sábado, 30 de julho de 2016

ANTÔNIO RAGO, 100 ANOS

Por Gilson Antunes




Antonio Rago foi não apenas um dos mais ativos e importantes violonistas da história da música brasileira, mas também um dos últimos representantes da era de ouro do rádio no Brasil, sendo um dos introdutores do violão elétrico no país e um dos inovadores do regional instrumental.

Rago foi também um dos poucos violonistas a escrever uma importante autobiografia, na qual narra quase um século de suas aventuras e desventuras no meio musical. Presenciou o violão solo paulista praticamente desde o início. Seu primeiro ídolo foi Américo Jacomino (Canhoto), que ouvia no rádio quando este ainda era vivo. Assim como Canhoto, Rago era filho de imigrantes italianos que vieram ao Brasil tentar a sorte no início do século 20.

Em 1924, com apenas 8 anos de idade, ouviu pela primeira vez um violão, tocado por um cunhado que estava vivendo temporariamente em sua residência – no tradicional bairro do Bixiga – por causa das revoltas políticas paulistas. A partir daí começou a estudar violão com o sapateiro e professor Rafael Fezza e nunca mais largou o instrumento. Estudou em seguida violão clássico com Edgar Mello, que conheceu na fábrica de violões Del Vecchio.

Logo começou a acompanhar cantores como Francisco Petrônio e outros instrumentistas, tocando na Rádio Educadora de Campinas. Graças ao convite de uma artista da Rádio Mayrink Veiga do Rio de Janeiro, foi até aquela cidade e travou contato com os principais artistas brasileiros daquela época, como Mario Reis, Ari Barroso, Ciro Monteiro, Mario Lago, Luperce Miranda, Tute, Pixinguinha, as irmãs Batista e as irmãs Miranda (Carmen e Aurora).

Em 5 de setembro de 1935, começou a dirigir um grupo regional da Rádio Cultura de São Paulo, tocando músicas como Abismo de Rosas (cuja partitura pode ser baixada neste portal), Marcha dos Marinheiros e La Cumparsita. No ano seguinte apresentou-se na Argentina com contrato de dois meses, conhecendo a futura primeira dama do país, Evita Perón. Ao voltar ao Brasil, foi convidado para tocar no grupo regional do violonista Armando Neves (Armandinho), chamado Regional da Record. Nessa época, a rádio recebia músicos do nível de Jacob do Bandolim, Isaura Garcia, Silvio Caldas e Mario Zan. Graças a esse conjunto, Rago pode se apresentar com o rei da voz daquela época, Francisco Alves.



Em 1937, foi contratado pela recém inaugurada Rádio Tupi, de Assis Chateaubriand, quando formou o Regional Tupi. Por essa época conheceu e se apresentou com outro grande músico brasileiro, o cantor Augusto Calheiros, apelidado de Patativa do Norte.

Em seguida, Rago começou a se apresentar com violão elétrico. Em vez de tocar com palheta, dedilhava à maneira de um violonista clássico, e assim continuou tocando esse instrumento, sendo que os contratos profissionais eram tantos que ele mesmo dizia não conseguir aceitar todos eles. Seu primeiro violão elétrico foi um violão normal adaptado com um captador, mas em seguida passaria a ganhar vários violões das três principais fábricas no Brasil: Giannini, Del Vecchio e Di Giorgio.

As primeiras das centenas de gravações de Rago se iniciaram – como diz o próprio violonista em sua autobiografia – são de 1938, acompanhando cantores com seu grupo regional.

Em 1940, organizou Rago e seu Music Hall, espetáculo que misturava música e teatro, com o violonista atuando também como ator.

Em 1942, gravou seus primeiros registros como solista – e não mais com o seu regional – com as músicas Velhos Tempos e Chorando. A partir daí, Rago deixou uma quantidade invejável de grandes clássicos da música brasileira, como Jamais te Esquecerei e Pelo Teu Amor. Ainda em 1942, foi um dos primeiros a inovar os grupos regionais com a introdução da guitarra elétrica e do acordeão.

No final da década de 1940, Rago e seu Regional musicaram um dos primeiros desenhos animados produzidos no Brasil, Cozinhando um Samba.Rago participou também da trilha sonora dos filmes Quase no Céu (de Oduvaldo Viana) e Terra é Sempre Terra, dirigido por Alberto Cavalcanti, nos Estúdios Vera Cruz.

Na década de 1950, fez uma turnê pelo Nordeste, tocando nas principais rádios e locais de Pernambuco, Paraíba, Ceará, Bahia e Rio Grande do Norte. Rago foi também um dos primeiros artistas a se apresentar na recém criada televisão, em 1952, ao lado de Hebe Camargo, Caçulinha e outros.

Em 1962 lançou o LP Recital de Violão, no qual apresentou duas músicas ao estilo clássico, Sonatina em Lá Menor e Flor Triana.

Entre os diversos prêmios que recebeu, destacam-se Os Melhores de 1944, o Prêmio IV Centenário de São Paulo, o Roquete Pinto (de 1950), Os Favoritos (de 1953, 1954 e 1955) e o Prêmio Sanyo dos Melhores do Rádio e Raízes (1980).

Antonio Rago teve maior sucesso no período de ouro do rádio no Brasil, até a década de 1980. Após esse período, continuou suas atividades em diversos shows e apresentações por diversas localidades brasileiras. Em 1976 voltou à Argentina para algumas apresentações. Até o final de sua vida, aos 91 anos de idade, quando morreu de pneumonia, possuía tantos compromissos como artista que era difícil encontrar espaço em sua agenda para marcar uma entrevista. Este violonista teve literalmente uma vida de quase um século dedicada ao violão.


Bibliografia
Rago, A Longa Caminhada de um Violão (Editora Iracema Ltda, s/d)


Discografia Selecionada
Violões: Projeto memória brasileira (1992)
Solos de violão (1986, 3M)
Rago (1978, Continental)
Especialmente para você (1974, Chantecler)
Recital de violão (1962, Continental)
Balada do teu passo/Vai com Deus (1960, Continental)
Passarinho, Passarinho / Índia morena (1958, Continental)
Boneca japonesa / Encantamento (1957, Continental)
Mi noches sin ti / Mambo na Glória (1956, Continental)
Amargurado / Castanholas (1956, Continental)
Santista / Lágrimas de amor (1955, Continental)
O barão na dança/Jerimum (1955, Continental)
O grande centenário / Folhinha (1954, Continental)
De braços abertos / Festa portuguesa (1954, Continental)
Dois bailarinos / Arrependida (1953, Continental)
Baião do Ceará / Na granja do Lacerda (1953, Continental)
Desespero / Gostozinho (1952, Continental)
Saudades de alguém / Despertar da montanha (1952, Continental)
Valsa do adeus / Voltarás a mim (1952, Continental)
Por toda a vida / Motivo cubano (1951, Continental)
História triste de uma praieira / Minha homenagem (1951,Continental)
Ni una palabra / Um guarda-chuva na sombra (1951, Continental)
Em tuas mãos / Grande amigo (1950, Continental)
Noite triste / Estranho (1950, Continental)
Dos almas / Pelo teu amor (1949, Continental)
Que importa.../ Delicioso (1948, Continental)
Jamais te esquecerei / Mentiroso (1947, Continental)
Extasiado / Sonhadora (1946, Continental)
Chorando / Velhos tempos (1942, Colúmbia)

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