Paulo não foram às aulas para receber no aeroporto de Congonhas o vitorioso elenco do TUCA (Teatro da Universidade Católica), que voltava da França, depois de ganhar um prêmio com Morte e Vida Severina.

Parecia chegada de seleção campeã do mundo. O elenco foi recebido por uma multidão com faixas ,Hino Nacional, polícia para evitar tumulto. Chico Buarque de Holanda foi carregado nos braços pelos estudantes (que fizeram o mesmo com o diretor Sidnei Siqueira). A premiação de Morte e Vida Severina no festival em Nice, na França, jogou os holofotes sobre o segundo compositor mais elogiado da segunda geração da bossa nova.

Atrás de Edu Lobo, vencedor do primeiro festival importante da música popular no Brasil, o da TV Excelsior, em 1965, com Arrastão, em parceria com Vinicius de Moraes. O JB deu metade de página a Chico Buarque, descobrindo que ele já era o mais gravado da turma. Não se prestara ainda atenção, mas ele já legara à MPB (sigla que começaria a ser empregada naquele ano), alguns clássicos: Olê Olá, Pedro Pedreiro, Meu Refrão, A Rita, Juca, Madalena Foi Pro Mar.

Em 1966, a censura adormecida da ditadura militar despertou. Proibiu a execução pública de Tamandaré, música do repertório do show Meu Refrão, que Chico Buarque de Holanda ia estrear com Odete Lara e o MPB-4, na boate Arpége, no Rio. A proibição atribuída à ofensa contra o Almirante Tamandaré (cujo rosto era estampado na cédula de 1 cruzeiro) e, por conseguinte, à Marinha Brasileira, da qual era o Patrono. Odete Lara tinha acabando de lançar a música em compacto, pela Elenco. Os discos, seis unidades, foram apreendidos. Chico Buarque foi à redação do JB se queixar da censura. Nem sabia o que teria que suportar na década seguinte.

Então veio A Banda. Em outubro de 1966, anunciavam-se as finalistas do II Festival da Música Popular Brasileira, agora na TV Record. Na final, deu empate entre A Banda, de Chico Buarque, e Disparada, de Geraldo Vandré e Théo de Barros. Depois se soube que Chico, por considerar queDisparada era melhor que A Banda, exigiu o empate. Há 50 anos, o país inteiro começou a cantar A Banda. Não foi apenas mais um sucesso, foi um fenômeno, destes que acontecem de meio em meio século. Uma marchinha simples, de letra singela, foi gravada e regravada no Brasil (e logo no exterior), e tornou Chico Buarque, por algum tempo, a “única unanimidade nacional”, no dizer do futuro desafeto Millor Fernandes.

No Recife, Hélder Câmara ocupou um programa inteiro de TV discorrendo sobre A Banda, cujos compactos, mal chegaram nas lojas e logo se esgotaram, como aconteceu no Brasil inteiro. Maestros apelavam a Chico Buarque para salvar ele ajudasse a salvar as bandinhas de interior; agentes da polícia usaram um compacto de A Banda para atrair, e dar um flagra, em uma bicheira em BH que queria comprar o disco; padres e freiras em São Paulo aprenderam a cantar a marcha para ficar a par do gosto da juventude; e sociólogos dissecavam a composição.

A música de Chico Buarque de Holanda contaminou todos os segmentos da sociedade brasileira. A troca de guarda no Palácio do Planalto, por exemplo. passou a acontecer ao som de A Banda, o mesmo acontecendo no Ministério da Guerra, durante a troca de guarda dos Dragões da Independência. Aos 22 anos, Chico Buarque foi convidado para dar um depoimento sobre sua vida ao recém-inaugurado Museu da Imagem e do Som, do Rio.

Em novembro, Chico Buarque de Holanda, o primeiro LP do artista mais festejado do país chegava às lojas, com selo da RGE. Numa tarde de autógrafos no Largo da Carioca, Centro do Rio, ele assinou 150 álbuns. Não assinou mais porque a loja ficou sem discos. Só o compacto da música lançado com Nara Leão deve ter passado a barreira do 1 milhão de cópias. As fábricas trabalhavam apenas paraA Banda que todo mundo queria gravar. O que levou a RGE a abrir mão da exclusividade sobre a música, liberando-o para quem quisesse gravá-la.

“Minas Mobiliza 4 batedores, 35 guardas e 7 bandas para Ver Chico Buarque Passar”, título da matéria do JB sobre a primeira visita de Chico à Belo Horizonte, onde cantou para um público de 50 mil pessoas. A Melhor Música do Ano de 1966, no entanto, não foi A Banda, mas Olê Olá, de Chico Buarque (claro), que também levou um precoce prêmio pelo Conjunto da Obra.

Para encerrar 2016, Chico Buarque de Holanda, lançado em novembro, foi considerado o melhor LP do ano: “A maior virtude do disco é o repértorio. Um senhor repertório. Através dele, Chico Buarque conseguiu não apenas ser o maior compositor do ano, mas produzir uma obra, – de apenas três anos – que dificilmente será superada por outro autor da sua idade”, trecho da crítica de Juvenal Portella, no JB, ao LP Chico Buarque de Holanda, ao qual deu nota dez.

Confiram Chico Buarque, no Festival da TV REcord, apresentando A Banda:

MUITO ALÉM DO LP

Por Vitor Nuzzi
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Coleção e manutenção

Nos últimos anos, lojas de departamentos vêm assimilando a presença do vinil no mercado e oferecendo novos aparelhos com toca-discos. Alguns mesclam MP3, múltiplos CDs e vinil, mas podem apresentar mau funcionamento. O preço de um disco novo gira em torno dos R$ 70, podendo alcançar até R$ 300 em edições limitadas.

Uma das marcas de aparelhos clássicos, reconhecida pela qualidade, a Technics, vai retomar a produção de vitrolas. A parceria com a Panasonic foi divulgada no ano passado, com os dizeres: “O tempo passou, você cresceu, mas a profunda paixão continua em você”.

Picapes profissionais, utilizadas por Djs, podem chegar a R$ 10 mil. Mas é possível encontrar aparelhos usados, ou até mesmo consertar algum que esteja no fundo do armário. A Rua dos Andradas, na região da Santa Ifigênia, centro de São Paulo, concentra um número considerável de lojas de aparelhos antigos que também realizam manutenção técnica.

Já comprar discos é tarefa mais fácil. Apesar do aumento nos valores das “bolachas” nos últimos anos, garimpar em sebos pode render achados. No centro, há uma concentração de lojas com LPs selecionados e alta qualidade. Muitos sebos ainda compram discos usados, e os valores variam conforme a raridade e qualidade. Para quem deseja começar, ampliar a sua coleção ou comprar um bom toca-discos, a reportagem selecionou algumas opções, em São Paulo (todas na região central) e outras cidades. 

São Paulo

Vitrolas

Audio Line Rua dos Andradas, 433, Santa Ifigênia. Com um grande número de vitrolas antigas e boas opções para caixas de som. Os valores começam a partir de R$ 400, por um toca-discos funcionando e já com agulha.

J&J Áudio e Vídeo Rua dos Gusmões, 282, esquina com Rua dos Andradas. Vende aparelhos de R$ 850 até profissionais, ou com design mais rebuscado, por R$ 5.500 e faz manutenção geral de vitrolas.

Catodi, Casa dos Toca Discos Rua Santa Ifigênia, 398. Serviços em assistência técnica, venda de peças, como agulhas, que variam de R$ 50 a R$ 150. A loja ainda oferece vitrolas novas importadas e modelos reformados.

Discos

Big Papa Records Galeria Nova Barão, loja 30, Rua 7 de Abril, 154, República. O segundo andar da galeria é repleto de lojas com discos selecionados. A Big Papa, por exemplo, é especializada em jazz, black e rock.

Baratos e Afins Galeria do Rock, lojas 314 e 318, Avenida São João, 439. Fundada em 1978, é uma das lojas mais tradicionais da cidade. Funciona também como produtora independente, parceria do dono Luiz Calanca com o ex-Mutantes Arnaldo Baptista.

Casarão do Vinil Rua dos Trilhos, 1.219, Mooca. Ao lado do centro, a casa acaba de promover discos de vinil icônicos do rock nacional que completaram 30 anos em 2015, como Cazuza, Ira!, Kid Abelha, Titãs. O espaço informa ter mais de 700 mil discos de vinil em acervo.

Extreme Noise Discos Galeria Nova Barão, loja 36. Coleciona raridades, com forte no hardcore, punk, trash, grindcore, noise, entre outros gêneros mais barulhentos.

Garimpo Cultural Galeria Nova Barão, loja 35. Com grande coleção de discos, ótimo lugar para garimpar, além de discos, livros e quadrinhos.

Sebo do Messias Praça João Mendes, 140, centro. Aberto desde 1970, este sebo se vangloria de ser o maior da capital. Com grande acervo de livros, as páginas dividem o espaço com discos variados, alguns raros e de qualidade para quem gosta de garimpar.


Outras cidades

O blog De Volta para o Vinil oferece um ampla lista com mais de 30 pontos de venda de discos, uma dezena de casas de peças e manutenção de aparelhos e até do bom e velho plástico para proteger o bolachão.

O engenheiro de softwares Cristiano Grimaldi, que se define como “colecionador aficcionado” de discos, elaborou uma lista de 19 pontos de venda na capital fluminense, dos mais diversos gêneros.

O site Bazar em BH tem um seção de indicações de lojas e sebos que trabalham com os mais diversos estilos musicais, predominantemente antigos e usados. A página é repleta de links de anúncios no decorrer do texto que atrasam a vida do leitor. Melhor passar batido pelos links e ir direto à lista de lojas.

Brasília
A Musical Center tem acervo de 8 mil discos (215 norte, bloco C, loja 34, 61 3274-0763). A Acervo, também na Asa Norte (215N, bloco B, loja 9, 61 3033-7808) trabalha com raridades, inclusive de bandas do DF. Lojas da Livraria Cultura dos shoppings Casapark (Guará) e Iguatemi (Lago Norte) têm lançamentos. A Pro Vinil (Setor de Diversões Sul, Edifício Miguel Badya, loja 35, 61 3224-3599) é especializada em hip hop e rap.

O site do Diário de Pernambuco tem uma lista detalhada com uma dezena de lojas que trabalham com antigos, raridade e lançamentos.

sexta-feira, 29 de abril de 2016

CANÇÕES DE XICO



HISTÓRIA DE MINHAS MÚSICAS – 19


OCEANO DO QUERER

Uma de minhas músicas que mais gosto e isso se deve, certamente, à interpretações magistrais que lhe foram dadas por Dominguinhos/Irah Caldeira e Jorge de Altinho, dentre outros. É uma das várias parcerias que tenho com Maria Dapaz, compositora da melhor qualidade, pernambucana, radicada em São Paulo, com passagens pela Europa. Oceano do Querer foi gravada inicialmente por Jorge de Altinho, vindo a ser regravada 11 vezes, por gente como Geraldinho Lins, Trio Sabiá (SP), Ébano Nunes e Território Nordestino, dentre outros. A versão que ilustra a coluna é a originalmente registrada em nosso FORROBOXOTE 4 – CANTADORES DA NAÇÃO DE SEU LUIZ, com Jorge de Altinho.


OCEANO DO QUERER 
Xico Bizerra e Maria Dapaz

nas veredas do desejo tropecei no teu abraço
e o laço da paixão apertou meu peito inteiro
prisioneiro dentro dessa armadilha
tornei-me ilha no oceano do querer

afundei minha querença nas profundas do teu mar
e te amar passou a ser o verbo ser
ao te ver me perdi em tua areia
e na peleia naufraguei em teu viver

e tome abraço, tome afago, tome cheiro, tome dengo, tome beijo como ninguém te beijou
e tome trela, sem querela, a noite inteira, tome tanta brincadeira, tome um monte de amor

naveguei por sete mares, tantas luas
pelas ruas dessa vida nas esquinas coloridas da ilusão
meu coração, feito menino pequeno
fez-te um aceno e encontrou teu abraçar

no silêncio de um carinho te entreguei o meu amor
e uma flor desabrochou dentro de mim
no jardim fez-se festa verdadeira
doce colheita de um bem-querer sem fim

e tome abraço, tome afago, tome cheiro, tome dengo, tome beijo como ninguém te beijou
e tome trela, sem querela, a noite inteira, tome tanta brincadeira, tome um monte de amor

DO ROCK AO MANGUEBEAT, PELO MENOS 18 DISCOS PERNAMBUCANOS CHEGAM AO MERCADO EM 2016

Di Melo, Clarice Falcão, Bongar e Nação Zumbi estão na lista de artistas locais cujos projetos ganham as prateleiras neste ano

Por Larissa Lins 


Di Melo, Tagore, Isadora Melo, Clarice Falcão e o Grupo Bongar têm discos recém-lançados ou em fase de finalização. Fotos: Divulgação oficial (Di Melo), Flora Pimentel (Isadora Melo), Facebook/Reprodução (Tagore, Clarice e Bongar) 


Passeando pelas ruas de Amsterdã, na Holanda, o pernambucano Roberto de Melo Santos, Di Melo, decidiu garimpar discos para a coleção que mantém em São Paulo, onde vive desde a década de 1960. Encontrou, para a própria surpresa, dois exemplares do vinil homônimo lançado por ele no Brasil em 1975: um deles, avariado, tinha preço fixado em 350 euros, enquanto o outro, conservado, custava o dobro.

“Aquilo era muito valioso. Foi então que decidi: eu precisava voltar à ativa, criar uma plataforma poderosa e propagar minha música outra vez”, lembra Di Melo, que lança neste ano o segundo álbum oficial da carreira, após 40 anos afastado da indústria fonográfica. Nesse intervalo, produziu mais de dez discos informais, comercializados por ele ao fim dos shows. Mas somente agora volta a integrar o calendário formal de lançamentos, enriquecido neste ano por cerca de 20 álbuns de artistas pernambucanos. O financiamento colaborativo, a antecipação de singles em plataforma digital e o intercâmbio entre conterrâneos marcam a safra, na qual O imorrível figura como principal elemento surpresa para o público. 

Segundo Di Melo, o novo disco marca retorno ao círculo produtivo iluminado pelos holofotes. “Tenho mais 400 músicas inéditas, 100 delas gravadas. São composições em homenagem a Chico Buarque, a Elis Regina, a personalidades da MPB. Tenho, ainda, 12 canções em parceria com Geraldo Vandré, também inéditas, além de músicas com Wando, com Baden Powell”, lista o pernambucano, que apresentou O imorrível - com participação da baiana Larissa Luz, do paulistano Dexter e do também pernambucano Otto - no último dia 27, em São Paulo. A capital paulista também foi escolhida pelo conterrâneo Tagore para o show de lançamento de Pineal - o sucessor de seu primeiro disco, Movido a vapor (2014) - previsto para maio. A despeito do local de estreia das turnês, O imorrível e Pineal foram gravados no Recife. O primeiro, no estúdio Casona, com produção de Pedro Diniz. O segundo, em estúdio caseiro montado no apartamento de Tagore Suassuna, na Zona Sul da capital pernambucana. 

O vínculo com a terra natal marca a safra de lançamentos prevista para este ano e se desdobra nos temas dos álbuns, que além de amores, paixões e desejos latentes, versa sobre o cotidiano das grandes cidades. “Em Pineal, inspirado na glândula que temos no centro do cérebro, as letras exploram críticas sociopolíticas, pontos de vista cotidianos, sempre pelo prisma de uma figura sensível”, explica Tagore. E a pernambucana Clarice Mendes, vocalista da Bande Dessinée, ecoa: “Mergulhamos nas questões cotidianas, tanto estéticas quanto sociais.” O grupo apresenta Destemida no Recife no dia 7 de abril, e antecipou o primeiro single, que dá nome ao disco, no último dia 19, com videoclipe estrelado pela atriz Ceronha Pontes e dirigido por Pedro Toscano. 

A estratégia de divulgação a conta-gotas, com clipes e áudios disponibilizados gratuitamente nas plataformas digitais, é compartilhada por outros pernambucanos, como Aninha Martins (que antecipou Útero, faixa de Esquartejada), Clarice Falcão (que divulgou Irônico, do repertório de Problema meu) e Tibério Azul (que, nos próximos dias, lança o primeiro single de Líquido). O imorrível, de Di Melo, foi além: está disponível na íntegra na internet, por streaming, desde novembro passado. Em casos de financiamento colaborativo, como nos discos da Mamelungos e da Dessinée, previstos para este semestre, a tática ajuda a apresentar ao público o novo projeto, aumentando o alcance dos discos ainda incubados e, com isso, angariando contribuições.

PINEAL, Tagore Suassuna 
Previsão de lançamento: maio

Com título inspirado na glândula localizada no cérebro humano, Pineal tem lançamento previsto para maio, e compila 12 faixas gravadas em estúdio caseiro, no Recife, em seis meses de produção. “Teoricamente, essa glândula seria responsável por todas as nossas conexões extra-sensoriais, ou ‘mediúnicas.’ Resolvi homenagear esse órgão, que em diversas culturas foi representado como nosso Terceiro Olho”, diz Tagore. Os temas vão do amor às críticas sociais. Há participações de Benke Ferraz (Boogarins, Luziluzia e Benkes) e Fernando Almeida (Boogarins). 


ESPERANDO A VOLTA DO MECENAS (título provisório), Matheus Torreão
Previsão de lançamento: segundo semestre

O título provisório antecipa o projeto que ganha campanha de financiamento colaborativo em abril. Dois singles foram gravados: Adeus, meu rock’n’roll e Frevo da aposentadoria. A banda carioca Exército de Bebês acompanha Matheus no disco, que terá 11 faixas, incluindo A volta do Mecenas. “As faixas têm em comum o senso de humor, um sentimento de frustração em relação ao mundo. Eu gosto de tentar achar graça da infelicidade”, conta o músico. 


O IMORRÍVEL, Di Melo
Lançamento: fevereiro

“Estou na minha melhor fase. Esse disco é coisa de Deus, dos anjos, arcanjos, poderes teleguiados”, diz o músico Di Melo sobre o segundo álbum formal de inéditas da carreira, após hiato de 40 anos. O título O imorrível se inspira no documentário homônimo de Alan Oliveira e Rubens Pássaro. O novo álbum tem participação de B. Negão (na faixa Diurno) e de Larissa Luz (em Milagre), além de composição em parceria com Geraldo Vandré. Está disponível na internet e ganha formato físico com turnê de lançamento, iniciada em São Paulo. 


SAMBA DE GIRA, Grupo Bongar
Previsão de lançamento: junho

Gravado com estúdio móvel montado em terreiro, com autorização extraordinária das entidades espirituais, Samba de gira reúne 22 faixas, entre composições autorais e pontos do candomblé. “Gira significa reunião de seres de diferentes dimensões. Há letras que escrevi e ensinei as entidades a cantarem. É algo inédito”, relata Guitinho de Xambá. Siba, Maciel Salu e Juliano Holanda estão entre os convidados especiais. O álbum homenageia as tradições da jurema e as raízes africanas. 


DESTEMIDA, Bande Dessinée
Lançamento: março

O single que dá nome ao novo disco foi lançado no último dia 19, no Youtube e nas plataformas de streaming Deezer, iTunes e Spotify. A partir de perspectiva feminina, o clipe, dirigido por Pedro Toscano e estrelado por Ceronha Pontes, explora o instinto de libertação e de encontro consigo mesmo, uma das tônicas do álbum. Segundo a vocalista, Clarice Mendes, o disco aborda temáticas sociais, cotidianas e o processo de amadurecimento vivido pelos integrantes da banda. Destemida entra em pré-venda no Kickante em março, a fim de ser viabilizado por financiamento colaborativo. O primeiro show ocorre no Recife, em abril.


LÍQUIDO - OU A VIDA PEDE MAIS ABRAÇO QUE RAZÃO, Tibério Azul
Previsão de lançamento: primeiro semestre

Segundo álbum de uma quadrilogia inspirada nos elementos da natureza, Líquido ou a vida pede mais abraço que razão tem a água como protagonista. “Terá, provavelmente, dez faixas. Ainda estou negociando as participações especiais”, conta Tibério, que reúne apenas composições autorais e inéditas no projeto. Um single será lançado antes do disco, em fase final de gravação. “Mergulhei no universo da água, sem confronto, ligado ao todo.”


SEMPRE AO VIVO (título provisório), Walter Areia
Previsão de lançamento: abril

Gravado por Areia e Grupo de Música Aberta, o disco revisita o repertório lançado no ano passado em formato de DVD. Com título provisório Sempre ao vivo, remete ao método de gravação do grupo, que reúne todos os músicos ao mesmo tempo em estúdio, tendo por característica o improviso. Com seis faixas, o álbum terá formato físico e digital, sem participações especiais. Teus pés e Hora de ir são inéditas, enquanto as demais são releituras do primeiro CD, Para perdedores. 


ESPAÇO-TEMPO, Juliano Holanda
Previsão de lançamento: abril

Compositor conhecido nacionalmente ao assinar a trilha sonora da série Amorteamo, Juliano Holanda lança vinil compacto (duas faixas) em abril. A autoral A arte de ser invisível e Em seu lugar (parceria com Zé Manoel) ganharão tiragem inicial de 450 exemplares. Esse é o terceiro projeto lançado por ele no mercado, após A arte de ser invisível (2013) e Pra saber ser nuvem de cimento quando o céu for de concreto (2013). 


VENDE-SE, Jr. Black
Previsão de lançamento: julho

O segundo disco solo de Jr. Black reúne nove composições autorais, com produção de Juliano Holanda e Yuri Queiroga. Classificado pelo músico como um disco confessional, Vende-se explora narrativas urbanas, metropolitanas. “Entendo a arte como ato político. Meu desejo é falar sobre aquilo que ninguém falar”, explica Jr. Black, cujo projeto busca retratar as glórias e frustrações de um artista numa cidade em processo de destruição e reconstrução - “onde tudo parece estar à venda.”


PROBLEMA MEU, Clarice Falcão
Lançamento: fevereiro

O show de estreia da turnê Problema meu ocorre no Recife, no dia 18 de março. O álbum, porém, foi disponibilizado na íntegra no último dia 19. A faixa Irônico foi antecipada por Clarice Falcão, que deixou o canal humorístico Porta dos Fundos para se dedicar à música, por streaming, após o carnaval - foi gravada durante a folia de Momo, explorando ritos carnavalescos, blocos e a rotina da cantora nesse período. Ao contrário de Monomania, disco de estreia, Problema meu explora sentimentos diversos, do amor à raiva. Segundo a artista, dessa vez os ‘eu líricos’ variam mais. 


VESTUÁRIO, Isadora Melo
Previsão de lançamento: primeiro semestre

O álbum de estreia da pernambucana Isadora Melo, com produção de Juliano Holanda, parceiro musical da artista. Rafael Marques (bandolim), Júlio César (acordeon) e Walter Areia (baixo acústico) participam do disco, gravado em processo analógico no qual todos tocaram ao vivo, simultaneamente. O maestro Jaques Morelenbaum é uma das participações especiais. Partilha (Juliano Holanda) e Braseiro (Juliano e Júlio Holanda) estão no repertório, que também inclui composições de Zé Manoel, Hugo Lins, Caio Lima (Banda Rua) e Clara Simas. 


DESEMPENA, Almério
Previsão de lançamento: segundo semestre

Como o nome sugere, Almério propõe consertar o que está torto, em 11 faixas - sete autorais e quatro de compositores parceiros. “É sobre a esperança, a vontade de desentortar o torto com a minha poesia. Sobre o homem que atravessa todos os dias marés de estímulos, propagandas, notícias sangrentas, bips, enganos, solidão”, conta. O álbum será patrocinado pelo Natura Musical e terá shows de lançamento no Recife e em Caruaru. “Quero que minha música diga: ei, irmão, ‘tamo’ junto!”, completa.


ESSE É O NOSSO MUNDO, Mamelungos
Previsão de lançamento: primeiro semestre

Após quase seis anos sem lançar disco, a Mamelungos selecionou 11 músicas autorais para Esse é o nosso mundo, em pré-venda no Kickante, no qual o grupo arrecadou R$ 13,4 mil dos R$ 45 mil pretendidos. “O disco não tem um estilo definido, não pode ser chamado de rock, reggae ou pop. Segue a linha da nova MPB”, explica Thiago Hoover, vocalista e guitarrista. As músicas falam do autoconhecimento, dos impactos da mudança dos pernambucanos para São Paulo. O conterrâneo China assina a produção. O single Varanda, primeiro clipe da banda, já foi divulgado na internet. 


NAÇÃO ZUMBI, Nação Zumbi
Lançamento: segundo semestre

No ano em que celebra 20 anos de lançamento do álbum Afrociberdelia, o grupo anunciou os planos de gravar novo disco de estúdio em 2016. O sucessor de Nação Zumbi (2014) dará continuidade ao repertório manguebeat iniciado na década de 1990. Em entrevistas, os integrantes já declararam ter material inédito em fase de seleção. Eles ainda pretendem lançar, este ano, a gravação de um show feito com Chico Sicence no festival de Montreux, na Suíça, em 1995.


ESQUARTEJADA, Aninha Martins
Previsão de lançamento: maio

Uma compilação de 13 letras assinadas por parceiros como Caio Lima, Karla Linck e Hugo Coutinho, além de duas composições dela com Vinícius Paz, compõe o primeiro disco de Aninha Martins (ex-Sabiá Sensível), Esquartejada. Além do single Útero, já lançado, Queda punk deve ganhar a rede nos próximos dias. O disco entrará em pré-venda no início de março, após sete meses de pré-produção. “A ideia é lançar o disco no Recife, numa plataforma em algum teatro, mas ainda não temos data, nem local definido”, conta Aninha, que define o álbum como um passeio do country ao heavy metal. 


CIRCULAR MOVIMENTO, Banda Marsa
Previsão de lançamento: maio

Em 11 faixas autorais, a Banda Marsa canta crônicas do cotidiano, fala sobre desamores, dores e paixões. O poeta Gleidson Nascimento e os parceiros musicais Igor de Carvalho e Danilo Melo colaboram com as letras. Foram oito meses de produção para o disco de estreia da banda, que venceu o Festival Pré-AMP no ano passado. “O álbum faz parte da premiação, que incluiu, ainda, shows no carnaval e no Festival de Inverno de Garanhuns de 2015”, explica Rodrigo Samico, guitarrista. 


LUCAS DOS PRAZERES (título provisório), Lucas dos Prazeres
Previsão de lançamento: segundo semestre

O primeiro disco solo de Lucas dos Prazeres deve ser produzido e lançado no segundo semestre deste ano. Além do lançamento do DVD Repercutir, gravado com a Orquestra dos Prazeres, o cantor e percussionista pretende conciliar as gravações do álbum com o espetáculo teatral Traçado, inspirado na própria carreira. “Será a primeira vez que vou dar protagonismo aos vocais”, explica. Homenagens a compositores negros como Gilberto Gil, Djavan e Jorge Ben Jor, já presentes em Repercutir, devem compor o repertório. 


QUEM DISSE, Victor Camarote
Previsão de lançamento: primeiro semestre

Em 12 faixas, além de bônus com versão acústica da música que dá nome ao álbum, Victor Camarote faz parceria com conterrâneos como Bruno Lins (Fim de Feira), Tiné (Orquestra Contemporânea de Olinda e Academia da Berlinda), Maestro Spok, Zé Manoel e China. Amores, paixões, desencontros e cenas do cotidiano dão a tônica do disco, o primeiro solo do músico, em fase de finalização.

CHIQUITO BRAGA, 80 ANOS



IDENTIFICAÇÃO

Nome, data e local de nascimento

Meu nome é Francisco Andrade Braga. Nasci em Belo Horizonte, 19 de março de 1936.

Família
Nome e descrição da atividade dos pais
José Raimundo Braga e Maria de Andrade Farias. Meu pai era militar, ele era conhecido como reformado da polícia militar. Minha mãe é doméstica mesmo, de casa mesmo.


LOCALIDADES DE BELO HORIZONTE

Pedro II

Eu sou do bairro Pedro II, nascido e criado, Rua Manhumirim. Belo Horizonte na minha infância era espetacular, tranqüilo. A Avenida D. Pedro II, por exemplo: ali você pescava, pegava saracura, e outros bichos. Saracura é aquela ave aquática, não é? Pegava aquilo, levava para casa os filhotinhos e a minha mãe no outro dia levava e botava na lagoa. Tudo isso ali na Manhumirim na esquina com a D. Pedro II. Eu só morei lá e no Carlos Prates, na Rua Pomba.


Iniciação Musical

Primeiros acordes
Meu pai era músico também, tocava violão e eu tocava com ele. Eu aprendi a tocar, mais ou menos com ele. Ele me ensinou um acordezinho, o resto foi por mim mesmo. E tinha o meu irmão que era violonista profissional, ele morreu com 21 anos, era o Daniel Braga, muito famoso na época, morreu em 1948, era garoto ainda.


INFÂNCIA

Músicas da infância

Eu ouvia chorinho, ouvia Waldir Azevedo, Jacob do Bandolim, e ouvia também nas rádios muita música erudita, musica clássica, e eu gostava, essa aí eu ouvia, a que eu mais ouvia, a que eu mais gostava, a chamada música clássica.


Iniciação Musical
Primeiros instrumentos

Eu sou autodidata mesmo, não aprendi com ninguém. Meu pai me ensinou, eu tocava com ele, cresci tocando com ele. Comecei com cavaquinho, depois passei para o violão, a mão cresceu um pouco. Agora tem um outro violão chamado violão quinto, ele ainda dava para mim, mas depois, a minha mão já estava dando para viola maior, aí violão, e me apaixonei pela guitarra elétrica.


Guitarra Elétrica


A minha inspiração para tocar guitarra foi o meu irmão. Ele apareceu com a guitarra elétrica um dia lá em casa, ouvi aquele som e fiquei louco! Eu era garoto, fiquei louco com a guitarra, falei: “Na hora que eu puder vou usar uma guitarra!”.



Profissionalização

Eu começei a tocar guitarra na boate do Cassino da Pampulha, em 1957, mais ou menos. Eu estava com 17 anos nessa época. Aí apareceu uma cantora cubana procurando um guitarrista para abrir um conjunto; fizemos um conjunto e viajei com ela, eu estava com 17 anos. Fomos para o Estado de São Paulo, Paraná, Mato Grosso, em excursão com o conjunto. Apesar de eu ser novinho, a minha família foi super tranquila. A minha mãe era aquelas mineironas mesmo, com o meu pai também, tudo bem. Eles confiavam em mim, achavam que estava tudo bem!

O repertório desse conjunto era mais ou menos de samba e jazz. Aí começamos com o jazz, começamos a improvisar naquela época, já sentindo a necessidade de fazer outras coisas, mudar o violão, mudar a guitarra, o modo de pegar, a pegada. A gente ouvia muita música clássica, muita coisa e tinham muitos acordes, muitas coisas que não se ouvia nas orquestras. Tinha que adaptar para o violão, eu comecei a usar. Comecei a fazer pestana com esse dedo, porque no violão não usa, violão só usa esse, guitarra, eu comecei a fazer com esse, esse, esse dedo, usando todos, usando esse também, para poder dar. Pegava aqui, ajudava com esse, aí comecei a resolver os problemas. Mas é legal!

Depois da orquestra do Cassino eu viajei com a cubana, com a Lia Ray, uma cantora, por Minas, interior, interior de São Paulo, Paraná. Aí eles foram para Montevidéu, eu voltei, era o tempo que eu tinha que servir exército, eu estava com quase 18 anos e tinha que me apresentar no exército, eu voltei.


Aprendizado

Mas não fui para o exército, eu consegui isenção e fui para a polícia militar, fui para o DI, Departamento de Instrução da Polícia. Eu fiquei, aprendi música, leitura de música. Não era a Banda da Polícia, era chamada Escola de Formação Musical da polícia, porque eles formavam ali pessoal para Sinfônica e ensinavam música. Eu estava com 14 anos, mais ou menos, quando aprendi música lá. Na minha turma estava o Nivaldo Ornelas, Benito Juarez, um maestro. Depois, com 17, fui sapateiro também, trabalhei em fabrica de sapato, trabalhei em armazém. Mas aí eu era garoto, eu ia ficar em casa sem fazer nada! Aí eu pegava um troco lá, pegava uma graninha, aí dava. Depois eu fui tocar com Túlio Silva, no conjunto do Túlio, fazíamos bailes.


Ponto dos Músicos

Freqüentei muito o Ponto dos Músicos. Lá eu conheci o Célio Balona, o Dino, o Aécio Flávio, Valtinho, o Pepeto, que era saxofonista, Plínio, pistonista, a turma toda. Nessa época o Ponto funcionava na Avenida Afonso Pena com Rua dos Tupinambás. Eu chegava mais ou menos cinco horas e ali ficava até oito horas, mais ou menos, batendo papo, conversando ali, às vezes contratando gente para os trabalhos. Não havia muitas mulheres naquela época, talvez a Clara Nunes tenha ido lá algumas vezes. Comecei também tocar na Rádio Guarani e na TV Itacolomi. Eu tocava com a Rosana Toledo, cantora muito boa, mora aqui no Rio!


PESSOAS

Wagner Tiso/Pacifico Mascarenhas/Milton Nascimento (Bituca)

Lá no Ponto eu também conheci o Wagner Tiso. O Wagner foi com o Pacífico Mascarenhas, que me apresentou o Wagner e o Bituca. Lembro que nos encontramos, conversamos muito, acho que foi na casa do Pacífico. O Bituca me mostrou umas músicas, eu achei muito bacana as músicas deles, diferentes na época. Estava na época da Bossa Nova e ele veio com uma outra jogada, uma outra coisa, não era bem Bossa Nova, mas era uma outra harmonia, um outro tipo de harmonia, coisa dele, do Wagner, muito bonita, gostava muito!



Paulo Horta/Toninho Horta

Eu tinha mais contato com o Paulo Horta. Paulo eu conheci na UBC, ele era chamado de Paulinho da UBC. Ficamos muito amigos mesmo. Eu tocava, ele também tocava, aí eu já comecei a entrar, conheci o Paulinho, o Pacífico, comecei a conhecer a turma melhor. E o Paulinho, nós fizemos muitas coisas juntos, eu ia para a casa dele, todo o sábado a gente tinha reunião, o Toninho era pequeno, as meninas, a Gilda, a Letícia; a gente tocava, as meninas, a Gilda, a Letícia ficavam lá olhando a gente tocar…
A gente tocava e ele ficava lá com a gente, ele mesmo não tocava não, ele sabia, mas ficava lá só olhando a gente e rindo, o Toninho ficava o tempo todo rindo. Olhava para o Toninho e ele estava rindo!
Mas aí eu vim para o Rio de Janeiro, eu já acompanhava as notícias dele, que ele estava tocando muito bem, o pessoal: “O Toninho está quebrando pau nele, está tocando mesmo! Tá bom mesmo!”.


Mudança para o Rio de Janeiro

Eu vim para o Rio de Janeiro em 1966. Vim sozinho, fui um dos primeiros da safra. Eu vim mais para estudar com o Moacyr Santos. Porque eu conheci o Moacyr em Belo Horizonte, por intermédio do Pacífico Mascarenhas e ficamos amigos. Aí eles: “Acho que vamos lá para o Rio, você tem que ir lá para o Rio.” Ficou falando para eu ir para o Rio. Até que eu resolvi: “Vou lá para estudar com ele!”. A gente começou a tocar na TV Rio, e gravamos em estúdio de gravação. Trabalhava na TV Rio e fazia baile. Tinha uma orquestra muito boa na TV Rio, a Orquestra Arco-Íris, e eu dei sorte, logo peguei essa orquestra, aí começou a abrir tudo, né?
Continuei estudando com o Moacyr, estudando contraponto, fuga, aqueles estudos dele, eu gostava muito, até ele ir para os Estados Unidos, voltar para os Estados Unidos; ele esteve lá uma temporada depois voltou.
Depois vieram os outros mineiros pra cá, veio o Pascoal, veio o Celinho, que é um pistonista, o Celinho Piston, até faleceu tem pouco tempo; depois o Wagner Tiso, Helvius Vilela, quem mais… Acho que é só!



FESTIVAIS/PESSOAS

Taiguara

Eu estive em Festival de Música com o Taiguara, várias vezes com o Taiguara e eu tocava na orquestra também, na Globo, de vez em quando, não era fixo na orquestra, mas de vez em quando eu substituía lá no festival, eu andei fazendo uns dois com a orquestra, mas com conjunto foi só com Taiguara.


Som Imaginário
Eu gravei A Matança do Porco com o Som Imaginário. Eu andei fazendo uns trabalhos com eles também! Fora da gravação, o Fredera, o guitarrista saiu, o Wagner me chamou para fazer umas coisas e eu falei: “Ah, beleza!”. Fiz shows no interior de Minas com eles, aqui nós tocamos algumas vezes, Som Imaginário, aí depois acabou, era o Luiz Alves, o Robertinho Silva. Fizemos uma gravação muito boa, Matança do Porco foi uma gravação muito boa, um disco antológico. Tem uns solos de guitarra loucos, não é?

Lincoln Mazala
Teve um violonista que eu admirei muito, Lincoln Mazala. Ele era um grande violonista, esteve aqui no Rio alguns anos, depois voltou para Minas. O pessoal não conheceu, o Toninho conheceu, o Paulinho também, mas o Lincoln era muito, não se misturava, mas ficou muito meu amigo! Nós ficamos muito amigos, esse grande violonista, esquecido, porque o pessoal não fala nele. Inclusive eu tenho influência dele, já tocamos, Lincoln era incrível. Eu vi e gostei muito do Lincoln, achei um cara super, ele conviveu muito com o Garoto aqui no Rio, Garoto do violão, e ele foi para Belo Horizonte. Eu vi o Garoto, vi ele fazendo aquelas coisas que o Garoto fazia também, falei: “Ah, legal!”, e ficamos amigos, ele gostava muito de mim e falava: “Chiquito, o que você vai fazer no Rio que eu não fiz?”, ele falava assim mesmo.

Rio de Janeiro
Eu gravei com todo mundo, conheço quase todas aí… Na chegada aqui no Rio de Janeiro foi na Orquestra, os músicos começaram a me chamar, eu comecei a estudar com o Moacyr Santos e isso deu um certo prestígio, o Moacyr é um músico de muito prestígio aqui no Rio. Aí o pessoal sabia que eu estava estudando com ele, ele gostava muito de mim e me chamava para gravar; gravava com umas cantoras: “Não, porque eu vou fazer uma banda, fazer um conjunto aí!”, perguntava se eu estava a fim e eu: “Tá legal!” Deu certo, trabalhei muito com a Maria Bethânia, com a Gal Costa, Taiguara. Fafá de Belém foi a que eu mais trabalhei. Também toquei com o Sérgio Ricardo lá em Belo horizonte mesmo; toquei com ele lá, o Sérgio é muito meu amigo! Foi com Tito Madi, Sérgio Ricardo, Agostinho dos Santos. Agora a primeira que eu trabalhei foi Elizeth Cardoso, eu morava em Belo Horizonte, ela soube de mim e me mandou chamar para eu fazer uma viajem para o Uruguai, foi pela primeira vez.



Festival Internacional da Canção

Milton Nascimento
Quando eu vi o Milton aqui no festival eu achei uma maravilha, umas músicas lindas. Achei uma beleza! Oba, Minas está aparecendo aí! E teve muito impacto no meio dos músicos, porque o Milton mudou muitas coisas na música brasileira, na harmonia, por exemplo. Porque eles tinham aquele tipo de harmonia como o Tom Jobim, altas harmonias, mas o Milton veio com outra jogada, aquela jogada lá nossa de Minas, porque a harmonia lá é diferente.

Música mineira
Influência da música mineira é nossa mesmo, não sei, tem alguma coisa, criamos alguma coisa também. Outro dia eu estava até numa entrevista e falei que a música mineira tem uma coisa a ver com o impressionismo francês, aquela coisa do Debussy, Ravel, tem muito a ver. Eu falo isso aí, os caras analisam e é isso aí. Porque analisando mesmo a música, tem. Agora porquê, eu não sei. Quando eu era criança eu gostava muito de Ravel, era o meu ídolo, eu gostava das músicas dele e não sabia que era Ravel, porque eu não conhecia! Adora as músicas do Ravel, depois que eu vim saber que era Ravel!



CLUBE DA ESQUINA

Avaliação

Também é isso que eu estou falando, é aquela coisa lá de Minas, né? Tem uma coisa misteriosa lá em Minas, tem um negócio muito estranho com a música. Não acho que tenha alguma coisa a ver com Rock. O Rock até atrasou a música mineira na minha opinião. Embora o Lô Borges tenha influência de Beatles, a harmonia é mineira. A harmonia do Lô é muito mais evoluída. Porque Rock não é harmonia, Rock é dança. Eu encaro Rock como dança, para dançar agora, para você curtir mesmo. Agora o Lô, uma beleza com aquela harmonia dele, mas aquela harmonia é lá de Minas. Não acho que o Clube da Esquina tenha sido um movimento musical. Por exemplo, aqui no Rio, mesmo, não. Porque os mineiros dão muito valor à harmonia, mas não é do Clube da Esquina, não é, é da coisa mineira. O Clube da Esquina é um marco, mas não é… Porque é um negocio anterior ao Clube da Esquina, o negócio é bem de antes. Eu gosto muita da musica “Clube da Esquina”, aquela eu gosto muito!
O Clube da Esquina influenciou muito outros músicos por intermédio do Toninho Horta. Porque o Toninho que divulgou. Ele é talvez o mineiro mais conhecido, a gente avançou muito mesmo nesse negócio de harmonia com o Toninho.



DISCOS

Quadros Modernos

A primeira vez que eu gravei com o Toninho Horta foi em um disco da Fafá de Belém; teve uma musica que nós gravamos, só eu e ele. Agora recentemente eu gravei em Belo Horizonte com ele e o Nivaldo Ornelas. O Nivaldo chamou: “Pô, a gente precisa fazer esse negócio aí!”, “Então vamos!”. Com os três violões, a Escola Mineira de Violões e agora saiu o DVD, né? Tem também o Beto Lopes, o seu irmão Wilson, está a turma toda lá. O DVD está bonito mesmo! No repertório tem uma música minha, “A lenda do cavalo dourado”, nome curioso, né? Mas é por causa de um cavalo que eu tenho lá em casa, um cavalo meio misterioso. Fiz uma música, primeiro o nome e depois que eu fiz a música. Eu componho desde novinho. Estudei composição, harmonia, mas eu não mostrava as minhas músicas. Agora que eu estou mostrando, esse disco foi o primeiro. Inclusive as músicas que eu fiz, foi por causa disso! Era timidez, eu ficava com vergonha e achava que não eram muito bacanas. Porque eu fazia mais como base de estudo, mas aí as pessoas começaram a gostar, e eu: “Então está bom!”. Mas, agora, inclusive tem uma música que uma amiga minha botou uma letra, a Kate Lira, filha do Carlinhos Lira. Ela gravou o CD com letra. Eu estou gostando, gostando das músicas!



Clube da Esquina
Museu
Acho que tem que continuar a fazer essas coisas todas que estão fazendo, cada vez divulgando mais o Clube da Esquina, inclusive aqui para o Rio, para São Paulo. O negocio é divulgação, porque o trabalho está tudo certo! Clube da Esquina é maravilhoso, está tudo certo, agora é só divulgar! Porque ali é musica de Minas, agora é divulgar. Eu acho isso ótimo, uma beleza! Muito bom. É uma pena que na época eu não morava lá, então não fui do Clube da Esquina, se eu morasse lá, estaria com o pessoal, na época eu estava aqui no Rio. A única coisa que eu desejo é felicidade e divulgação do Clube da Esquina, ele merece!

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